Zoroastro Nova Ordem

PAUL DU BREUIL — ZOROASTRO

NOVA ORDEM DO MUNDO
Com Zoroastro o pensamento religioso efetua um progresso tal que a ideia de fazer uma simples reforma no masdeísmo tradicional dá lugar à de uma verdadeira revolução teológica e ética. Zoroastro criou uma ordem inteiramente nova e estigmatizou os costumes cruéis e mágicos dos sacerdotes de seu tempo, Mas, preocupado em ser compreendido por todos, utilizou os nomes do politeísmo ariano, para transpô-los para o domínio abstrato de uma revolução espiritual em que as novas entidades servem unicamente para designar as qualidades do deus único Ahura Masda. A recuperação do antigo fundo religioso fez com que durante muito tempo o zoroastrismo parecesse um acontecimento reformador do antigo masdeísmo, embora ele já o houvesse metamorfoseado totalmente.

Do antigo panteão indo-iraniano o Sábio conservou apenas o único grande Ahura/Varuna, divindade uraniana cujo corpo, identificado com a abóbada celeste, é salpicado de olhos-estrelas que tudo veem e observam todas as ações terrestres. Varuma aparecera já, desde -1380, ao lado de Mitra, de Indira e dos gêmeos Nasatias (Mitras, Uruvrta, Itidara Nashationa), num trabalho concluído em Bogazqueni (Anatólia) entre o rei dos hitias e o dos mitanis, indo-europeus parentes dos árias indo-iranianos. Paralelamente ao duo Mithra-Ahura no Irã, na índia elaborou-se o de Mitra-Varuna. Mithra/Mitra, divindade solar, não se limitava ao astro luminoso e foi assimilado “à vista de Ahura Masda” (Yt. 13), ao passo que as estrelas representavam seus “espiões”.

No Egito a inovação monoteísta de Amenófis IV no culto de Aton, simbolizado pelo disco solar, não teve o mesmo futuro do monoteísmo zoroástrico de Ahura Masda porque ali onde o novo clero foi intolerante a ponto de perseguir os politeístas egípcios, os fiéis de Zoroastro inauguraram uma dimensão religiosa nova, sem opor um novo sacerdócio teocrático aos pregadores dos cultos populares do antigo Irã. Além disso, no Egito como no Irã, as preocupações sobre a vida no além tinham uma importância que o faraó reformador negligenciava, o que lhe foi fatal, ao passo que o autor das Gâthas purificava o outro mundo ao moralizar seu acesso, sempre reafirmando sua existência.

Ahura/Varuna conservava, antes de Zoroastro, as características naturalistas e antropomórficas da mitologia arcaica, traços partilhados com seus cruéis associados Indra, na índia, e Mitra, no Irã, os quais prejudicavam a obra moralizadora do Profeta.

O culto solar egípcio de Ra, Hórus e Aton oferecia grande semelhança com o do Masda pré-zoroástrico. Aton afirma um monoteísmo e uma preocupação moral inédita e Hórus apresentava uma figuração (disco solar alado com cabeça de falcão) e um simbolismo (o sol e a lua eram seus olhos) próximo do Ahura-masda das inscrições aquemênidas. Na Grécia, Apoio, deus solar que levava o qualificativo de Febus (o resplandescente), foi um dos profetas, uma vez que a luz de seus raios dissipa as trevas, clareia ao longe e vê, conseqüentemente, o futuro. O sol Hélio fora diferente de Apoio antes de ele ser identificado, como se verá pela osmose dos cultos de Apoio e Mitra elaborada no Irã helenizado. Na índia, Indra deu à luz ao sol e à aurora (Rig-Veda). Esta enumeração sucinta mostra simplesmente a universalidade do culto solar e, mais ou menos diretamente, todos os deuses uranianos, do Diaus das tribos arianas ao Varuna da Índia antiga, tinham a luz do sol e dos fogos estelares como principal atributo divino.

O que se deve notar é que os povos do norte, do hiperbóreo, de onde procediam as tribos indo-europeias, atribuíram ao sol, à luz, ao fogo, qualidades inerentes aos seus deuses, uma natureza benfeitora, em virtude da longa noite polar invernal e do clima, ao passo que os povos das regiões quentes onde o sol arde e não falta só tardiamente viram essas qualidades ou continuaram a atribuir-lhe uma natureza reclamadora de horríveis sacrifícios humanos (México), sobretudo no momento de pânico provocado pelos eclipses solares.

Para Zaratustra, Deus não é somente a fonte da luz física do sol e dos astros cintilantes. Ele é o apelo secreto que desperta na consciência toda luz moral e espiritual.
*Ahura-Masda
*Tríade de Zoroastro