sexo

Considerando a relação erótica, seja em seu cumprimento imanente, seja em seu aparecimento mundano, reconhecemos como, envolvendo-se a cada vez em angústia, é também a cada vez ao fracasso que ela conduz. Uma reflexão mais aprofundada nos persuade de que, apesar das distinções fenomenológicas primordiais postas em jogo, a análise do erotismo permaneceu prisioneira de uma limitação decisiva. Esta tem que ver com o fato de que nenhuma carne pode ser examinada em si mesma à maneira de um dado autônomo, objeto de um processo de elucidação separado, se é verdade que ela não advém a si senão na vida. É essa a razão pela qual — tal como nós tivemos de constatá-lo diversas vezes e de maneira constante — tanto a análise da carne como de seus diversos constituintes remete, uma vez que se aprofunda, ao que se encontra antes dela: a impressão mais fugidia ao surgimento incansável de uma impressão sempre nova, o poder da carne à sua impotência original, a própria carne, enfim, à vinda a si da Vida absoluta. É somente essa referência de toda carne à Arquipassibilidade da Arquicarne da Vida absoluta o que permite dizer o que é, em última instância, a possibilidade para uma carne de constituir o lugar da perdição ou o da salvação. [325]

Ora, ao considerarmos a carne em sua relação com a Vida absoluta enquanto relação imanente, vemos cair imediatamente certos traços da relação erótica, notadamente a contingência e, assim, o absurdo da diferença sexual e, antes de tudo, da determinação sexual enquanto tal. É assim que o desejo — que se imaginava atingir no sexo a vida do outro ali onde ela se atinge a si mesma, seu prazer ali onde ele se experimenta a si mesmo — não encontra senão um corpo “côisico” heterogêneo ao espírito, cuja configuração objetiva permanece incompreensível ou indecente aos olhos deste, cuja vida, como quer que seja, lhe escapa.

Dir-se-á que é a dualidade do aparecer — mais precisamente, a objetividade das determinações sexuais e, assim, da própria relação erótica — a responsável pelo absurdo dessas determinações, bem como pelo fracasso do desejo. É assim certamente, e é esse primeiro ponto que pede uma explicação: por que a vida sexual parece, ao mesmo tempo, absurda e votada ao fracasso no aparecer do mundo? (Michel Henry, MHE)