Stethatos Centúrias Físicas 61-70

Nicetas Stethatos — Capítulos Físicos
61. As imagens que nos visitam durante o sono são ou sonhos, ou visões, ou revelações. À categoria de sonhos pertence tudo na faculdade do intelecto, de formação de imagens, que é mutável — tudo que o confunde e sujeita constantemente a estados alterados. Nada temos a ganhar de tais imagens e se somos sensíveis deveríamos ignorá-las — com efeito, elas desaparecem por si só assim que acordamos. As visões por outro lado são constantes; uma não troca na outra, mas permanecem impressas no intelecto inesquecíveis por muitos anos. Aquelas que desvendam o resultado de coisas a vir, e assistem a alma por inspirá-la com compunção e a vista de maravilhas assustadoras, fazem aquele que as tem reflexivos e os choca com perplexidade por conta de sua constância e sua natureza assustadora. Logo são tratadas com grande seriedade por aqueles especializados em matérias espirituais. As revelações ocorrem quando a alma purificada e iluminada é capaz de contemplar em uma maneira que transcende à normal percepção dos sentidos. Têm a força das coisas e dos pensamentos miraculosos e divinos, nos iniciando nos ocultos mistérios de Deus, nos mostrando o resultado de nossos problemas mas importantes e a transformação universal das coisas mundanas e humanas.

62. A primeira categoria — aquela dos sonhos — pertence a pessoas materialistas de mentes sensuais que veneram sua barriga (cf. Fil 3,19) e são arrogantes em sua ultra-indulgência. Seu modo de vida dissoluto, poluído de paixões escurece seu intelecto, e são ridicularizadas e encantadas pelos demônios. A segunda categoria — aquela das visões — pertence àqueles bem avançados no caminho espiritual, que limparam os órgãos de percepção da alma. Beneficamente assistidos por coisas visíveis ascendem à apreensão sempre maior de coisas divinas. A terceira categoria — aquela das revelações — pertence àqueles que são perfeitos, que são energizados pelo Espírito Santo, e cuja alma através da oração mística está unido a Deus.

63. Coisas vistas no sono são verdades e impressas no intelecto espiritual no caso, não de todos, mas somente daqueles cujo intelecto está purificado, que limpou os órgão de percepção da alma e que está avançado em direção à contemplação das essências interiores das coisas criadas. Tais pessoas não se preocupam sobre questões do dia-a-dia, nem são perturbadas sobre esta vida presente. Através de longos jejuns adquiriram um autocontrole abrangente e através da exerção e dureza alcançaram o santuário de Deus, o conhecimento espiritual das coisas criadas e a sabedoria do mundo superior. Sua vida é a vida dos anjos e está oculta em Deus (cf. Col 5,3), seu progresso é baseado na quietude santa e nos profetas da Igreja de Deus. É deles que Deus falou através de Moisés, quando disse, «Se há um profeta entre vós, aparecerei para ele em seu sono e falarei para ele em uma visão» (cf. Num 12,6); e através de Joel, quando disse, «E virá a acontecer após estas coisas que derramarei Meu espírito sobre toda carne; e vossos filhos e vossas filhas deverão profetizar, vossos anciãos deverão sonhar sonhos e vossos jovens deverão ver visões» (Joel 2,28).

65. Se a alma, seus poderes desordenados, ainda está em luta consigo mesma e ainda não se tornou receptiva aos raios divinos, se ainda é escrava da vontade da carne e sem paz; e se sua batalha com as paixões rebeldes recentemente ainda não veio a terminar, ela precisa preservar estrito silêncio, de modo que com Davi também possa dizer: «Mas eu, como um surdo, não ouço; e eu era um imbecil que não abre sua boca» (Sal 38,13). Deveria estar cheio de pena e deveria andar tristemente ao longo do caminho dos mandamentos de Cristo; pois ainda é afligido pelo inimigo e espera a vinda do Paracleto, através de quem receberá o prêmio da verdadeira liberdade por sua compunção e lágrimas purificadoras.

