Herny Corbin
Por tanto, aunque haya huellas históricas siempre ocultas bajo el velo de lo que se llaman «leyendas», no es sin embargo siguiendo esas huellas inciertas como llegaremos a los caballeros del Temple que evocábamos al principio. Constataremos que la Imago Templi, adelantándose a toda percepción empírica, encierra en sí misma una fuerza tal que impone la evidencia, a parte ante y a parte post, de la filiación de la caballería del Templo. De un lado como de otro, la filiación se establece gracias a la soldadura de la idea iniciática y la idea de caballería espiritual. A un lado y a otro, hay que tener en cuenta que es Ia Imago Templi la que así toma conciencia de sí misma, y se comprenderá entonces que los vínculos de ascendencia y descendencia reivindicados no son de los que dejan huellas en los documentos de los archivos. A parte ante, la Imago Templi, tal como toma conciencia de sí misma por la caballería templaría, reivindica un origen que se remonta a la comunidad judeo-cristiana primitiva de Jerusalén, y a través de ella a la comunidad de los esenios. A parte post, determina la resurgencia de la idea templaría en el siglo XVIII: es la gran obra de Willermoz. Será también la epopeya dramática concebida por Zacharias Werner. Será, dominando el conjunto, la revelación de la Nova Hierosolyma en Swedenborg. Otras tantas hierofanías de la Imago Templi que tienen en jaque tanto las explicaciones como las denegaciones de la crítica histórica positiva, porque la Imago adelanta y regula cualquier juicio histórico. No es, pues, la crítica histórica la que está en condiciones de explicarnos esta persistencia de la Imago Templi. Para que pudiera hacerlo haría falta que se dirigiera a la «confluencia de los dos mares», allí donde los centinelas nocturnos velan sobre los muros del Templo, vigilando el retroceso de la noche y el progreso del alba. Es, pues, con la condición de satisfacer las exigencias de una hermenéutica muy diferente a la de la crítica histórica como estaremos en condiciones de valorar las hierofanías de la Imago Templi, que forman la tradición del Templo.
Antonio Carlos Carvalho
Para podermos perceber os objetivos destes novos cavaleiros e o que foi a sua ação em Portugal, torna-se indispensável fazer uma pequena, sintética mas esclarecedora, viagem ao passado, à época em que esta Ordem de monges-cavaleiros foi criada.
Estamos na Idade Média, mais propriamente no tempo das Cruzadas. Alguns cavaleiros cristãos que se tinham dirigido à Palestina para tentar libertar a Terra Santa das mãos dos muçulmanos e que se encontraram reunidos à volta de uma figura certamente carismática, o nobre francês Hughes de Payns, decidem fundar, em 1118, uma Ordem de Cavalaria influenciada pelo monaquismo, tão influente nesses lugares. Balduino, rei cristão de Jerusalém, designa-lhes como sede um edifício situado no mesmo lugar, onde outrora teria existido o Templo de Salomão — daí o seu nome de Cavaleiros do Templo. A primeira missão desta Ordem será a de assegurar a tranquilidade das estradas que conduzem aos lugares santos, protegendo os peregrinos contra os sarracenos e os ladrões e vigiar as cisternas da preciosa água. É uma missão modesta mas essencial, à qual os cavaleiros se dedicam inteiramente, ligados entre si pelos votos solenes de combater os inimigos de Deus «na obediência, na castidade e na pobreza» (votos perfeitamente monásticos, como se vê).
Balduino, compreendendo que estes homens e a sua abnegação podiam ser muito úteis na consolidação do reino de Jerusalém, sempre ameaçado, decide então enviar Hughes de Payns a Inglaterra e a França, ao concilio de Troyes, a fim de dar a conhecer a nova Ordem e recrutar novos elementos.
