Carvalho: Crescimento da Ordem do Templo

Com a segunda Cruzada, os Templários encontram os fundamentos da sua Ordem: são-lhes atribuídas importantes terras e outros bens, recebem também um hábito (manto branco com uma cruz vermelha sobre o coração, aos quais se referia Herculano), além de consideráveis privilégios: dispensa do pagamento de dízimos, independência em relação ao clero secular, possibilidade de estabelecer igrejas com capelães dependendo diretamente de Roma. Graças aos rendimentos da Ordem (e que pertenciam exclusivamente à comunidade, visto que o cavaleiro nada possuía de seu, como qualquer outro monge, uma vez que tinha feito voto de pobreza), torna-se possível construir castelos, fortalezas, igrejas e capelas, sedes da Ordem em numerosos lugares de vários países da Europa e também na própria Palestina.

Por toda a parte o seu prestígio aumenta. O seu valor militar inegável é reconhecido por amigos e inimigos, os seus exemplos de disciplina e de solidariedade impressionam a todos. Luís VII escreve a Suger: «Não vemos, não podemos imaginar como teríamos podido subsistir um instante sem a sua ajuda e resistência. Portanto, pedimos que redobrem de simpatia para com eles, a fim de que possam sentir que intercedemos por eles. Além do mais, informamo-vos que nos emprestaram, em seu próprio nome, uma soma considerável.»

E aqui tocamos um dos aspectos mais curiosos, mas também mais sujeitos a mal-entendidos — todos aqueles que partiam a caminho da Terra Santa, em peregrinação ou para combater pelos seus ideais, em vez de se sujeitarem ao risco de transportarem dinheiro e joias consigo, nessa viagem, preferiam fazer um depósito numa casa da Ordem, situada na Europa, sabendo que, depois, na Palestina, poderiam levantar a mesma soma ou valor, mediante a apresentação de um simples recibo. Ou seja: a Ordem do Templo funcionava igualmente como um banco internacional. Essa função permitia-lhe ser depositária de enormes recursos c riquezas que geria exemplarmente, emprestando aos reis (de França, de Inglaterra e de Jerusalém) quando eles precisavam, como aconteceu várias vezes. Em contraste com os bancos vulgares, que conheceriam nessa altura uma grave crise, o Templo dava uma imagem de confiança e probidade. Os rendimentos que obtinha com essas operações financeiras eram aplicados na sua própria expansão, alargando a ação dos cavaleiros-monges no seu combate em nome de Cristo. Adiante veremos como esse papel, no entanto, acabou por lhes ser fatal…

Em combate, seguia à frente de todos o «baussant», o estandarte da Ordem, dividido em duas cores: negro e branco, que alguns interpretavam como significando que eles eram francos c benevolentes para os seus amigos e negros e terríveis para com os seus inimigos, leões na guerra e cordeiros na paz… Mas o negro e o branco têm igualmente um significado mais profundo: um simbolismo de caráter esotérico — são as mesmas cores do xadrez, jogo altamente simbólico, e do Yin e do Yang, como do Bem e do Mal, do Sim e do Não, da Terra e da Água, etc. Dualidades que se devem resolver numa unidade (e por isso sobre as duas cores, branca e negra, os Templários afixavam uma cruz, símbolo de unidade e totalidade…)

Regendo toda a Ordem havia uma divisa, as palavras do hino apaixonado de David, «Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao Teu Nome dá glória». E a presença da Virgem, em honra de quem a Ordem fora constituída1 (vemos novamente aqui a influência de São Bernardo, um autêntico cavaleiro espiritual ao serviço de Maria e que dava à Virgem o título de «Nossa Senhora», «Notre Dame», que desde então se generalizou no Ocidente). Metade das orações ditas quotidianamente eram consagradas à Santa Virgem e deveriam ser ditas de pé (como ainda hoje acontece nas liturgias orientais — e a Ordem do Templo nasce e cresce em contacto constante com essas liturgias ortodoxas). De acordo com a regra da Ordem, «Nossa Senhora foi o começo da nossa religião e nela e em honra dela será, se Deus quiser, o fim da nossa religião».

Quando o candidato a cavaleiro se apresentava diante do Mestre, pedindo-lhe para ser recebido na Ordem, devia declarar:

«Senhor, vim diante de Deus, diante de vós e diante de Nossa Senhora, pedir e requerer por Nossa Senhora que seja acolhido na vossa companhia e que me façais participar dos benefícios da casa como aquele que, a partir de agora e para sempre, quer ser servo e escravo desta casa.»

E o Mestre do capítulo respondia:

«Irmão, pedis muitas coisas porque da nossa Ordem não vedes senão a parte exterior (…) Mas não sabeis os duros mandamentos que existem no interior: porque é duro que vós, que sois senhor de vós mesmo, vos façais servo de outro. Porque dificilmente fareis alguma vez o que quiserdes: porque se quiserdes estar em Acra, sereis enviado à terra de Tripoli ou de Antioquia ou da Armênia (…), se quiserdes dormir, far-vos-ão estar de vela; e se por vezes quiserdes velar ordenar-vos-ão que vos repouseis no vosso leito.»

Ao neófito eram prometidos, ainda, o pão e a água e «a pobre veste da casa e muitas penas e trabalhos». Três dias por semana devia abster-se de comer carne; duas vezes por ano tinha quaresma, na Páscoa e antes do Natal.

Antonio Carlos Carvalho


  1. Porque Maria é a própria imagem da Igreja e esta é representada exteriormente pelo Templo — os Templários, tal como São Bernardo, seu guia espiritual, terão como missão guardar e defender Maria-Igreja, que terá a sua verdadeira «Dama».