LOGIA JESUS — O QUE DIZEM DE MIM (Mt XVI, 13-20, Mc VIII, 27-30, Lc IX, 18-22)
EVANGELHO DE JESUS: Mt 16:13-20; Mc 8:27-30; Lc 9:18-22
18 E assim, quando ele ora num local isolado, seus adeptos estão perto dele.
Ele os interroga e diz:
«Quem as multidões dizem que sou?»
19 Eles respondem e dizem: «Iohanân, o Imersor»; e outros «Éliyahou»; outros ainda:
«Um inspirado dentre os antigos se levantou.»
20 Ele lhes diz: «E vós, quem dizeis que sou?» Petros responde e diz: «O messias de Elohîms.»
21 Ele os repreende
e lhes ordena que não digam isso a ninguém.
22 Ele diz: «O filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos,
pelos chefes dos ministrantes, pelos Sopheríms, ser morto e, no terceiro dia, despertar.» [Chouraqui]
Roberto Pla: Evangelho de Tomé – Logion 13
Segundo este logion, Jesus pergunta: “Que dizem os homens que é o Filho do Homem?”. Esta é uma forma de perguntar em sentido “oculto”, pois ao perguntar sobre o impessoal Filho do homem, se refere Jesus diretamente ao Cristo, ao Filho, ao Ser essencial que permanece (para muitos) “oculto” sob as densas capas do homem visível, ao qual o Filho do homem “vivifica”. Para que o Filho do homem, o Cristo, possa ser conhecido é necessário — já se disse — que os homens se tenham voltado previamente para si mesmos, guiados pela luz do conhecimento. Depois, Jesus insiste em sua pergunta: “E vós, que dizeis que sou eu?” A pergunta segue referindo-se a Jesus enquanto Filho do homem e isto demonstra sabê-lo bem Simão Pedro, posto que serve dela para confessar sua profissão de fé: “TU é o Cristo, o Filho de Deus vivo”1.
Segundo o sentido que depreende do que temos chamado a vertente “oculta” de Jesus Cristo, o que diz este logion é que Simão Pedro confessa ter alcançado a fé em Jesus, no Cristo que, enquanto Filho de Deus “no” homem, vive em cada homem em função da semente eterna semeada em nós como Palavra (PARÁBOLA DO SEMEADOR).
A fé nesta semente, em Cristo, é impulsora de uma transfiguração radical, até o ponto de “fazer filhos de Deus aos que creem”. Daí a declaração de Jesus para que se cumpra a Boa Nova: “Esta é a vontade de meu Pai: que todo o que veja ao Filho2 e nele creia tenha vida eterna (Jo 6,40). Para todos os que se despertem a este “crer nele”, a contemplação do Filho os alcança, ao longo de toda a história da geração humana, entendida no sentido da vertente “oculta” reivindicada por Jesus quando se designou como Senhor, além do mais Filho de Davi, segundo a semente espiritual.
Pelos termos da réplica de Jesus à profissão de fé de Simão Pedro, resulta evidente que esta se a imputa em seu verdadeiro sentido “oculto” de revelação interior do Filho do Homem, pois tal revelação não é devida jamais a uma percepção de ordem sensível — da carne e sangue — senão à chuva em espírito de fogo do conhecimento enviado em línguas pela vontade do Pai (Paracleto). É esta chuva a única qualificada para trazer o despertar da intuição do Ser; sua consequência é o nascimento do alto, do qual diz o evangelho joanico: “Ninguém subiu ao céu senão o que baixou do céu, o Filho do homem” (Jo 3,13).
VIDE SINAL DE JONAS
Depois da morte de João Batista, de quem foi profetizado que “precederia (ao Senhor) com o espírito e o poder de Elias, começam a recolher os sinóticos três estranhas hipóteses que referentes a Jesus “circulavam”, segundo eles, “entre muitos”. Lucas é o que melhor concreta estas hipóteses: Jesus, de quem se diziam tais coisas, era, segundo uns, “João que havia ressuscitado dentre os mortos”; segundo outros, “Elias que havia aparecido”; e segundo outros, finalmente, “um dos antigos profetas, que havia ressuscitado” (este antigo profeta resultou ser, segundo logo se comprova, Moisés).
