Tertuliano Anima

TERTULIANO — DE ANIMA

1: A REVELAÇÃO DE HERMES TRISMEGISTUS

O plano do De Anima se destaca claramente:
*I Natureza da Alma 4-22
*II Origem, tempo e modo de encarnação da alma 23-36
**1 Teorias falsas, derivando da anamnesis platônica 23-24
**2 Verdadeira doutrina 25-36
***(Digressão sobre a metempsicose)
*III Sorte da Alma Encarnada
**1 Crescimento e puberdade do ser vivo 37-41
***(Na puberdade — 14 anos — a alma adquire o sentido do pecado donde: tratado do pecado 39-41)
**2 Morte do vivente 42-53
***(O sono é uma imagem — speculum — da morte donde: tratado do sono e do sonho 43-49)
*IV Escatologia 54-58

Em suas linhas gerais, este plano, onde, depois de ter definido a alma (o que vem em primeiro lugar, com base no Peri Psyches de Aristóteles), segue o exame de seu lugar de origem durante todo curso de sua aventura terrestre até sua ascensão ao céu, se inspira no platonismo e deve ter sido um esquema clássico nas escolas filosóficas da época. Pois o encontramos por um lado exatamente similar no Peri psyches de Iamblichus, e por outro é o plano adotado pelos heréticos dualistas que Tertuliano combateu. Tertuliano observa ele mesmo, no início da IIa seção: «Alguns creem que desceram do céu e estão tão seguros nesta persuasão quanto em sua convicção de ascender ao alto». Ele cita então os heréticos Saturninus, discípulo de Menandro (o homem obteve uma scintillula vitae que, depois da morte, o fará retornar a sua fonte original), Carpocrate (as almas saíram da sublimis virtus — hyperkeimene exousia (Irineu, I,20,1) — e elas desprezam portanto todos os poderes deste mundo), [wiki base=”fr”]escola de Valentino[/wiki] (A alma contém um germe de Sabedoria celeste — semen Sophiae — que lhe permitirá ascender ao céu). Em seguida adiciona: «Eu me aflijo que Platão tenha se tornado de boa o provedor (condimentarius) de todos os heréticos. Pois é ele que disse, e, no Fédon, que as almas passam daqui ao alto e do alto até aqui, e assim como, no Timeu, que os descendentes de Deus, depois de serem confiados a criação dos mortais e ter recebido de Deus a substância original da alma, cercaram a alma imortal de um corpo sólido mortal». Esta observação é perfeitamente justa: basta lembrar o capítulo 16 do Didaskalikos de Albino onde ele resume, segundo o Timeu (41-42), a doutrina platônica da descida e da subida das almas humanas.

Esta disposição geral também se apresenta como tal na gnose herética do Poimandres. Nesta para explicar a natureza do homem, que é dupla (alma e corpo), se coloca o problema das origens: geração, a partir do Deus macho-fêmea, do anthropos divino; queda deste anthropos na matéria, onde se une à physis; geração a partir da união dos homens terrestres livres e imortais quanto à alma, escravos da heimarmenes e mortais quanto ao corpo; diversidade da conduta dos homens terrestres segundo eles sigam o corpo ou a alma; escatologia, diversa ela também segundo o comportamento na terra.

Logo, para2, parece muito provável que Tertuliano tomou emprestado o quadro de conjunto de seu tratado às doutrinas então reinantes sobre a descida e a subida da alma. O próprio Tertuliano dá a entender isto quando afirma no tratado ser este a continuação de um tratado anterior “Sobre a origem da alma” e que ambos tratados são dirigidos contra as heresias que derivam em linha direta do dualismo platônico, seguindo portanto esta refutação o modelo de quadro dos sistemas dualistas.


  1. Festugière 

  2. Festugière