Foi precisamente nesse concilio local, em 1128, que a nova Ordem de Cavalaria veio a receber a sua regra. E foi São Bernardo, abade da nova abadia cisterciense de Claraval, na sua qualidade de secretário do concilio, o encarregado de redigir essa regra (ou, pelo menos, de traçar as suas linhas gerais e de força, porque parece que somente mais tarde foi chamado a completá-la, terminando a sua redação definitiva em 1131). Comentou seguidamente essa regra num tratado, «De laude novae militae», em que expôs eloquentemente, como era seu hábito, a missão e o ideal da cavalaria cristã, do que ele chamava «a milícia de Deus»:
«Uma nova cavalaria apareceu na terra da Encarnação. É nova e ainda não posta à prova no mundo, onde ela condu2 um novo combate, tanto contra adversários de carne e de sangue como contra o espírito do mal nos céus. E que os seus cavaleiros resistam pela força do seu corpo aos inimigos corporais, não o julgo maravilhoso, porque não o considero raro. Mas que eles conduzam a guerra pelas forças do espírito contra os vícios e os demônios, chamarei a esse fato não apenas maravilhoso mas digno de todos os louvores concedidos aos religiosos (…) É verdadeiramente sem medo e sem afronta o cavaleiro que protege a sua alma com a armadura da fé, tal como cobre o seu corpo com uma cota de malha. Duplamente armado, ele não tem receio dos demônios nem dos homens. Certamente aquele que deseja morrer não receia a morte. E como temeria morrer ou viver aquele para quem a vida é Cristo e a morte recompensa? Avante, então, ó cavaleiro, e ataca com arma intrépida os inimigos de Cristo, seguro de que nada te pode separar da caridade de Deus.»
E opondo os outros cavaleiros («que se vestiam como mulheres» e que preferiam «o luxo e o prazer ao combate») aos novos cavaleiros, os da Ordem do Templo, dizia destes últimos que «vão e vêm a um sinal do seu comandante; usam as vestes que lhe são dadas, não procurando outras nem outra alimentação. Desconfiam de todo o excesso de víveres ou de vestuário, desejando apenas o necessário. Vivem todos juntos, sem mulheres nem crianças (…). Na sua companhia não se encontram preguiçosos nem vadios: quando não estão de serviço (o que só acontece raramente) ou a comer o seu pão, dando graças ao Céu, ocupam-se a reparar os estragos e os rasgões feitos nas suas vestes e arreina; ou então fazem o que seu mestre lhes ordena ou o que necessidades da sua casa lhes indicam (…). As palavras insolentes, os atos inúteis, os risos imoderados, as queixas e as lamentações, se são notadas, nunca ficam impunes. Detestam o xadrez e os dados; têm o horror da caça, não encontram o prazer habitual na ridícula perseguição das aves. Evitam e abominam os mimos, os mágicos e os jograis, as canções levianas e as farsas. Cortam os cabelos rente, sabendo, através do Apóstolo, que é uma ignomínia para um homem cuidar da sua cabeleira. Nunca se veem penteados, raramente lavados, têm a barba hirsuta, cobertos de poeira, manchados pelos seus arreios e pelo calor».
(Eis o retrato do cavaleiro Templário feito pelo próprio patrono da Ordem. Podemos ainda acrescentar a este retrato os seguintes pormenores, dados pelo nosso historiador Alexandre Herculano. «Primeiros no ferir, eram os últimos a retirar-se, quando assim lho ordenavam. Desprezando os combates singulares, preferiam acometer em colunas cerradas e para eles não havia recuar; ou as dispersavam ou morriam. A morte era, de fato, mais bela para o Templário que a vida comprada com a covardia. Bastava que não atingisse ao tipo de valor humano, como os velhos guerreiros da Ordem o concebiam, para ser punido por fraco. A cruz vermelha, distintivo da corporação, com o manto branco sobre que estava bordada, tirava-se-lhe ignominiosamente, e ele ficava separado dos seus irmãos como um empestado. Obrigavam-no a comer sobre o chão nu; não lhe era lícito o desforço das injúrias e nem sequer castigar um cão que o maltratasse. Só depois de um ano, se o capítulo julgava a culpa expiada, o desgraçado cingia de novo o cíngulo militar, para ir, talvez, na primeira batalha afogar no próprio sangue a memória de um ano de afrontas e de suplício»).
E ao mesmo tempo que obtém o apoio do Papa, São Bernardo desencadeia uma nova Cruzada que tentará assegurar as bases cristãs na Palestina. [Antonio Carlos Carvalho: Mas o que era a Ordem do Templo?]