66. Se geras o mel das virtudes em quietude, irás através do esforço e autodisciplina transcender o estado de baixeza da condição decadente do homem e pela superação de tua presunção restaurarás os poderes da alma a seu estado natural. Te coração purificado pelas lágrimas, agora se tornará receptivo aos raios do Espírito, te vestirá na incorrupção da morte vivificadora do Cristo (cf. 1Co 15,53; 1Co 4,10), e receberás o Paracleto em línguas de fogo na câmara superior de tua quietude (Cf. Atos 2,3). Estará então sob uma obrigação de falar sem reservas das obras maravilhosas de Deus (Cf. Atos 2,11) e «declarar Sua retidão na grande congregação» (Cf. Sal 40,10), pois terás recebido interiormente a lei do Espírito (cf. Jo 7,38; Rom 8,2); de outro modo, como o mau servidor que escondeu o talento de seus próprio mestre, será lançado no fogo eterno (cf. Mt 25,30). Assim foi com Davi, quando lavou seu pecado através do arrependimento e recebeu uma vez mais o dom da profecia; incapaz de esconder as bençãos que tinha recebido, disse a Deus, «Veja, não selarei meus lábios, como Tu, ó Senhor, sabe. Não escondi Tua retidão dentro de meu coração; declarei Tua verdade e Tua salvação; não escondi Teu perdão e Tua verdade da grande congregação» (Sal 40,9-10).

67. Um intelecto totalmente purgado das impurezas é como um céu cheio de estrelas que ilumina a alma com lúcidas intelecções; e o Sol da retidão (cf. Mal 4,2) brilha dentro dele, iluminando o mundo com conhecimento divino. Purificada desta maneira, a consciência traz à tona das profundezas da sabedoria os princípios criativos e as revelações transparentes do que está oculto, e em seu estado puro e imaculado os coloca diante do intelecto, de modo que ele saiba a profundeza, altura e largura do conhecimento de Deus (cf. Ef 3,18). Quando o intelecto interiorizou estes princípios e revelações e os fez parte de sua própria natureza, então elucidará as profundidades do Espírito para todos aqueles que possuem o Espírito de Deus dentro de si mesmos, expondo a perfídia dos demônios e expondo os mistérios do Reino dos Céus.

68. Os desejos corporais e os impulsos da carne são checados pelo autocontrole, jejum e luta espiritual. Os fermentos psíquicos e as ambições do coração são atenuadas pela leitura das Escrituras Divinas e humilhadas pela oração constante, enquanto a compunção como óleo consola-os juntamente.

69. Nada assim te põe em comunhão com Deus e te une com o Logos divino como a pura oração noética, quando oras sem distração no Espírito, tua alma purificada pelas lágrimas, derretida pela compunção e iluminada pela luz do Espírito.

70. A quantidade é muito importante na recitação oracional dos salmos, desde que seja acompanhada de perseverança e atenção; mas a qualidade da nossa recitação é o que dá vida à alma e a faz frutífera. A qualidade na salmodia e oração consiste em orar com o Espírito e com o intelecto (cf. 1Co 14,15). Oramos com o intelecto quando, a medida que dizemos as orações e recitamos os salmos, percebemos o significado oculto nas Escrituras Santas e assim colhemos no coração uma safra de mais e mais exaltados pensamentos divinos. Arrebatada espiritualmente por estes pensamentos às regiões de luz, a alma com uma clara radiância, é ainda mais purificada, eleva-se inteiramente aos céus, e contempla as beleza das bençãos armazenada para os santos. Por conta do anseio ardente por estas bençãos, lágrimas — o fruto da oração — de pronto correm de nossos olhos, induzidos pela energia criadora de luz do Espírito, seu sabor tão doce que em os experimentando pode-se mesmo esquecer de comer. Isto é o fruto da oração, concedido através da qualidade de sua salmodia na alma daqueles que oram.