EVANGELHO DE TOMÉ — Logion 69<=LOGION 70=>Logion 71
Jesus disse: Quando engendreis isto em vós mesmos, o que tereis os salvará. Se não tiveres isto em vós mesmo, o que não tendes em vós os fará morrer. (Roberto Pla) EVANGELHO DE JESUS
Roberto Pla Com o demonstrativo "isto" o logion nomeia o espírito, ou essência eterna do homem, dotado com vida própria em si mesmo, e para cuja menção emprega o Novo Testamento indistintamente um abundante quadro de denominações, tais como o tesouro, a pérola, a joia, a pedra, e especialmente, o Filho do homem.
"Isto", é o homem mesmo, o Eu puro, mas para a alma, tão ornamentada com seus interesses próprios, mundanos, temporais, "isto" é um desconhecido inominável, porque seu verdadeiro nome é incognoscível para a alma. O espírito sempre “está aí”, muito próximo, posto que é o substrato irrevocável da alma, “a alma da alma”, que desdobra-se sobre ela sem cansaço possível, o perfume constante da vida. Mas “isto” permanece sumido em seu cativeiro imposto pela alma. Não há “isto” na alma e é sua privação do espírito que dá a vida, ou que a fará morrer.
A outra opção que tem a alma é fazer uso das grandes potências de que está dotada para salvar-se. A primeira potência é a fé, mas nunca cega senão luminosa, clarividente, que com seu olhar que penetra abre as portas à percepção conjunta do que não aparece mas “é”, e do visível que parece ser; pois não há nunca um manancial aberto que não se se surta de um regato escondido que o aporta a água. A outra potência da alma é a katharsis, que torna clara a água para que desponte em sua transparência a luz do espírito. Assim é como se engendra “isto” na alma, a qual, ao ter “isto” nela, é o que a salva.
Todas estas coisas podem ser também ditas na linguagem mais mítica do evangelho. O que o homem engendra com vistas à salvação é o Cristo interior, o Santo oculto, do qual a alma que crê, pode dizer com o salmista ungido: “Tu é meu filho; eu te engendrei hoje” (Sl 2,7). Na verdade, o Filho nasceu de Deus no princípio e se o salmista e alguns outros dizem dele que foi “engendrado hoje”, não é por razão de sua origem, senão por seu nascimento no mundo na alma do que creu.
Mas não há que esquecer que nunca é o Filho o que nasce, senão a alma a qual é reengendrada (vide MARIA), ao tomar nascimento de um “gérmen incorruptível — o que diz Pedro em sua primeira epístola — por meio da Palavra de Deus viva e permanente” (1P 1,23).