MESTRE ECKHART — DO HOMEM NOBRE
Traduzido do espanhol por Edimar Silva e revisado por Edilson Almeida Pedrosa.
Nosso Senhor diz no Evangelho: “Um homem nobre viajou a um país distante para ganhar um reino e depois voltar”. Com essas palavras Nosso Senhor indica-nos toda a nobreza inata e natural do homem, e até que ponto a graça pode torná-lo divino. Essas palavras também cobrem grande parte da Escritura Sagrada. Deve-se saber de imediato o que, por outro lado, ensina-nos a Revelação: que existem duas naturezas no homem: o corpo e o espírito. Por isso é dito nas Escrituras: quem conhece a si mesmo conhece a todas as criaturas, porque todas as criaturas são um corpo e um espírito. Assim, a Escritura, falando do homem, diz que há em nós um homem exterior e um outro interior.
Um Homem
O homem exterior compõe-se de tudo o que, ainda que inerente à alma, está ligado e mesclado com a carne e que atua em cooperação corporal com cada membro, olho, ouvido, língua, mão etc. E tudo isso é o que a Escritura chama o homem velho, o homem terrestre, o homem exterior, o homem inimigo, o homem escravo.
O outro homem que existe em nós é o homem interior; a este a Escritura chama um homem novo, um homem celeste, um jovem, um amigo, um homem nobre. Desse fala Nosso Senhor quando diz que um homem nobre foi ao estrangeiro, conquistou um reino e voltou a seu país. Temos que pensar nisso quando São Jerônimo transmite-nos o ensinamento comum dos mestres: que todo homem, pelo fato de ser homem, possui um espírito bom, um anjo, e um espírito mau, um demônio.
O anjo bom aconselha e atrai o homem continuamente para o bom e o divino, o virtuoso, celestial e eterno. O espírito malvado aconselha e atrai sem cessar, para o temporal e passageiro, o pecador, malvado e diabólico. Esse espírito malvado está sempre cortejando o homem exterior, por intermédio de quem espreita constantemente o homem, Adão.
O homem interior é Adão, o homem na alma. Essa é a boa árvore de que fala Nosso Senhor, que sempre e ininterruptamente dá bons frutos; é também o campo onde Deus plantou Sua imagem e semelhança e onde lança a boa semente, a raiz de toda a sabedoria, de toda arte, de toda virtude, de toda bondade, semente de natureza divina. Essa semente é o Filho de Deus, o Verbo de Deus!
O homem exterior lhe é hostil, e ali a discórdia foi semeada e lançada com maldade. Sobre ele disse Paulo: “Existe algo em mim que se opõe e contraria o que Deus manda e aconselha”, o que Deus manda, o que foi dito e diz ainda no que há de mais nobre, no fundo da alma. Em outro lugar lamenta-se e diz: “Pobre de mim, ó infeliz! quem me livrará do corpo que me traz a morte?” E em outra passagem escreve que o espírito e a carne do homem estão sempre em luta entre si. A carne aconselha o vício e o mal, o espírito de Deus (aconselha) o amor a Deus, a paz, a alegria e todas as virtudes.
Quem obedece ao espírito e vive segundo seus conselhos possui a vida eterna; porém o que obedece à carne, morre. O homem interior é aquele de quem Nosso Senhor disse que um homem nobre foi a um país distante; é também a boa árvore de que Deus disse que sempre dá bons frutos e nunca maus; porque quer o bem e busca o bem e permanece no mesmo bem, insensível a isto ou àquilo.
SEGUE: PARTE PARA LONGE; GRAUS DO HOMEM INTERIOR; RECEBER O REINO; RETOMADA DO HOMEM; RETORNO DO HOMEM