Stethatos Centúrias Capítulos Práticos

Nicetas Stethatos — Centúrias — Capítulos Práticos
Tradução em grande parte feita a partir da versão inglesa da Philokalia, mas eventualmente utilizada a versão francesa. A tradução de cada centúria foi organizada em páginas de 10 itens cada uma, para facilitar a leitura na Internet.
PRIMEIRA CENTÚRIA — CAPÍTULOS PRÁTICOS: DA PRÁTICA DAS VIRTUDES: CEM TEXTOS
1. Há, penso, na tríade perfeita das virtudes (, esperança e caridade), quatro causas portando aquele que superou agora o meio do noviciado e que alcançou à tríade da teologia mística, para escrever o que é bom. A primeira é a liberdade, quero dizer a impassibilidade (apatheia) da alma, que, pelas penas da ação (praktike) leva à contemplação (theoria) natural da criação, e daí penetra nas treva da teologia (theologia). A segunda, que vem das lágrimas e da oração, é a pura da inteligência (nous), donde nasce a palavra da graça e brotam os fluxos dos pensamentos. A terceira é a habitação da Santa Trindade em nós. Dela, as efusões luminosas do Espírito se espalham para seu bem em cada um dos purificados, manifestando os mistérios do Reino dos Céus e revelando os tesouros de Deus ocultos na alma. A quarta, em todo homem que recebeu o talento da palavra do conhecimento, é a urgente necessidade da ameaça de Deus que diz: “Servidor mau e preguiçoso, deverias pôr o meu dinheiro nos cambistas, e em meu retorno teria retirado o que é meu com juros” (Mt 25, 27) (Parabola dos Talentos). É bem esta necessidade que fazia Davi também dizer cheio de temor: “Eis, fecharei meus lábios, Senhor, tu o sabes. Não ocultei tua justiça no meu coração. Não disse tua verdade e tua salvação. Não ocultei teu amor e tua verdade à grande assembleia” (Sal 40, 10-11).

2 O começo da vida segundo Deus é fugir completamente do mundo. Uma tal fuga é a renúncia da alma às vontades e a transposição da preocupação terrestre, pela qual, nos pressionam de retornar à preocupação de Deus, de carnais nos tornamos espirituais (pneumatikos). Estamos mortos para a carne (sarx) e para o mundo (kosmos). Mas nossa alma é levada à vida, em Cristo e no Espírito.

3 A verdadeira crença da alma tocando Deus, a interior aliada ao desprezo das coisas visíveis, a prática da virtude desapegada de todo egoísmo, são os três filhos da corda de que fala Salomão1. Para rompê-la, é necessário tempo aos espíritos de malícia.

4 Em esperamos receber recompensa por nossos trabalhos, e por conta disto prontamente suportamos as durezas da prática das virtudes. Mas quando experimentamos a garantia do Espírito Santo, alçamos voo com amor para Deus.

5 Estar perturbado por pensamentos impuros não significa que já somos da parte do diabo. Mas quando a alma se torna desleixada, quando o intelecto, por causa de nossa vida dissoluta e desregrada, fica cheio de imagens turvas e obscuras, e quando nossa prática das virtudes negligencia, por causa de nosso desleixo na meditação e na oração, então, mesmo não engajados no mal, somos nivelados entre aqueles que deliberadamente rastejam em prazeres sensuais.

6 Tão logo o bridão dos sentidos superiores é removido, nossas paixões imediatamente revoltam-se e os sentidos mais baixos, mais escravos são agitados para ação; pois quando estes últimos em sua desrazão são soltos das amarras do auto-controle, seus hábitos devem acender as fontes das paixões e alimentar-se delas como sementes venenosas. E enquanto prossiga o desleixo, mais fazem isto. Pois tal sendo seu apetite natural não podem refrear-se da indulgência nisto uma vez livres para assim fazer.

7 Entre os sentidos, visão e audição possuem uma certa qualidade noética e são mais inteligentes e mestres que os outros três sentidos, paladar, olfato e tato, que são irracionais e grosseiros, e dependem dos sentidos superiores. Pois primeiro vemos e ouvimos, e então, através do agenciamento da mente , apreendemos o que está diante de nós, e o cheirando, finalmente o saboreamos. Assim o paladar, o olfato e o tato são mais animalescos ou, simplesmente, mais baixos e mais dependentes que a visão e a audição. Os animais mais gulosos e lascivos, ambos domésticos e selvagens, são especialmente afligidos por eles, e dia e noite ou se enchem de comida ou se viciam em copulação.

8 Se referes as atividades dos sentidos exteriores às suas contrapartes interiores — expondo tua visão ao intelecto, o recipiente da luz da vida, tua audição ao juízo da alma, teu paladar à discriminação da inteligência, teu olfato à compreensão do intelecto, e relacionando teu tato à vigilância do coração — levarás uma vida angélica na terra; enquanto sendo e aparecendo como um homem entre homens, serás também um anjo coexistindo com anjos e espiritualmente consciente da mesma maneira que eles são.

9. Através do intelecto, sustentador da luz da vida divina, recebemos o conhecimento dos mistérios ocultos de Deus. Através da faculdade de julgamento da alma peneiramos na luz deste conhecimento os pensamentos que levantam-se dentro do coração, distinguindo o bom do mau. Através da discriminação da inteligência saboreamos nossas imagens conceituais. Aqueles que brotam de uma raiz amarga transformamos em doce alimento para a alma, ou então as rejeitamos inteiramente; aquelas que brotam de um estoque vigoroso e virtuoso aceitamos. Desta maneira tomamos cada pensamento cativo e o fazemos obedecer Cristo (cf. 2Cor. 10,5). Através da compreensão do intelecto cheiramos o unguento espiritual da graça do Espírito Santo, nossos corações cheios de alegria e júbilo. Através da vigilância do coração conscientemente percebemos o Espírito, que refresca a chama de nosso desejo para bençãos supernais e aquece nossos poderes espirituais, embotados como foram pela frieza das paixões.

10. Assim como no corpo existem cinco sentidos — visão, audição, paladar, olfato e tato — assim na alma existem cinco sentidos: intelecto, razão, percepção noética, conhecimento intuitivo e insight cognitivo. Esses estão unidos em três atividades psíquicas: intelecção, raciocínio e percepção noética. Por meio da intelecção apreendemos as intenções espirituais, por meio do raciocínio as interpretamos, e através da percepção noética apreendemos as imagens do insight divino e conhecimento espiritual.
*§11-20
*§21-30
*§31-40

  1. Melhor é serem dois do que um, porque têm melhor paga do seu trabalho. Porque se um cair, o outro levanta o seu companheiro; mas ai do que estiver só; pois, caindo, não haverá outro que o levante. Também, se dois dormirem juntos, eles se aquentarão; mas um só, como se aquentará? E, se alguém prevalecer contra um, os dois lhe resistirão; e o cordão de três dobras não se quebra tão depressa. (Ecl 4:9-12)[]