Origenes Balthasar Auto-Conhecimento 14

von BalthasarOrígenes
Excertos dos Comentários ao Cântico dos Cânticos (2)
14 “Aquiete-se, e saiba que Eu sou Deus” (Sl 46, 10). É o principal dever do “conhecimento” reconhecer a Trindade. Mas após isto, é reconhecer suas criaturas de acordo com ele que disse: “Pois é ele que me deu inequívoco conhecimento do que existe, conhecer a estrutura do mundo e a atividade dos elementos; o início e o fim e o meio do tempo” e assim por diante (Sabedoria de Salomão 8, 17-18). Assim haverá também nisto um certo conhecimento de si mesmo da alma pelo qual deve-se conhecer o que é sua substância, se corporal ou incorporal; se é simples, ou composta de duas ou três ou mesmo mais partes. Mas a alma deveria também conhecer, de acordo com as questões que alguns perguntam, se ela foi feita ou não por alguém; e, se feita, como foi feita. Deveria saber se, como alguns pensam, sua própria substância está contida em sua semente corporal e tem se princípio junto com o princípio do corpo; ou se, vindo acabada do exterior, veste um corpo previamente preparado e formado dentro do ventre da mulher. E se esta é a maneira que é, se já vem novamente criada e então é feita só quando o corpo é formado (de modo que a necessidade de animar um corpo é vista como sendo a causa deste ser feito) ou se, tendo sido previamente feita, é por alguma razão pensada como vindo tomar um corpo. E se por alguma razão pensa-se ser realizada desta maneira, deveria se conhecer que razão é esta. Para tudo isto ser conhecível, “conhecimento” é necessário.

Mas a questão a ser perguntada também é se a alma toma um corpo apenas uma vez e, depois de deixá-lo, não volta para ele, ou, depois de ter deixado uma vez o corpo que tomou, o tomará de novo; e se assim for, se sempre terá o corpo que tomou, ou o abandonará de novo em algum tempo. E se, de acordo com a autoridade das escrituras, a consumação do mundo é ainda por vir e este estado corruptível será modificado em estado incorruptível, pareceria não haver dúvida que uma alma não pode vir um segunda ou terceira vez em um corpo neste estado de vida. Pois se isto se desse, acarretaria que, devido às intermináveis sucessões, o mundo não teria fim.

Além do mais, a alma em seu conhecimento de si mesmo deveria também se perguntar se existe alguma ordem de espíritos, ou seja, alguns espíritos da mesma substância que ela mesmo, e outros não da mesma substância mas diferentes, ou seja, se existem espíritos racionais como ela mesma, e outros que não têm razão; e também perguntar se sua própria substância é a mesma das dos anjos, posto que pensa-se que não há distinção entre racional e racional. Deveria se perguntar ainda mais se não é deste modo pela substância, mas será deste modo pela graça, se mereceu-a, ou se não pode ser feita como os anjos a não ser que tenha recebido isto como uma qualidade e semelhança de sua natureza. Pois parece possível para ela recuperar o que foi perdido, mas não ser agraciada com o que o Criador não lhe deu desde o princípio.

E em seu conhecimento de si mesmo a alma também questiona sobre isto: se o poder de seu espírito pode ir e vir e é mutável, ou uma vez adquirido, nunca é perdido de novo. Mas qual a necessidade de se ir mencionando as razões pelas quals a alma deveria se conhecer a si mesma, exceto que, quando negligenciasse “conhecer a si mesma” perfeitamente, pudesse ser ordenada a “ir e acompanhar seus filhos nas trilhas do rebanho e pasto”, e para isto fazer não ao lado de sua própria tenda, mas “ao lado das tendas dos pastores” (Cant 1, 8), enquanto para alma que está pronta estão preparados todos os tipos de oportunidades para ela se tornar proficiente, de acordo com sua habilidade, no “discurso do conhecimento” (1 Cor 12, 8)? Mas esta coisas podem ser ditas pelo Verbo de Deus à alma que está de fato firme nos caminhos do progresso mas ainda não se ergueu às alturas da perfeição. Porque está progredindo, é chamada “bela”. Mas para ela ser capaz de alcançar a perfeição, é necessário para ela ser ameaçada. Porque a não ser que venha a conhecer a si mesmo, através das coisas que mencionei, e se torne proficiente no Verbo de Deus e na lei divina, sofrerá o destino de aceitar várias destas opiniões e de seguir homens que nada disseram digno de nota, nada a partir do Espírito Santo. Isto é o que significa “vá nas trilhas dos rebanhos” e seguir os ensinamentos daqueles que permaneceram eles mesmos pecadores e não podem prover remédios para pecadores. Quem quer que siga estes, sim “bodes”, quem quer que siga o juízo de pecadores, notará, em sua “pastagem”, estar ladeando “tendas de pastores”, ou seja, “pastando” nas várias seitas dos filósofos. Considere então mais profundamente que realidade terrível está contida nesta figura. Ela diz: “Vá nas trilhas dos rebanhos” (Cant 1, 8); como se a alma já estivesse dentro e residindo dentro dos mistérios, mas, por ser negligente ao “conhecer a si mesmo e inquerir sobre o que é e como deveria agir e o que deveria fazer ou não fazer, é dito: “Vá”, como se, devido à culpa de sua indolência, estivesse sendo lançada por alguém em comando. Assim é um terrível perigo para a alma negligenciar o estudo de si mesmo e seu auto-conhecimento. Mas talvez, como demos uma explicação dupla do auto-conhecimento da alma, parecerá, de acordo com esta interpretação pela qual ela negligencia examinar suas próprias ações e busca seu próprio progresso ou guarda contra os vícios, que justamente dito: “Vá”, pelo qual parece como se ela fosse levada para fora, de dentro. Mas se se segue a segunda interpretação na qual se diz que a alma deve reconhecer sua própria natureza e substância, e seu estado se passado ou futuro, então a situação é séria. Pois quão facilmente se encontrará uma alma que seja tão perfeita, tão superior, que o significado e compreensão de todas estas coisas estejam abertas para ela? Para isto replicamos que as palavras que falamos não são dirigidas a todas as almas, e que a esposa não está falando aqui às “servas”, nem a outras “mulheres”nem às “oitenta concubinas” ou “sessenta rainhas”, mas àquela que única entre todas as mulheres é chamada de “bela” e “perfeita” (Cant 6, 7-8). Para certas almas amadas, portanto, isto é dito.