Manuel Nin — Os Hinos sobre a pérola de São Efrém, o Sírio
Contribuição e tradução de Antonio Carneiro
Publicado por Manuel Nin — in: “Osservatore Romano” em 28 de janeiro de 2011; tradução para o espanhol do original italiano por Salvador Aguilera López, domingo, 06 de fevereiro de 2011.
Os Hinos sobre a pérola de São Efrém, o Sírio
A revelação transparente dos Mistérios
As Igrejas de tradição siríaca e as de tradição bizantina celebram em 28 de janeiro a festa de São Efrém o Sirio, teólogo morto no ano 373 que, a partir da Sagrada Escritura, reflete poeticamente sobre o mistério da redenção. Reflexão teológica desenvolvida com imagens e símbolos tomados da natureza da vida cotidiana e da Bíblia, em hinos para a liturgia de caráter didático. Por meio destes componentes, instrumentos catequéticos extremamente eficaz, Efrém difundia, em ocasião das festas litúrgicas, a doutrina da Igreja.
Nos 87 “Hinos sobre la fé” têm cinco “sobre a pérola”, onde Efrém contempla os diversos aspectos do mistério de Cristo, da Igreja, dos sacramentos e do cristão. A pérola é signo do mistério de Deus que escapa a simples vista: “Um dia, irmãos meus, tomai uma pérola: vede nela os símbolos que se referem ao Reino, as imagens e as figuras da grandeza (divina). Chega a ser uma fonte, da qual beberam os símbolos do Filho. Ponho-la, irmãos meus, sobre a palma de minha mão, para poder examiná-la. Ponho-me a observá-la por um lado: tem um único aspecto por todos os lados. Assim é a busca do Filho, inescrutável, porque ela é toda luz. Em sua limpeza, vejo o Límpido, que não se torna opaco. E, em sua pureza, o grande símbolo do Corpo de Nosso Senhor, que é puro. Em sua indivisibilidade, vejo a Verdade, que é indivisível” .
Os hinos “sobre a pérola” de Efrém são seguramente os textos nos quais se destacam, de modo mais evidente, a habilidade e profundidade poética do Diácono siríaco. Os textos estão compostos para serem recitados ou cantados, com indicação em cada um de um versículo responsorial e do tom musical, seguramente bem conhecidos por seu auditório. Os componentes nascem da meditação da Escritura mas também da observação de cada aspecto da realidade criada. Efrém enfoca assim o nascimento e a formação da pérola com a Natividade de Cristo: a primeira no seio da ostra, sem ser talhada nem modelada; Cristo (engendrado eternamente no seio do Pai e, portanto, não criado) no seio de Maria.
Efrém parangona, portanto, a pérola, transpassada e pendurada como uma joia na orelha e que brilha com sua beleza a Cristo que, transpassado pelos cravos e pendurado na cruz, resplandece com uma beleza única: “Tua natureza se assemelha à do cordeiro silencioso, em sua mansidão! Se alguém a perfurasse, a elevasse e a pendurasse em sua orelha, como Gólgota, todavia mais ainda lançaria todos seus raios sobre aqueles que a contemplassem. Em tua beleza está pintada a beleza do Filho, que reveste o sofrimento. Os cravos o transpassaram; uma ponta te transpassou, porque também a ti te perfuraram, oh pérola, como suas mãos”.
A pérola que sai do mar e vem à terra, é símbolo de Cristo que deixa o seio do Pai e vem habitar entre os homens: “Oh filha das águas, que deixou o mar no qual nasceste, para sair à terra ressecada na qual és amada. Os homens te deram muita importância, te tomaram e se adornaram contigo. Assim é também para o Filho que os povos amaram com muito apreço, do qual se coroaram”.
A contemplação do mistério de Deus supõe para Efrém a adoração e a contemplação, não uma busca final, por si mesma, o que distancie da verdade sobre o mistério de Deus e do homem. O poeta dá, portanto, voz à pérola mesma: “Filha sou do mar imenso, e mais vasto que aquele mar do qual saí. Grande é o tesouro de símbolos, que está em meu seio: Escruta o mar, mas não escruta ao Senhor do mar!”. Com um substrato claramente batismal, Efrém põe em evidência o fato de que, para tomar a pérola, quer dizer, para obter a fé, necessita que o homem se despoje e se faça pobre: “Homens despojados se submergiram, extraindo-te do mar, oh pérola! Não foram os reis os primeiros em dar-te aos homens, mas sim os despojados1: símbolo dos pobres, dos pescadores e dos galileus. Não puderam de fato, com os corpos vestidos, vir até ti. Chegaram porque se haviam desnudados como crianças recém-nascidas; sepultaram seu corpo e desceram até ti: e tu havias ido ao seu encontro com usufruição, e em Ele encontrastes refúgio, tanto te hão amado!”.
Efrém, mais adiante, alude aos predicadores do Evangelho: “Os pobres pescadores abriram-na, tirando-a para fora e mostrando a nova riqueza entre os mercadores. Na palma da mão de homens te põem como uma medicina de vida. Os apóstolos do símbolo viram tua resurreição na margem do mar. E na margem do lago, os apóstolos da verdade viram a ressurreição do Filho de teu Criador”.
Os Hinos “sobre a pérola” refletem claramente a teologia de Efrém, para o qual o caminho rumo ao mistério de Deus não são os sutis exames, mas sim a revelação transparente dos mistérios. “E querendo pedir se tem todavia mais símbolos, a pérola não tem boca, para que possa escutá-la, e inclusive orelhas, para que possa escutá-la, e querendo ainda perguntar-lhe se tem outros símbolos, a pérola não tem boca de maneira que possa escutá-la, nem orelhas de maneira que possa ela escutar-me, oh pérola privada de sentidos, junto a qual adquiro significados totalmente novos”.
NOTAS
em Siríaco: Apóstolo e Despojado é o mesmo ↩