Da Arqui-inteligibilidade joanina decorre a primeira lei da Vida: nenhuma Vida é possível se não trouxer em si um primeiro Si vivente em que ela se experiencia a si mesma e se faz vida. Nenhuma vida sem um vivente, mas, igualmente, nenhum vivente fora desse movimento pelo qual a Vida vem a si experienciando-se a si mesma no Si desse vivente, nenhum vivente sem a vida.
Essa lei, decifrada na essência da Vida absoluta, diz respeito a toda vida possível e, portanto, à nossa. Também a encontramos em uma das modalidades mais comuns da vida mais comum: o sofrimento. Não tínhamos reconhecido, desde esse primeiro contato, que todo sofrimento se experiencia a si mesmo e ao mesmo tempo traz em si um “eu”, o eu que sofre e sem o qual nenhum sofrimento é possível — se é verdade que nenhum sofrimento pode ser o de ninguém? Assim a vida é tudo menos o universal impessoal e cego do pensamento moderno — trate-se do querer-viver de Schopenhauer ou da pulsão freudiana.
A questão que motivou nossa investigação se ergue diante de nós: a palavra que surge no versículo 14 do célebre Prólogo e na qual se diz a Encarnação decorreria, ela também, da Arqui-inteligibilidade joanina? Longe de ser absurda neste caso, como o foi aos olhos dos gregos, ou ao menos tão estranha como permanece para nós, ela seria signo da Vida, tão familiar para os viventes quanto sua própria vida e remetendo, como toda vida concebível, à palavra do versículo 1, que profere a autorrevelação da Vida absoluta em seu Verbo. Sem ser necessária do mesmo modo nem num mesmo sentido, pertenceria, todavia, à mesma essência da revelação, a essa Arqui-inteligibilidade que não é outra, afinal de contas, senão a da Vida absoluta.
Desse modo, se a carne — e antes de tudo a vinda numa carne: a Encarnação — fosse compreendida pelos primeiros pensadores cristãos como um modo de manifestação do Verbo de Deus, e se nos vem a suspeita de que esse modo de manifestação da carne e o do Verbo poderiam, enquanto modos de manifestação e de revelação da Vida, ser o mesmo, então é de uma elucidação sistemática, de uma ciência dessa revelação enquanto tal que se tem necessidade.