VIDE: LEGIO; EGO; EU; SI MESMO; EUS; ALMA; APOSTOLADO
Ananda Coomaraswamy: ODIAR OS SEUS; CIVILIZAÇÃO
Não só estes mundos são uma cidade ou Eu sou uma cidade, como somos cidades populadas, e não terras desertas, porque Ele as preenche, “estando Ele próprio ali como está e estando muitos dos seus filhos aqui” (Satapatha Brahmana X.5.2.16). “Que, dividindo-se infinitas vezes, enche (purayati)1 estes mundos. . . dele provêm continuamente os seres animados” (Maitri Upanishad V.26). Ou, com referência específica às forças da alma que há dentro da cidade individual, “dividindo-se em cinco partes, Ele fica oculto na caverna do coração. . . Depois, havendo irrompido pelas portas das forças sensíveis, Ele passa a fruir o que sentiu. . . E assim o corpo d’Ele fica em poder da consciência, Ele é o guia desse corpo” (ibid., II.6.d; v. coche). No entanto, a divisão é apenas um modo de dizer, pois Ele continua “não dividido em seres divididos” Bhagavad Gita XIII. 16, XVII.20), ininterrupto (ananta-ram) e por isso deve ser considerado uma presença total e indivisa.
Ouspensky: FRAGMENTOS
“O homem não tem individualidade. Não tem um grande “Eu” único. O homem está fragmentado numa multidão de pequenos “eus”.
“Cada um deles, porém, é capaz de chamar-se a si mesmo de Todo, de agir em nome do Todo, de fazer promessas, tomar decisões, estar de acordo ou não estar de acordo com o que outro “eu” ou o Todo teria que fazer. Isso explica por que as pessoas tão frequentemente tomam decisões e tão raramente as mantêm. Um homem decide levantar cedo a partir do dia seguinte. Um “eu” ou grupo de “eus” toma essa decisão. Mas levantar já é assunto de outro “eu”, que não está absolutamente de acordo e pode até nem ter sido posto a par. Naturalmente o homem não dormirá menos na manhã seguinte e, à noite, tornará a decidir a acordar cedo. Isso pode acarretar consequências muito desagradáveis. Um pequeno “eu” acidental pode fazer uma promessa, não a si mesmo, mas a outra pessoa, em determinado momento, simplesmente por vaidade ou para divertir-se. Depois desaparece. Mas o homem, isto é, o conjunto dos outros “eus”, que estão completamente inocentes, terá talvez que pagar toda a vida por essa brincadeira. A tragédia do ser humano é que qualquer pequeno “eu” tem o poder de assinar promissórias e que o homem, ou seja, o Todo, é que deva fazer face a elas. Vidas inteiras passam-se assim a saldar dívidas contraídas por pequenos “eus” acidentais.
“Os ensinamentos orientais estão cheios de alegorias dedicadas a retratar, desse ponto de vista, a natureza humana.
“Em um deles, o homem é comparado a uma casa sem Amo nem mordomo, ocupada por uma multidão de serviçais. Esses esqueceram completamente seus deveres; ninguém quer cumprir sua tarefa; cada qual se esforça por ser o amo, ainda que por um minuto e, nessa espécie de anarquia, a casa fica ameaçada pelos mais graves perigos. A única possibilidade de salvação é um grupo de serviçais mais sensatos se reunir e eleger um mordomo temporário, isto é, um mordomo-suplente. Esse mordomo-suplente pode então pôr os outros serviçais nos seus lugares e obrigar cada um deles a fazer o seu trabalho: a cozinheira na cozinha, o cocheiro na estrebaria, o jardineiro na horta e assim por diante. Desse modo, a “casa” pode estar pronta para a chegada do verdadeiro mordomo que, por sua vez, preparará a chegada do verdadeiro Amo.
“A comparação do homem com uma casa à espera do amo é frequente nos ensinamentos orientais que conservaram traços do antigo conhecimento e, como sabem, essa ideia também aparece em formas variadas em numerosas parábolas dos Evangelhos.
“Mas, ainda que o homem compreendesse, mesmo do modo mais claro, suas possibilidades, isso não poderia fazê-lo progredir um passo no sentido de sua realização. Para estar em condições de realizar essas possibilidades, deve ter um desejo muito ardente de libertação, deve estar pronto a tudo sacrificar, a tudo arriscar para sua libertação.”
Causativa de pr, que é a raiz contida em pur, por isso popula e até civiliza. ↩