Estas falas, vão repetir os discípulos ante seu mestre, no transcurso da passagem conhecida como “a profissão de fé de Pedro”. A máxima importância desta profissão de fé domina de tal modo a atenção que deixa em névoas a importância da pergunta primeira de Jesus, e também o sentido da resposta dada pelos discípulos com exceção de Pedro.
Jesus pergunta: “Quem dizem os homens que é o Filho do homem?” (na formulação de Mateus, mais expressiva que em Marcos e Lucas: “Que diz a gente que eu sou?”). Não há dúvida que a pergunta de Jesus interroga sobre o Ser último (o Ser enquanto Ser) e não sobre as determinações do Ser. Por isso ninguém responde: “Tu és Jesus o filho de José”, tal como se disse dele em Nazaré quando predicou na sinagoga.
Se chegar a penetrar no Ser essencial, no Ser em si, quer dizer, no Filho do homem, no Cristo (ungido) de Deus, tal como se diz na resposta de Pedro, os discípulos enfocam explicar uma determinação do Ser e o fazem em três direções que segundo eles, vêm da opinião da “gente”, quer dizer, daqueles que não são capazes de aprofundar no Eu Sou puro e absoluto de Jesus. As três opiniões que expõem e que, por certo, “não são rechaçadas” por Jesus, são as que assinalamos segundo Lucas. Tu és: João Batista que ressuscitou; Elias, que há de vir; um antigo profeta que ressuscitou (Mateus aponta Jeremias, mas Marcos e Lucas não nomeiam nenhum).
Há motivos para se perguntar se esta classe de opiniões expressavam uma crença popular não muito concreta mas generalizada na “metensomatose”, quer dizer, nas diversas e sucessivas mutações no soma, em tempos de Jesus. O certo é que os discípulos dão como hipótese, na qual não creem mas não de todo absurda, que João Batista recentemente falecido, tivesse “encarnado” em Jesus que tinham diante de seu olhos. Por sua parte, o mestre não se surpreende pelas notícias que o transmitem os discípulos e sobre as quais, por certo, informam logo os sinópticos sem considerar necessário incorporar algum comentário.
Jacob Boehme: Excertos da “ENCARNAÇÃO DE JESUS CRISTO”
1. Cristo tendo demandado a seus discípulos: “Que dizem as pessoas que o filho do homem é?” Eles lhes responderam: “Uns dizem que tu é Elias, outros que tu és João Batista ou um dos profetas”. Então lhes perguntou: “E vós, que dizeis que eu sou?” Pedro lhe respondeu: “Tu és Cristo, o filho do Deus vivo”. E Ele lhe respondeu: “Em verdade, a carne e o sangue não te manifestaram isso, mas certamente meu Pai que está no céu; e Ele lhes anunciou, ali mesmo, seus sofrimentos, sua morte e sua ressurreição” (Mat. XVI, 21), Para lhes fazer ver que a razão própria, sagacidade e sabedoria mundanas, não poderia nem reconhecer nem compreender a pessoa que era Deus e homem; mas que frequentemente ele só seria bem conhecido daqueles que se entregassem inteiramente a Ele, e que, pelo amor Dele, suportariam a cruz, a aflição e a perseguição, e se ligariam a Ele com ardor. O que de fato sucedeu, pois quando ainda estava visível entre nós, no mundo, ele foi raramente reconhecido da sagaz razão, e embora tenha feito milagres, a razão exterior foi tão cega e pouco inteligente, que tais grandiosas maravilhas foram atribuídas pelos mais sábios da sutil razão ao demônio. E como no tempo de sua estada neste mundo, permaneceu incógnito da razão e da inteligência próprias, assim como permaneceu incógnito e mal conhecido da razão exterior.
2. Tantas contentas e disputas surgiram sobre a sua pessoa, na medida em que a razão exterior sempre acredita ter compreendido o que é Deus e o homem, e como podem ser uma só pessoa. Essa disputa preencheu a terra, pois a razão pessoal sempre pretendeu ter apoderado-se da pérola, sem refletir que o reino de Deus não pertence a este mundo e que a carne e o sangue não podem conhecer ou compreendê-lo, muito menos penetrá-lo.