Evangelho de Tomé — Logion 8 <= LOGION 9 => Logion 10
Jesus disse: uma vez saiu um semeador a semear com as mãos cheias de sementes que semeou. Umas sementes caíram no caminho; vieram os pássaros e as comeram. Outras caíram em pedregal e não firmaram as raízes na terra.; nem puderam elevar-se até o céu. Outras caíram entre espinhos que sufocaram a semente e os vermes a comeram. Outras caíram em terra boa e deram fruto até o céu; sua razão foi de sessenta por medida e cento e vinte por pedida. Roberto Pla EVANGELHO DE JESUS: PARÁBOLA DO SEMEADOR
Roberto Pla A parábola do semeador constitui, em sua breve síntese, uma completa e transparente expressão da mensagem de Boa Nova, e justifica a recomendação recolhida por Marcos: "Não entendeis esta parábola? Como então compreendereis todas as parábolas?". Deste modo, os três evangelistas sinóticos coincidem em transmitir não somente a parábola mas sua explicação. Mas para desnudar a verdade totalmente escondida sob as dobras do relato parabólico, quer dizer, para ver e entender o que deve ser visto e entendido através do que se olha e ouve nele, não basta conhecer a explicação da parábola que dão os evangelistas, mas é necessário, ademais, congregar-se com os Doze, ou seja, penetrar com os membros desta instituição no Mistério do Reino de Deus, e isto, porque seu inteiro ver e entender não depende somente da agudez do intelecto mas, antes de tudo, da limpeza da consciência, para que esta receba em suas águas sossegadas o fruto da semente interior.
A semente é a "Palavra de Deus", a qual, como afirma João, em seu Prólogo: "É a luz verdadeira que ilumina a todo homem que vem a este mundo". Isto é o que o semeador semeou com as mãos cheias, no coração dos homens, em cada homem, segundo o qual, cada homem é, quanto a sua pura essência, esta luz verdadeira que vive eternamente. Por isto se diz que a Palavra veio a sua casa e pôs sua Morada entre (em) nós, e ali reside, como tesouro que brilha nas trevas do coração que a ignora, à espera de ser recebida pela consciência purificada.
É possível que esta doutrina que se resolve no conhecimento de que o homem é em sua essência, como filho do Ser infinito, um raio do Sol ou consciência universal e eterna a que chamamos Deus, uma centelha de seu próprio lugar, tenha estado sempre oculta nos mistérios do povo de Israel. Só assim se explicam as precauções oraculares e parabólicas com que esta Revelação aparece "vestida" tanto no AT como no NT. Desde os tempos do saltério, quando se anuncia que vai publicar o que está oculto desde a criação, se abre a boca muito fechada para ela nas parábolas, para que, segundo se explica só seja com seus ouvidos que ouçam e com seu coração que entendam, todos aqueles que ainda não podem ou não devem conhecer o mistério. (Is 6,9-10)
Ao que parece tal doutrina capital do conhecimento permaneceu sempre oculta sob capas diferentes e provavelmente muito relacionadas: oculta, porque só podia ser escutada pelos homens que acediam aos mistérios, e oculta, porque os homens de consciência opaca, voltados somente ao exterior, não podem perceber essa luz verdadeira da qual são como templos de seu Deus interior, como vestimentas de si mesmos.
O descobrimento inicial dessa semente interior que á a Palavra, exige um prévio deslizamento sutil da consciência até as regiões imateriais nas quais a semente se desenvolve; é esta a translação que só se faz necessariamente mediante uma progressiva desvalorização do visível. Na linguagem testamentária a riqueza e a pobreza são figuras da posse e ou da privação de atributos. Assim se diz: Bem-aventurados os pobres de espírito (Mt 5,3) a respeito daqueles que alcançaram a consciência pura do homem pneumático. Quanto aos graus de percepção do que os evangelistas descrevem como ouvir, pois ouvir ou de não ouvir a Palavra interior se trata, a parábola se entrega a uma casuística muito definida a ao que parece muito conhecedora do coração do homem, por meio da qual se classificam quatro tipos humanos.
Para todos esses tipos de homens que durante sua vida resultam incapazes de por a semente neles semeada em situação de dar fruto, se escrevem as parábolas: Cizania e Parábola da Rede.
VIDE: NOVO E VELHO; NATIVIDADE; ELAKISTOS; FRUTOS
As parábolas da Semente de Mostarda e da "semente que cresce por si só", que só Marcos inclui, são reveladoras de alguns modos de comportamento desta semente do Espírito. A primeira descreve seu imprevisível e abundante crescimento, pois como a pedra de que fala o salmista, passa de ser descartada por todos a converter-se em pedra angular (Sl 118,22), e a segunda desta parábolas, explica que uma vez há sido descoberto "a ponto de fé" que o grão está semeado na terra de um mesmo, seu fruto brota e cresce por si só. Sua potência para transmitir o conhecimento do Reino só tem uma pálida imagem na força expansiva da luz solar, a qual chega sem necessidade de sera carregada e penetra no lugar próprio com apenas abrir uma porta ou janela, que no caso da semente se fundamente somente na fé.
Jean-Yves Leloup
Émile Gillabert