Segundo Relato: Gn 3,1

(Gen 3,1) Quanto à serpente, seria mais nu que todos os animais dos campos que Deus fez. Ele disse dirigindo-se à Mulher: é exato que «Deus» disse «não comereis de todas as árvores do jardim? »

A serpente desembarca no relato como um personagem conhecido que não se sente a necessidade de apresentar. Em conexão com o que acaba de ser dito do Homem e da Mulher, assinala-se simplesmente que ele também está nu, desprovido da pelagem dos animais dos campos que se a compara. Mas não é um deles, nem um réptil (não há no jardim). Justamente ele não existe na Realidade edênica, salvo como alegoria cômoda, e a este título começa-se por se falar no condicional, de maneira hipotética. Se existisse, ele «seria». O verbo «ser» no «completo» (HYH) segue com efeito seu sujeito «HNH (SH)», construção anormal que lembra aquela de Gen 1,2 e de Gen 2,4, Gen 2,5, Gen 2,6, assim como de Gen 2,10 até Gen 2,14, que constituem parêntese na narração. Aqui a «serpente» conhecida em hebreu pelo único fato de sua raiz NH (SH) que significa «adivinhar» se vê qualificar do mesmo adjetivo que acaba de ser dado ao Homem mas comparado aos animais dos campos, o que acentua seu caráter fictício. Se seu nome é posto na cabeça da frase diante do verbo «ser», é para o pôr em relevo e dar ao verbo um sentido não-eventual, em relação com o versículo precedente.

Quando Segond traduz «a serpente era a mais astuta de todos animais dos campos», ele oculta completamente a seus leitores a identidade do adjetivo hebreu nos dois versículos, posto que acaba de traduzir por «nu» o que traduz agora por «astuto». E isso tem uma linha de intervalo! Ora é evidente que se o mesmo adjetivo é empregado, passo a passo, para o Homem do Éden em seguida para a serpente, não é para dizer duas coisas diferentes. Não somente a serpente vai se pôr a falar como o Homem, mas seu estado natural é a nudez como o Homem. Uma nudez superior àquela dos animais ordinários mas qual é este animal superior, senão o Homem transposto ao terceiro estado de sua «concepção» um animal (Gen 2,7), como ao terceiro estado de sua Criação «macho e fêmea» (Gen 1,27)? A serpente é a alegoria deste «terceiro» biológico do Homem, onde parece se situar seu espírito lógico ao mesmo tempo que seu corpo físico, uma parte de seu cérebro e de sua língua. Mas atenção, no momento onde entra em cena ainda não está aterrado! Não rasteja ainda, ainda não está atrofiado pela Queda que vai disparar.

WY’MR ‘L H’(SH) H que traduzo «ele disse se dirigindo à Mulher» remexe com a narração mas não precisa de que maneira a serpente engaja o diálogo. Com efeito, trata-se de um monólogo da Mulher, diante mão de uma verdadeira questão que ela se põe mas com uma questão que só existe ao nível das palavras. Em hebreu com efeito KL quer dizer tanto «todo» como «cada um», e sua negação «nem todo» ou «não todo» assim como «nenhum». A questão atribuída à serpente se ela não nada equívoca para a Mulher que conhece a resposta, pode,portanto, fora de seu contexto, significar seja «É exato que Deus disse “Não comereis de todas as árvores do jardim?”», seja «É exato que Deus disse «Não comereis de nenhuma árvore do jardim?”». Esta segunda versão é evidentemente falsa, mas a primeira é sutil pois ela pode ser entendida de duas maneiras, segundo a expressão «todas as árvores» inclui todas as árvores comestíveis plantadas por Deus no jardim ou visa também as duas «árvores» constitutivas do jardim. Em resumo como o Homem masculino em a nomeando, a Mulher joga com as mas de maneira mais abstrata. Ela faz semblante de confundir as duas espécies de árvores. O drama é que na sua resposta, em pretendendo as distinguir, elas as confunde verdadeiramente.