União dos semelhantes [RSME:43-45]

Eckhart fala do termo de um devir: a união, bem como da condição deste: a semelhança. Trata-se, em outras palavras, daquilo que muitos autores expressam de forma proverbial: “Pássaros da mesma pena voam juntos” [Qui se ressemble s’assemble]. »

A aplicação mais frequente deste princípio encontra-se na teoria aristotélica do conhecimento. Numa passagem de seu livro sobre a alma, Aristóteles declara que “o semelhante é conhecido pelo semelhante”1.

Tomás de Aquino, através de quem Eckhart recebeu a herança aristotélica, comenta:

É verdade que o conhecimento se faz no sentido de que a coisa conhecida tem uma semelhança com o sujeito cognoscente; é necessário, de fato, que de uma forma ou de outra o objeto do conhecimento se encontre no sujeito2.

A alteridade, condição inicial do ato de conhecer, graças a uma semelhança entre os dois termos, resolve-se na unidade: a do próprio ato de conhecer. Nesse sentido, “só a semelhança do semelhante estabelece a união”. A maneira de pensar de Mestre Eckhart, treinado no estudo dos comentários escritos por Tomás de Aquino, é muito aristotélica.

O princípio de que o semelhante é transportado para o semelhante — “move-se para o semelhante”3 — já em Aristóteles vai além do simples caso de conhecimento. Em Plotino, onde se encontra4, dá origem a uma primeira metafísica da união, e em Tomás de Aquino, finalmente, à doutrina da visão beatífica5, um verdadeiro tratado sobre a “identidade peregrina” entre o homem e Deus.

Vamos coletar nossos primeiros resultados. Como aristotélico, Eckhart transpõe para o plano da realização progressiva do desapego, do nascimento à união pelo qual Aristóteles caracterizou o ato de conhecer; como neoplatonista, entende a semelhança como assimilação, semelhança conquistada… A união pela qual termina o desapego é mais que noética, é de ordem ascética.

Mestre Eckhart transpõe para a vida presente a união cada vez maior com Deus onde Tomás de Aquino reconheceu o dinamismo da visão. Tal como ele, ele leva a teoria aristotélica do conhecimento a extremos onde, embora mantendo os seus termos, nos desperta para um futuro; como ele, portanto, enriquece-a com as contribuições de uma filosofia do Um. Mas deste confronto entre a tradição aristotélica e a tradição neoplatónica, vê-lo-emos tirar conclusões das quais Tomás de Aquino ainda se tinha afastado.


  1. De l’Ame, I, 2 404 b 17. Segundo uma citação em Proclus (In Tim., II, p. 298 , 8-10), este axioma remonta pelo menos a Empédocles (Diehls, 31 B 109 . 

  2. In I De Anima, 1. IV, n. 43. 

  3. Aristóteles, Traité du Ciel, 310 b 2, trad. Tricot, Paris 1949, p. 165. 

  4. Enéadas VI, 9, 11, 32

  5. Summa Theologique, I II questões 1 a 5.