Gregório do Sinai Objeções

Gregório do Sinai — Seleção de Jean Gouillard
Objeção:
Gostaria que me dissesses: jejuar, fazer abstinência, velar, permanecer de pé, fazer penitência, fazer metanias, praticar a pobreza, tudo isso não é vida ativa? Como podes dizer, mencionando unicamente a salmodia, que sem vida ativa é impossível possuir a oração (euche)? O que eu disse, não seriam também ações?

Resposta: De que vale fazer a oração (euche) vocal, quando o espírito fica passeando? Um arrasa o que o outro edifica: muito esforço, para pouco proveito. Quando se trabalha com o corpo (soma), é preciso trabalhar também com o espírito, senão teremos apenas a exatidão do corpo (soma), ao passo que o espírito ficará tomado pela acedia e pela impureza. O Apóstolo o confirma: “Se oro com a língua”, isto é, com a boca, “meu pneuma ora”, ou seja, minha voz, mas “meu espírito fica estéril. Oro com a boca, orarei também com o espírito… prefiro dizer cinco palavras com todo o meu espírito, etc.” ( 1Cor 14,14s )… “Não há nada de mais terrível que pensar na morte, diz são Máximo; nem nada de mais magnífico que a lembrança de Deus”. Ele quer mostrar com isso a excelência da obra.

Alguns, que se tornaram cegos e incrédulos por causa de sua extrema insensibilidade e ignorância, não querem nem mesmo admitir que haja graça (kharis) em nossa época.

7. Têm razão os que salmodiam pouco; essa é minha opinião. Observam as proporções, e a medida é excelente — ensinam os sábios. Não esgotam toda a potência da alma (psyche) na vida ativa, para não tornar o espírito negligente na oração (euche), e sem ardor para orar. Salmodiam um pouco e dão a melhor parte de seu tempo à oração (euche). Pode acontecer que o espírito, cansado pelo prolongamento de seu grito interior e de sua imobilidade, faça uma pequena pausa e, nos espaços da salmodia, se afrouxe da contração da hesychia. Essa é a hierarquia ideal e a doutrina dos mais sábios.

8. Quanto aos que não salmodiam nem um pouco, fazem bem, se estiverem entre os aperfeiçoados. Eles não têm necessidade dos salmos, mas de silêncio, de oração (euche) ininterrupta e de contemplação (theoria), se chegaram à iluminação. Estão unidos a Deus, não têm que afastar dele o espírito, para lançá-lo na dissipação. “O obediente cai por vontade própria, diz Clímaco; o hesicasta, pela interrupção da oração (euche)” ( Degrau 27 ). Seu espírito, separando-se do esposo — a lembrança de Deus — comete adultério e se toma de amores por pequeninas coisas.

Não é conveniente ensinar essa conduta a todos, indiferentemente. Aos simples e iletrados, que vivem na obediência, sim, porque a obediência participa de todas as virtudes (arete) na humildade (tapeinophrosyne). Em contrapartida, é melhor não dá-la aos que não vivem na obediência; correriam o risco de se desviar do caminho, quer sejam simples, quer gnósticos. Pois, o independente não escapa à presunção que naturalmente acompanha o erro, diz Isaac.

Alguns, por não avaliarem as perigosas conseqüências, ensinam, ao primeiro que aparece, a prática exclusiva desse exercício para instruir o espírito, dizem eles, para praticar e amar a lembrança de Deus. Isso não convém, principalmente quando se trata de idiorrítmicos. Seu espírito ainda é impuro, por causa da negligência e do orgulho. As lágrimas ainda não o purificaram; mais do que a oração (euche), ele reflete as imagens más dos pensamentos, quando os espíritos impuros do coração (kardia), perturbados pelo nome terrível, ralham com aquele que os flagela e ameaçam destruí-lo. O idiorrítimico que quer aprender essa ocupação e praticá-la, de duas, uma: ou vai se esforçar e se enganar — o que não mudará nada a seu estado — ou vai mostrar-se negligente e não fará progresso algum em toda a sua vida.

9. Acrescentarei isto, eu mesmo, fundado em minha pequena experiência: Quando, de dia e de noite, estás sentado em silêncio, orando a Deus com insistência, sem pensamentos, humildemente; quando teu espírito está cansado de gritar e o corpo (soma) está dolorido; quando o coração (kardia) não sente nenhum calor, nem alegria, na invocação de Jesus sustentada com energia — de Jesus que consegue, para os combatentes, resolução e paciência — então levanta-te, salmodia sozinho ou com teu companheiro; ou ainda, entrega-te à meditação de uma palavra, à lembrança da morte, ao trabalho manual ou à leitura, em pé, para cansar o corpo (soma).

Quando te dedicas à salmodia solitária, diz o Triságio, a oração (euche) do Senhor, com o espírito atento ao coração (kardia). Se a acedia te oprime, diz ainda dois ou três salmos, os tropários penitenciais, sem cantá-los… Como aconselha são Basílio, “deve-se variar diariamente os salmos para estimular a resolução, para que o espírito não se aborreça de repetir sempre os mesmos salmos; dando-lhe uma certa liberdade, a resolução só poderá melhorar”. Se salmodias em companhia de um discípulo fiel, deixa-o dizer os salmos, enquanto tu te vigias, inteiramente voltado para a atenção (epimeleia) e para a oração (euche) secreta do coração (kardia). Com a ajuda da oração (euche), despreza qualquer representação sensível ou intelectual que brote do teu coração (kardia); a quietude ( hesíquia ) é o despoja-mento provisório dos pensamentos que não vêm do Espírito, para não deixar a melhor parte, prendendo-se à bondade desses pensamentos.