Novo olhar sobre o Éden
Este livro publicado há muitos anos na coleção Bibliothèque de l’Hérmetisme, dirigida por Antoine Faivre, enquanto coleção da editora Albin Michel, foi meu primeiro contato com o pensamento de Paul Nothomb. Confesso que fiquei estarrecido com as interpretações que dava do primeiros capítulos do Gênesis, como ainda fico. Realmente me dei conta que o que temos hoje em dia em termos de Antigo testamento, especialmente de Gênesis, são “estórias”, interpretáveis como alegorias ou figuras, de grande valor para a reflexão, mas que sob esta configuração nos eleva a um patamar aquém do ensinamento superior que estes escritos guardam por sua língua original hebraica e sua composição.
Que se pensaria de uma versão em língua estrangeira das fábulas de La Fontaine que traduzisse pela mesma palavra cigarra e formiga?
Fábula ou não, ao relato do jardim do Éden sucedeu uma desventura deste gênero. Ninguém nada mais aí entende porque certas palavras chaves que exprimem no original realidades opostas até incompatíveis são apresentadas em nossas “histórias santas” como muito próximas, senão como sinônimos. Fala-se de “terra”, de “solo”, de “pó” — termos a princípio desvalorizados, mesmo em nossas línguas. Mas a usara das palavras é um fenômeno comum a todas as línguas, fossem sagradas, por pouco que elas tenham uma história, e aquela do hebreu bíblico se estende por um milenário. Transmitido inicialmente oralmente, o relato do Jardim do Éden data pelo menos de setecentos anos antes da primeira tradução da Bíblia em língua estrangeira, que confunde frequentemente o hebreu bíblico vulgarizado de sua época (a época do Eclesiastes) com aquele das origens. A tradução Septuaginta oficializa em grego a perda de sentido, já perceptível nos comentários rabínicos. Além das interpretações redutoras, resta felizmente o texto hebreu intacto que permite reencontrá-lo. Descobre-se então que o relato onde trata-se da Árvore da Vida e da Árvore do Conhecimento não trata absolutamente de agricultura nem de cerâmica — de “terra”, de “solo” ou de “pó” — mas de realidades existenciais…