A questão filosófica da VERDADE pura não pode, portanto, ser evitada, e o vemos bem quando, no próprio plano empírico, a verdade do estado de coisas causa problema. Quando se trata, por exemplo, da vinda de Cristo ao mundo. Essa vinda realmente ocorreu, ela é verdadeira? São verdadeiros, igualmente, os textos que a anunciam – as Escrituras? “Ser verdadeiro” não significa, por conseguinte, a duplicação supérflua de um estado de coisas prévio e autossuficiente. Muito pelo contrário, o estado de coisas só é verdadeiro se se manifesta ou se se manifestou no passado – mais radicalmente se essa própria manifestação se manifestou a si mesma e enquanto tal. A vinda de Cristo ao mundo está subordinada à vinda do próprio mundo, a seu aparecimento como mundo. Pois, se o mundo não tivesse aberto primeiro seu espaço de luz, se ele não se tivesse mostrado a nós como esse horizonte de visibilidade lançado para além das coisas, como essa tela sobre a qual estas de destacam, Cristo nunca teria podido vir a ele nem se mostrar a nós, ou ao menos àqueles a quem foi dado o privilégio de vê-lo. MHSV: II
Cristo veio realmente ao mundo? Alguns homens tiveram o favor de ser testemunhas de seus atos extraordinários, ouviram suas palavras transtornadoras? Os escritos em que estão consignadas essas palavras e esses atos foram redigidos por testemunhas, ao menos por contemporâneos? Ou se trata de compilações feitas de extratos e fragmentos de proveniência diversa e de uma redação muito mais tardia? Essas questões pelas quais começa toda aproximação ao cristianismo, ao que parece, perdem o caráter liminar para ser apenas secundárias se estiverem subordinadas à questão prévia do aparecimento do mundo e, assim, de uma VERDADE muito mais originária que a do próprio cristianismo – se se trata apenas com este último de saber se Cristo verdadeiramente veio ao mundo, se sua existência histórica é um fato estabelecido ou não. MHSV: II