LOGIA JESUS — SEGUE-ME (Mt VIII, 18-22; Lc IX, 56-62)
18 Mas Iéshoua vê multidões numerosas à sua volta e ordena que passem para o outro lado. 19 Um Sophér se aproxima e lhe diz: «Rabi, eu te seguirei por onde quer que fores.» 20 Iéshoua lhe diz: «As raposas têm covis, os pássaros do céu, ninhos; mas o filho do homem não tem onde repousar a cabeça.» 21 Outro dos adeptos lhe diz: «Adôn, permite-me ir primeiramente sepultar meu pai.» 22 Iéshoua diz: «Segue-me! Deixa os mortos sepultarem seus mortos!» (tr. Chouraqui) (tr. Almeida: Mt 8:18-22)
56 Eles dirigem-se a um outro vilarejo. 57 Eles vão pela estrada. Alguém lhe diz: «Eu te seguirei aonde quer que vás.» 58 Iéshoua lhe diz: «As raposas têm covis, os pássaros do céu, ninhos; mas o filho do homem não tem onde repousar a cabeça.» 59 Ele diz a um outro: «Segue-me!» Ele diz: «Permite-me primeiro que vá enterrar meu pai.» 60 Iéshoua lhe diz: «Deixa os mortos enterrarem seus mortos! Mas tu, vai anunciar o reino de Elohíms.» 61 Um outro ainda diz: «Eu te seguirei, Adôn; mas permite-me primeiro despedir-me dos de minha casa.» 62 Mas Iéshoua lhe diz: «Aquele que põe a mão no arado olhando para trás de si não é bom para o reino de Elohíms.» (tr. Chouraqui) (Tr. Almeida: Lc 9:56-62)
O que significa a ordem de Jesus “segue-me”? Que sentido pode ter como injunção através dos tempos? O dito apresenta duas versões até a injunção “segue-me”, segundo dois contextos diferentes:
- diante de “multidões” opta-se “pelo outro lado”, porém alguns aparentemente ainda dentre as “multidões” se manifestam: um se dispõe a seguir, outro se interessa mas tem um enterro a atender.
- dirigindo-se de um lugar a outro pela estrada, alguns se aproximam com falas similares, exceto por um, disposto a seguir mas que precisa se despedir…
A todos a ordem é uma só “segue-me”, a mesma palavra grega Άκολουθέω (akoloutheou) usada pelo evangelho para se referir aos que seguem Jesus em outras passagens (90 ao todo), como a conhecida “toma sua cruz e segue-me”. Tantas vezes mencionada, mas que pode significar além da ordem ou convite ou disposição dos que seguiram? O que é “seguir” quem não mais está presente corporalmente? “Seguir”, “ir atrás”, “acompanhar” Jesus aqui e agora?
Ao que está disponível para seguir, Jesus alerta: o filho do homem não tem onde repousar a cabeça. Ao que Jesus comanda “segue-me”: ele se mostra não disponível no momento. O que se quer indicar?
Poderia “segue-me” ser entendido como “persegue-me”, “incansavelmente busca-me”, pois o filho do homem não tem onde repousar a cabeça, e o atendimento às exigências da cultura, da sociedade, não importam. A “única coisa necessária” (outro dito de Jesus), o que importa, é “per-seguir-me”, ou seja, “seguir-me por mim mesmo”.
O interessante é que os comentários abaixo citados focam apenas nas locuções adicionais sobre o filho do homem e sobre os mortos.
Antonio Carneiro
Vulgata Lc IX,59. Ait autem ad alterum: Sequere me.
O verbo “sequor” tem múltiplos significados:
- Seguir, acompanhar, ir atrás de;
- Caminhar, ir na direção de, seguir um caminho;
- Seguir com a vista ou com o ouvido, responder imediatamente, fazer depois, responder, corresponder;
- Perseguir, ir no encalço de;
- Vir depois, seguir-se a, resultar;
- Seguir, conformar-se com, escutar, obedecer a, fazer caso de, tomar em consideração, referir-se a, aceitar, adotar.
Entre outros significados. Porém estes foram suficientes para concluir que a passagem em questão Jesus fala como homem sendo Deus, ou seja faz um CHAMAMENTO ou uma CHAMADA, Jesus é o CAMINHO, a VERDADE e a VIDA, ninguém chega ao PAI senão por mim.
