Teresa de Jesus, Santa (1515-1582)
Teresa de Cepeda e Ahumada nasceu em Ávila e morreu em Alba de Torres. Aos 18 anos ingressou no Carmelo da Encarnação de Ávila (1533) e depois de 30 anos de vida religiosa sentiu-se chamada para fundar um mosteiro onde se vivesse sem mitigações, em plena pobreza e austeridade, a regra que Inocêncio IV aprovara para os carmelitas no séc. XIII. Com a ajuda inicial do provincial dos carmelitas, e após superar as dificuldades colocadas por outras freiras e pelas mesmas autoridades da cidade, fundou, no ano 1563, e na mesma Ávila, o primeiro mosteiro da Reforma. Ganhou São João da Cruz para a sua causa e abriu em 1568 o primeiro convento de carmelitas descalços. Vieram depois outras funções femininas em Castilla e em Andaluzia, principalmente, até dúzia e meia, como o conta a própria Teresa com grande vivacidade e finura psicológica no Livro das fundações. Suas viagens e peregrinações mostram-nos que, em 1582, ano de sua morte, esteve em Ávila, em Medina, em Valladolid, em Palência, em Burgos, para chegar fatigadíssima a Alba de Torres em 20 de setembro. Ainda com incríveis esforços, foi no dia seguinte à capela para comungar. Morreu em 4 de outubro de 1582. Foi declarada doutora da Igreja Universal em 1970.
— Com Teresa de Jesus nasceu um dos movimentos de espiritualidade mais vivos da Igreja da Contra-Reforma: a escola mística de Teresa de Ávila e de João da Cruz, e um florescente movimento teológico que, partindo de Salamanca, exerceu em toda a Europa uma considerável influência. O programa teresiano não consistia tanto numa reforma no sentido de reação contra os abusos que se introduziram lentamente, quanto na afirmação de um ideal de vida religiosa eremítico-contemplativa, em grande medida original e em franco contraste com as tendências em vigor entre os calçados.
— Mais interessante e mais original do que a reforma é sua própria vida e experiência religiosa tal como nos ficou nas passagens contadas pelas pessoas que a conheceram, nas muitas cartas que escreveu e em suas obras ascético-místicas. Leitora assídua e cheia de curiosidade por saber e entender a teologia, Teresa é uma “grande divulgadora de conceitos sagrados”. Mulher de inteligência sumamente desperta e vivíssima sensibilidade, descobriu por si mesma o mundo da cultura, afirmando que “grande coisa é o saber e a literatura para todos”. Afirma que a inteligência humana sem leituras e meditações fica estéril, e intui que o mais importante na vida é o amor de Deus, porque “a questão não está em pensar muito, mas em amar muito”.
— Dessa inteligência e sensibilidade nasceu uma devoção popular, humilde, afetiva, que recorreu a comparações correntes como a do jogo de xadrez, a dama, as propriedades da água, a cozinha etc. E daí nasceu também seu estilo inconfundível, que Frei Luís de Leon louvou pela delicadeza e claridade com que trata das coisas sublimes, pela sua maneira de se exprimir, pela pureza e facilidade do seu estilo, pela graça e pelo bom uso das palavras e por uma elegância desataviada, que agrada ao extremo.
— O mais interessante, no entanto, e o mais original é que toda a obra da santa é uma autobiografia do reino interior, ou a particularidade de sua vida de fundadora. Interessa-lhe falar de suas próprias experiências, dos favores divinos que alcançou. Nessa “intimidade surpreendente”, que captou Américo Castro, aparecem paisagens interiores antes inexploradas. Neste sentido, coloca-se a obra de Teresa à frente de toda a literatura psicológica, especialmente autobiográfica, dos séculos posteriores. A relação com as Confissões de Santo Agostinho é evidente, e também a identificação com seu sistema, com seu descobrimento da alma.
— Na obra escrita de Santa Teresa distinguem-se três tipos: a) a correspondência epistolar ou cartas; b) os livros de circunstâncias; c) os autobiográficos e doutrinais.
a) As cartas, que representam a forma mais próxima da conversação, têm um valor filológico, histórico, na vida e nas obras da santa. Representam estados vivos da alma, instantes ricos em força e oportunidade.
b) Entre os livros de circunstâncias devemos incluir: Livro das fundações; Livro das relações; Livro das constituições etc. Embora dedicados à narração dos fatos externos da ordem, encontramos detalhes interessantes da psicologia e da espiritualidade da santa.
c) Aparte mais densa e interessante é o autobiográfica e doutrinal. Encontramos o Livro da vida; O caminho de perfeição; As Moradas e os Conceitos.
— O Livro da vida é uma obra-mestra de confissão íntima e de autobiografia. O interesse literário está na forma tão bela em que se alternam os fatos com os favores sobrenaturais e com as conclusões teóricas de mística. O interesse religioso apoia-se no desvelamento gradual da alma em sua experiência religiosa cristã. A mística aparece viva na pessoa de Teresa.
— As Moradas ou Castelo interior é o livro doutrinal mais importante da santa. “Para analisar a alma na experiência mística, baseia-se na metáfora de um castelo todo de diamante e muito claro cristal, onde há muitos aposentos, assim como no céu há muitas moradas.” Essas sete moradas correspondem a diversos estados de perfeição: formam os diversos graus da vida de purificação, de iluminação e, por último, de unidade.
Nas últimas moradas realiza-se “o divino e espiritual matrimônio”. De tal forma faz-se uma com Deus, que se pode dizer que “esta borboleta já morreu, com grande alegria de ter encontrado repouso, e que nela vive Cristo”.
— Os Conceitos do amor de Deus são o complemento de As Moradas. De sua poesia, a crítica nos diz que possuía o mais alto grau de criação poética, mas não dominava a forma adequada. Conseguiu, no entanto, belas criações como: “Que meus olhos te vejam, doce Jesus bom”; “Vivo sem viver em mim” etc.
Para terminar, recolhemos o testemunho de Frei Luís de Leão: “Conheci e vi a Madre Teresa de Jesus enquanto esteve na terra, mas, agora que vive no céu, conheço-a e vejo-a quase sempre em duas imagens vivas que nos deixou de si, que são suas filhas e seus livros”.
BIBLIOGRAFIA: Obras completas de Santa Teresa de Jesús (BAC), 3 vols., Id., Obras completas de Santa Teresa de Jesús (BAC), 1 vol.; Efrén de la Madre de Dios e Otger Steggink, Tiempo y vida de Santa Teresa (BAC), Madrid 1968, com a bibliografia aí publicada. (Santidrián)