Renascimento Humanismo

RENASCIMENTO — HUMANISMO

VIDE: Renaissance Thought The Classic Scholastic And Humanistic Strains


O significado historiográfico do termo “humanismo”
Giovanni RealeHistória da filosofia: Do Humanismo a Kant

Existe toda a interminável literatura crítica sobre o período do humanismo e do Renascimento. E, no entanto, não apenas os estudiosos não conseguiram chegar a uma definição das características dessa época, capaz de reunir um consenso unânime, mas também, pouco a pouco, enredaram a tal ponto a meada dos vários problemas que hoje é difícil para o próprio especialista desenredá-la.

A questão revela-se ainda mais complexa pelo fato de que, nesse período, não ocorre apenas uma mudança no pensamento filosófico, mas também, em geral, em toda a vida do homem, em todos os seus aspectos: sociais, políticos, morais, literários, artísticos, científicos e religiosos. E tornou-se bem mais complexa ainda pelo fato de que as pesquisas se tornaram predominantemente analíticas e setoriais, e os estudiosos apresentarem a tendência de fugir das grandes sínteses ou até simplesmente das hipóteses de trabalho de caráter global ou das perspectivas de conjunto.

Assim, é necessário antes de mais nada focalizar alguns conceitos básicos, sem os quais não seria possível sequer a proposição dos vários problemas relativos a esse período.

Comecemos por examinar o próprio conceito de “humanismo”.

O termo “humanismo” é recente. Parece que foi usado pela primeira vez por F. I. Niethammer para indicar a área cultural coberta pelos estudos clássicos e pelo espírito que lhe é próprio, em contraposição com a área cultural coberta pelas disciplinas científicas. Entretanto, o termo “humanista” (e seus equivalentes nas várias línguas) nasceu por volta de meados do século XV, calcado nos termos “legista”, “jurista”, “canonista” e “artista”, para indicar os professores e cultores de gramática, retórica, poesia, história e filosofia moral. Ademais, já no século XIV falava-se de “studia humanitatis” e de “studia humaniora”, expressões referidas a famosas afirmações de Cícero e Gélio, para indicar essas disciplinas.

Para os mencionados autores latinos, “humanitas” significava aproximadamente aquilo que os helênicos indicavam com o termo “paideia”, ou seja, educação e formação do homem. Ora, considerava-se que as letras, ou seja, a poesia, a retórica, a história e a filosofia desempenhavam um papel essencial nessa obra de formação espiritual. Com efeito, são essas disciplinas que estudam o homem naquilo que ele tem de peculiar, prescindindo de qualquer utilidade pragmática. Por isso, mostram-se particularmente capazes não apenas de nos dar a conhecer a natureza específica do próprio homem, mas também de fortalecê-la e potencializá-la: em suma, mostram-se mais capazes do que todas as outras disciplinas a fazer o homem ser aquilo que deve ser, precisamente em virtude de sua natureza espiritual específica.

Sobretudo a partir da segunda metade do século XIV, e depois, sempre de forma crescente, nos dois séculos seguintes (com seu ponto culminante precisamente no século XV), verificou-se uma tendência a atribuir aos estudos relativos às litterae humanae um grande valor, considerando a Antiguidade clássica, latina e grega, como um paradigma e um ponto de referência para as atividades espirituais e a cultura em geral. Pouco a pouco, os autores latinos e gregos se firmavam como modelos insuperáveis nas chamadas “letras humanas”, verdadeiros mestres de humanidade.

Assim, “humanismo” significa essa tendência geral que, embora com precedentes ao longo da época medieval, a partir de Francisco Petrarca, apresentava-se agora de modo marcadamente novo por seu particular colorido, por suas peculiares modalidades e pela intensidade, a ponto de marcar o início de um novo período na história da cultura e do pensamento.

Não nos alongaremos aqui a descrever o grande fervor que nasceu em torno dos clássicos latinos e gregos e de sua redescoberta, bem como ao paciente trabalho de pesquisa de códices nas bibliotecas e de sua interpretação. Nem nos deteremos nos acontecimentos que levaram a uma nova aquisição do conhecimento da língua grega, mais uma vez considerada como patrimônio espiritual essencial do homem culto (as primeiras cátedras de língua e literatura gregas foram instituídas no século XIV, mas a grande difusão do grego ocorreu sobretudo no século XV: em especial, o Concílio de Ferrara e Florença, em 1438/1439, e, logo depois, a queda de Constantinopla, ocorrida em 1453, levaram alguns doutos bizantinos a fixarem moradia na Itália, tendo por consequência um grande incremento no ensino da língua grega). E, por fim, também não nos deteremos na formulação das complexas questões de caráter predominantemente erudito ligadas a esses fervorosos estudos: com efeito, essa tarefa cabe sobretudo à história em geral e à história literária em particular.

No entanto, queremos registrar duas das mais famosas interpretações do “humanismo” dadas recentemente, referindo-se plenamente ao seu significado filosófico, que é aquele que nos interessa primordialmente nesta obra.

  • P.O. Kristeller
  • Eugênio Garin
  • Confronto entre as teses