Renascimento

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O termo “Renascimento”, como categoria historiográfica, consolidou-se no século XIX, em grande parte por mérito de uma obra de Jacob Burckhardt intitulada A cultura do Renascimento na Itália (publicada em Basileia, em 1860), que se tornou muito famosa, impondo-se longamente como modelo e como ponto de referência indispensável. Na obra de Burckhardt, o Renascimento emergia como fenômeno tipicamente italiano quanto às suas origens, caracterizado pelo individualismo prático e teórico, pela exaltação da vida mundana, pelo acentuado sensualismo, pela mundanização da religião, pela tendência paganizante, pela libertação em relação às autoridades constituídas que haviam dominado a vida espiritual no passado, pelo forte sentido de história, pelo naturalismo filosófico e pelo extraordinário gosto artístico.

Segundo Burckhardt, o Renascimento seria portanto uma época que viu surgir uma nova cultura, oposta à medieval. E a revivescência do mundo antigo teria desempenhado nisso um papel importante, mas não exclusivamente determinante. Escreve Burckhardt: “Aquilo que devemos estabelecer (…) como um ponto essencial é que não foi ressuscitada a Antigüidade por si só, mas sim ela e o novo espírito italiano, juntos e interpenetrados, que tiveram a força para arrastar consigo todo o mundo ocidental.” Assim, partindo do renascimento da Antiguidade, passou-se a chamar de “Renascimento” toda essa época, que, porém, é algo mais complexo do que isso: com efeito, é a síntese do novo espírito que se criou na Itália com a própria Antiguidade — é o espírito que, rompendo definitivamente com o espírito da época medieval, inaugurou a época moderna.

Essa interpretação foi muito contestada, por várias vezes, em nosso século. Alguns chegaram mesmo a duvidar que o “Renascimento” constitua uma efetiva “realidade histórica” e não seja muito mais (ou predominantemente) uma invenção construída pela historiografia do século XIX.

Variados e de diversos tipos foram os reparos feitos sobre o Renascimento.

Alguns observaram que, se atentamente estudadas, as várias “características” consideradas típicas do Renascimento também podem ser encontradas na Idade Média. Outros insistiram muito no fato de que, a partir do século XI, mas sobretudo nos séculos XII e XIII, a Idade Média pode ser considerada plena de “renascimentos” de obras e autores antigos, que pouco a pouco emergiam e eram readquiridos. Consequentemente, esses autores negaram validade aos parâmetros tradicionais que durante longo tempo haviam baseado a distinção entre a Idade Média e o “Renascimento”.

Mas logo se estabeleceu um novo equilíbrio, reconstituído em bases bem mais sólidas. Nesse meio tempo, porém, estabeleceu-se que o termo “Renascimento” não pode em absoluto ser considerado como mera invenção dos historiadores do século XIX, pelo simples fato de que os humanistas usavam expressamente (com insistência e com plena consciência) expressões como “fazer reviver”, “fazer voltar ao antigo esplendor”, “renovar”, “restituir a uma nova vida”, “fazer renascer o mundo antigo” etc, contrapondo a nova época em que viviam à época medieval como a época da luz contraposta à época da escuridão e das trevas. (excertos de Giovanni Reale, História da Filosofia, Tomo II)

Giovanni Reale