Apocalipse

Dicionário Teológico do Novo Testamento, Coenen, Beyreuther, Bietenhard
A revelação na teologia cristã expressa a auto-revelação significativa de Deus ao homem. A língua grega possui vários termos e expressões relevantes a este processo, apokalypto, uma palavra composta formada de kalypto (esconder, ocultar) e apo (de), levar consigo a ideia de “desvendar” alguma coisa anteriormente oculta, deloo, derivado de delos, “claro”, “manifesto”, chama mais atenção ao alvo, i.é, que, como resultado, alguma coisa fica sendo conhecida e manifesta, epiphaneia, da raiz -phan- (cf. phainomai, “aparecer”; phaneroo, “deixar de ser visto”; Luz art. phaino), sugere uma aparência visual, uma manifestação da divindade. Outros conceitos relevantes incluem gnorizo, “tornar conhecido” (conhecimento, art. ginosko); horama, uma “aparição” (alguma coisa que é vista) e optasia, uma “visão”.

apokalypto,1; apokalypsis, “manifestação”, “revelação”.

Na cultura clássica o vb. apokalyptò, “desvendar”, formado de kalyptò, “encobrir”, “ocultar” e apo, “de”, é atestado no Gr. cl. desde Heródoto para denotar a “manifestação” de coisas previamente ocultas; o subs. apokalypsis, “manifestação”, “revelação”, porém é empregado somente desde o séc. I a.C., e mesmo então, num sentido predominantemente religioso.

2. O emprego religioso e teológico das duas palavras é raro no mundo grego-helenista. Ocorrem esporadicamente no Corpus Hermeticum (13, 1; no século II ou III d.C.), no neo-platonista Iâmblico (século III d.C.), e em textos posteriores astrológicos e alquímicos. Outras palavras eram preferidas para designar revelações e manifestações divinas. Para o pronunciamento do oráculo de Delfos, por exemplo, semaino (“indicar”, “explicar”, “ordenar”: de sema, um “sinal” ou “marca”) era empregado (cf. A. Oepke, TDNT III, 566). Nos tempos helenistas, as palavras epiphaneia, um “aparecimento”, o “tornar-se visível”, e parousia, “presença”, indicam que uma divindade oculta tornou-se visivelmente perceptível)) (cf. Arndt, 304,635). É instrutivo que as mesmas expressões também desempenham um papel na adoração divina prestada aos soberanos. Na literatura mística hermética, ((gnosis, conhecimento, fica sendo a revelação (A. Oepke, TDNT III 569-70). É claro que aqui não há questão de “revelação” no sentido neo-testamentário da palavra; há bastante distinção entre os dois conceitos. Deus, na realidade, não Se deixou sem testemunha entre os pagãos (At 14:17); mas ainda se tivessem a capacidade de reconhecer um poder e deidade invisível nas obras de Deus, perverteram este conhecimento por meio de perverter a fé em Deus em adoração aos ídolos (Rm 1:18-23). Se existe uma realidade por detrás da adoração aos ídolos, praticada pelos pagãos, é a realidade de poderes demoníacos (1 Co 10:20).


Bernard McGinn: Anticristo
Apocalipses são um gênero de literatura reveladora — ou seja, textos nos quais a mensagem do mundo divino é dada para uma comunidade crente. Várias espécies de revelações floresceram através do mundo helenístico. Os apocalipses judaicos faziam parte de um fenômeno religioso amplo, embora com suas marcas próprias. Um acadêmico sustenta que o apocalipse é “um gênero de literatura reveladora com um quadro narrativo, no qual a revelação é mediada por um ser de outro mundo para um recipiente humano, desvelando uma realidade transcendental que é tanto temporal, na medida que visualiza a salvação escatológica, quanto espacial na medida que envolve outro mundo sobrenatural”.

Como um grupo, os apocalipses introduziram novas constelações de significados religiosos no antigo Judaísmo. Duas características cruciais dos apocalipses são sua natureza narrativa e o caráter mediado do conteúdo. Os apocalipses são estórias; contam uma estória sobre como a mensagem foi recebida, e incluem uma estória como parte de seu conteúdo. E os apocalipses são mediados; vêm para sábios historicamente particulares através de certos mensageiros divinos ou celestes. O relato da recepção da mensagem usualmente diz algo sobre o sábio que está designado a receber a mensagem e a situação na qual o revelador celestial apareceu.

As estórias contadas nos apocalipses são variadas mas tendem a se classificar em duas categorias amplas. Um grupo de apocalipses concentram na revelação de segredos sobre os mistérios do universo, especialmente do reino celeste. Estes apocalipses frequentemente envolvem viagens além de nosso mundo, nas quais o recipiente humano é levado em um passeio pelos reinos celestiais (e mais tarde também pelo inferno). Outro grupo de apocalipses, que geralmente não contêm uma viagem celestial, concentram na revelação de um segredo temporal, uma mensagem sobre o curso da história.

Os quinze ou mais apocalipses judeus que sobreviveram, datam aproximadamente do período entre 250 aC a 150 dC são todos revelações mediadas nas quais a mensagem é comunicada ao vidente humano por uma figura celeste, usualmente um anjo. Os apocalipses judeus também compartilham outra forma de mediação enquanto todos usam pseudônimos; ou seja, são de autoria de sábios, heróis bíblicos do passado, tais como Enoque, Abraão, Daniel. Esta dupla mediação expõe duas dimensões importantes da mentalidade apocalíptica. A primeira é a insistência na transcendência divina. O Deus dos apocalipses é paradoxalmente tanto distante quanto próximo. Só alcançável por intermediários, não parece ter controle sobre a confusão do mundo. Ao mesmo tempo próximo, pelo menos aos videntes, pois alcançam o que nenhum líder religioso alcançou — ascendem ao céu.


  1. des-encobrimento|”descobrir”, “desvendar”, “revelar” 

Escrituras