Nicetas Stethatos

PHILOKALIA — Nicetas Stethatos

O bem-aventurado padre Nicetas, denominado Stéthatos (corajoso), do mosteiro de Stoudion, viveu por volta do ano 1030. Foi o muito fiel discípulo de Simeão o Novo Teólogo. Iniciado por este aos numerosos ensinamentos misteriosos da filosofia espiritual, ele tento remodela nele as virtudes de seu mestre que apareceu naturalmente como uma outra imagem dele, a alma irradiante dos reflexos luminosos de seus carismas e de seu ensinamentos. Mas sem jamais cessar de trabalhar ele mesmo na meditação das Escrituras Santas, pôs-se a escrever e reuniu belos pensamentos. Através deles, não somente lhe foi dado tudo aprender, mas também tudo experimentar, por experiência e por paixão bem-aventurada. E graças a eles, levava sua própria inteligência a gerar os frutos sobrenaturais da inteligência divina. Engendrou obras de envergadura e de sabedoria imensas. Àqueles que queiram é permitido julgá-las a partir das três presentes centúrias. Se se diz que elas são uma regra exata da ascese, um guia seguro do conhecimento, uma realização da vida semelhante a Deus, e uma palavra o mais rico tesouro da visão ética e alegórica, se terá dito toda a verdade. Os pensamentos são tão elevados, o fraseado tão sublime e tão belo, que se questiona quais dos dois, da inteligência inerente à obra, ou da elegância das palavras, versa uma tal graça nas almas dos leitores. (Apresentação dos compiladores originais da Philokalia)

Jean Gouillard assim o apresenta sumariamente:
Hieromonge de São João Batista de Stoudion, em Constantinopla. Discípulo e autor da biografia de Simeão o Novo Teólogo.
A Philokalia acolheu suas três Centúrias práticas, gnósticas e teológicas, cada uma delas consagrada a uma das fases da vida espiritual: vida ativa, contemplação das naturezas, conhecimento de Deus ou teologia. Encontram-se também na Patrologia Grega, t. 120, cc. 851s.

A tradução inglesa da Philokalia, o denomina de Nikitas Stithatos. Usando a denominação da tradução francesa Nicetas Stethatos, segue sua apresentação na tradução inglesa. Nicetas, o discípulo de Simeão o Novo Teólogo, é muito menos conhecido que São Simeão ele mesmo. Nascido por volta do início do século XI, muito cedo (c. 1020) Nicetas entrou para o mosteiro de Studios em Constantinopla, e aí permaneceu como monge pelo resto de sua vida, sendo ordenado no devido curso ao sacerdócio. Seu contato pessoal com o Novo Teólogo não pode ter durado muito, pois este morreu em 1022. Antes de sua morte São Simeão encomendou a Nicetas que fizesse cópias de seus escritos; e alguns anos mais tarde, como resultado de uma visão na qual o santo apareceu para ele, Nicetas preparou uma edição das obras de Simeão que circulou amplamente. Ele adquiriu o apelido de Stethatos, significando o Corajoso, devido a sua oposição aberta durante a década de 1040 às relações ilícitas do Imperador Constantino IX Monomachos com sua amante Skliraina. Ao tempo da confrontação entre o Cardeal Humberto e o Patriarca Miguel Kiroularios de Constantinopla em 1054, Nicetas escreveu em defesa da Igreja Ortodoxa contra os Latinos. É possível que tenha se tornado Abade do mosteiro de Studios em idade avançada, em algum momento no período 1076-1092. A data de sua morte é desconhecida.

Em adição a suas obras polêmicas contra os Latinos e sua biografia de São Simeão, Nicetas escreveu tratados teológicos sobre a alma, sobre o paraíso e sobre a correlação entre hierarquias angélicas e eclesiásticas. As três Centúrias de textos incluídas na Philokalia lidam respectivamente, assim os títulos indicam, com os três principais estágios no caminho espiritual: a prática dos mandamentos (praktike), a contemplação das essências interiores das coisas criadas (physike), e a ‘teologia’ ou conhecimento de Deus (gnosis). Aqui Nicetas segue o padrão triádico clássico arquitetado por Evagrio e usado por, entre outros, Máximo o Confessor . Mas de fato o conteúdo das Centúrias não correspondem exatamente a estes títulos, e Nicetas inclui em cada Centúria material relacionado a todos os três estágios da jornada espiritual. Enquanto empregando frequentemente o esquema Evágrio-Máximo, Nicetas ocasionalmente combina isto com uma sequência de certo modo diferente proposta por Dionáisio o Areopagita, na qual os três estágios são descritos como purgativo, iluminativo e místico. Em outras partes ele adota a classificação tríplice encontrada em São Isaac o Sírio: carnal, psíquico e espiritual.

Embora seu estilo é mais complexo e sua abordagem mais abstrata do que aqueles de São Simeão, Nicetas compartilha em comum com seu mestre muitos temas dominantes. Há frequentes referências à luz divina, mas ao mesmo tempo Nicetas dá maior ênfase que seu mestre ao simbolismo da divina escuridão de Dionísio o Areopagita. Como São Simeão, Nicetas destaca o papel do pai espiritual e mantém que a vida de santidade é sempre possível, qualquer que seja a situação externa de uma pessoa; não é necessário retirar-se fisicamente para o deserto, pois a verdadeira “fuga do mundo” é a renúncia interior de nossa auto-vontade. Fiel ao exemplo estabelecido pelo Novo Teólogo, Nicetas insiste que aqueles iniciados nos divinos mistérios devem agir como “missionários”, dizendo aos outros sobre os dons de graça que receberam; e concorda com Simeão o Estudita que o amor pelos outros é superior à oração.

Um tema em particular que Nicetas deriva de Simeão é a vital significância das lágrimas e compunção (katanyxis) dentro da vida espiritual. As duas são mencionadas juntas, embora a distinção seja também traçada entre elas. Um leitor moderno pode facilmente assumir que ambas estas coisas são primariamente negativas e penitenciais em caráter, mas isto é uma incompreensão do ponto de vista de Nicetas. Seguindo João Clímaco, ele é cuidadoso em distinguir dois tipos de lágrimas: aquelas que produzem “um sentimento ácido e doloroso”, e as “alegres lágrimas” que são cheias de “deleite e um sentido de júbilo”. As primeiras são causadas pelo arrependimento e desgosto interior, as segundas pela compunção. Do mesmo modo a compunção tem também um caráter amargo-doce: está ligada ao arrependimento, mas ao mesmo tempo traz doçura, alegria e leveza, assim Nicetas fala da “intoxicação” e do bálsamo de cura da compunção, e a descreve como brotando do Éden, uma banho de chuva do Espírito Santo. Lágrimas e compunção, então, são causadas não só por uma realização de nossa própria pecaminosidade, mas também e muito mais fundamentalmente por um grato e carinhoso reconhecimento do amor perdoante de Deus.

Em sua abordagem básica, Nicetas permanece sempre positivo, embora nunca otimista. Nossa natureza humana é essencialmente boa, e a santidade nada mais é que um retorno através da graça a nosso estado natural. O mundo material é como tal intrinsecamente bom e belo, e as formas um sacramento da presença de Deus, um meio de ascensão ao reino divino: “Reconheça a delícia do Senhor da beleza da criação… em pureza ascendendo ao Criador através da beleza de Suas criatura”.
Escritos
*espanhol
**Seleção de Textos


Excertos
*CENTÚRIAS
*CAPÍTULOS GNÓSTICOS