Jo 1,18

PRÓLOGO DE JOÃO — DEUS NUNCA FOI VISTO…

Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigenito, que está no seio do Pai, esse o revelou.


CRISTOLOGIA
Orígenes: Comentários ao Evangelho de João

João Carreira das Neves: ESCRITOS DE JOÃO

O Prólogo termina no v. 18 com a afirmação solene de que “nunca ninguém viu Deus, exceto o unigênito divino, que está em comunhão com o Pai, (e) que o deu a conhecer”. A expressão grega é literariamente paralela da do v. 1: “o Logos está em comunhão com Deus” (v. 1) e o unigênito divino, que só pode ser o mesmo Logos, “está debruçado sobre o peito do Pai”, ou “em comunhão com o Pai”. E só o Logos-unigênito divino é que vai dar a conhecer Deus e Pai através das narrativas do evangelho que se seguem. Desta forma, o primeiro e o último versículos do Prólogo perfazem uma inclusão bíblica. Como já referenciamos, alguns autores costumam ver no v. 18 uma alusão polêmica às experiências místicas de judeus e cristãos joanicos que pensavam possuir a “visão” ou “conhecimento” total do próprio Deus, à maneira dos iniciados gnósticos de tempos posteriores (cf. Jo 3,13; 5, 37; 6, 46; 1Jo 4,12).

A última palavra do prólogo é um verbo: exegesato, que significa “relatar”, “contar” e, através do relato, “dar a conhecer”. Gramaticalmente, o verbo “morre” de morte súbita porque não refere o objeto. Mas como o v. 19 começa com um kai (e) narrativo, só pode ter em vista a narrativa evangélica que se segue sobre a “revelação” que o Verbo — Jesus Cristo apresenta acerca de Deus e Pai, sempre em contraste com a doutrina de Moisés e dos judeus. O particípio presente ho ôn (“que estava no seio-comunhão do Pai”) é um chamado presente durativo, que, por isso mesmo, tem a ver com toda a vida histórica do Logos-Jesus Cristo.


FILOSOFIA
Michel Henry: EU SOU A VERDADE

Quanto ao segundo texto, seu próprio conteúdo basta para afastar a interpretação segundo a qual a aparição de um homem no mundo, na ocorrência Jesus, seria suscetível de fazer conhecer Deus. Aquele que faz conhecer Deus, “um Deus Filho único”, é muito precisamente o Arque-Filho em sua condição transcendental de Arque-Filho, condição que consiste a viver no seio de Deus. Mas o seio de Deus é a vida invisível de antes de todo mundo visível concebível: aquele, invisível ele mesmo, , que se tem no seio invisível de Deus, não pode fazer conhecer Deus senão no invisível, aí onde Deus se auto-revela no Arque-Filho e como este. É aí com efeito que o Filho único faz conhecer o Pai. E nós nos voltamos agora para o contexto, é isto que ele oferece. Pois na Vida estão a graça e a plenitude na medida que a Vida se constringe ela mesma, e a Verdade na medida que este constringir da vida é sua auto-revelação. Ora é no Arque-Filho e por ele somente que esta graça e esta Verdade da Vida se cumprem, longe de poder fazê-lo na verdade do mundo e por ela: «A graça e a verdade vieram por Jesus Cristo» (Prólogo, 17).