A tradução do latim no item 2 “seguir um caminho” se adequa a Jesus e consequentemente a Deus (PAI).
O termo CHAMAMENTO ou CHAMADA, recorro ao seu uso quando atribuído em literatura como “o chamado do mar”, “o chamado da selva” como algo inexplicável como um apelo irresistível, sem identificação da Origem nem do Fim, inexplicável.
A Origem do Mar onde começa onde termina (ΑΩ)?
Chamada pode ser também o procedimento que o Professor fazia para contatar a existência de seus alunos, que deveriam responder PRESENTE, quando era o próprio ou AUSENTE pelos demais. Alguns poderiam estar lá mas estavam desatentos, outros poderiam estar ainda por chegar por estarem atrasados, outros teriam saído da sala de aula por quaisquer motivo, por isso foram considerados AUSENTES.
Essas imagens ajudam a interpretar “muitos serão chamados, mas poucos escolhidos” assim como “quem me ouvir me entenderá”, poderia ser considerado como o chamamento para caminhar rumo a Deus, ousaria trocar os “escolhidos” por “os que encontraram o Caminho” ou “atenderam ao chamado”.
Roberto Pla: Evangelho de Tomé – Logion 11
Por outro lado, estão mortos os que não ouvem a Palavra, os que não escutam a voz do Filho de Deus. Deles se diz que “habitam em trevas e sombra da morte” (Is 9,1; Lc, 1,79) e se os considera como mortos àqueles que há que deixar com tarefa única “que enterrem a seus mortos” (Mt 8,22; Lc 9,60), e isso certifica que o Adão psíquico-hílico vive somente para a morte.
A duas classes de “mortos” se refere Jesus na ocasião daquele discípulo que pedia uma moratória para enterrar seu pai antes de seguir a Jesus. O “rabi” utiliza aqui para sua resposta o duplo sentido do vocábulo “mortos”, que no logion sintético dado pelo evangelhos vem soar muito duro nos ouvidos de quem só tem presente os mortos “manifestos”, mas que serve muito bem para o objeto de diferenciar as dua classes de mortos as quais se refere o evangelho: “Deixa que os mortos (vivos) enterrem a seus mortos (manifestos)” (Mt 8,22).
Os mortos vivos não são outra coisa que os filhos da luz que esperam na catividade que a alma, a consciência psíquica do homem, se dê conta de que deles, de sua essência, lhes vem o sopro da Palavra neles semeada. Para esta classe de mortos está reservado passar da morte à vida — à claridade da consciência do homem — sem incorrer na necessidade de juízo (Jo 5,24). É por estes que diz Jesus que alguns “não saborearão a morte até que vejam ao Filho do homem vir em seu Reino”.
Evangelho de Tomé – Logion 42-43
O que pede Jesus ao dizer: “sede transeuntes”, é uma identificação da consciência com o espírito eterno, infinito, semelhante a uma esfera com o centro em todas as partes, ou em nenhuma, segundo se interprete e, em consequência, privado de lugar próprio no mundo de baixo. Isto é o que explica Jesus quando em resposta ao escriba que quer seguir seus passos, o adverte: “O Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça” (Mt 8,20; Lc 9,58); e algo similar o dirá a Nicodemo, na ocasião de seu memorável diálogo com o magistrado judeu relatado no evangelho joanico (vide Nascer do Alto): “O vento (espírito) sopra onde quer e ouves sua voz, mas não sabes de onde vem nem a onde vai” (Jo 3,8).
Mario Satz
Sendo a cabeça imagem do céu, da abóbada celeste, bem disse Jesus em Mateus 8,20: “As raposas têm suas tocas, e as aves do céu seus ninhos, mas o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça”.
Como devemos interpretar as alusões de Jesus? Negativa ou positivamente? Queixa-se ele ou antes celebra a não existência de um ponto de apoio? A versão grega diz kephalen kline. Esta última palavra significa “leito”, “cama”, “reclinatório”, mas também “féretro” ou “ataúde” (menção lembrada a seguir no dito dos “mortos enterrarem seus mortos”). Podemos suspeitar, então, que deter-se é, de certo modo, morrer; porém, precisamente porque sabe disso, há no Filho do Homem algo imortal, dinâmico, criador porque viageiro, eterno porque livre.