Misticismo Renano-Flamengo — As mulheres visionárias (c. 650 — c.1300) Excertos de Pierre Riffard, "O Esoterismo", traduzido por Yara Azeredo Marino e Elisabete Abreu
Como se exprimir, na Idade Média, quando se é mulher (portanto oprimida) e esoterista (portanto herética, bruxa ou insurreta)? Pelas visões. A ausência de dogmas burla a vigilância da Inquisição e a presença de imagens confere um tom mais sensível.
A visionária esotérica mais conhecida é Hildegard de Bingen. Ela pertencia à Ordem das Beneditinas. Fundou dois mosteiros e era consultada por papas e imperadores. Seu grande livro, Sei vias data de 1141 -1151 e contém soberbas ilustrações. Hildegard não é uma mística. "Tudo o que escrevi (...) devo aos mistérios do céu. Percebo em plena consciência, em perfeito estado de meu corpo. Minha visão são os olhos interiores de meu espírito e os ouvidos interiores que a têm transmitido (...), não me encontro absolutamente num estado letárgico. Não se trata nem mesmo de um êxtase do espírito (...). Exponho exclusivamente o que me oferecem os segredos do céu." A primeira visionária foi Aldegonde (morta em 684). Menos célebres são Maria d'Oignies (morta em 1213), Cristina a Admirável (morta em 1225), Ida de Nivelles (morta em 1231), Lutgarda de Tongres (morta em 1248), Beatriz de Nazaré (morta em 1268), Juliana de Mont-Cornillon (morta em 1258), Mechthild de Magdeburg (morta em 1285), Hadewijch d'Anvers (morta no século XIII). Lutgarda, Matilde e Hadewijch foram, em algum momento de suas vidas, beguinas. Matilde tornou-se em seguida cisterciense. Ela escreveu um livro denominado “Luz da Divindade” (trad. 1878; Luz da divindade). Hadewijch, espírito elevado, língua inspirada, que deixou as Visões em médio-neerlandês (trad. 1908-1914), celebra o nascimento do espírito, tema iniciático:
{QUOTE()}Ah! como é doce cantar a nova graça! Ainda que ela oriente cada vez em um novo sentido e que adquira sem cessar novos sofrimentos, ela é também um novo alento.{QUOTE}
Essa tradição de mulheres iniciadas visionárias prosseguirá com Ana Catarina Emmerich, da Ordem de Santo Agostinho, em 1802, que ditou suas visões ao poeta Clemens Brentano. Ela descreve, como se estivesse presente, as cenas sagradas. Assim, ela vê a Anunciação: "O céu parecia aberto. Meus olhos seguiram acima do Anjo um caminho luminoso. Vi, na extremidade daquele feixe de luz, uma imagem da Santíssima Trindade. Era como um triângulo luminoso cujos raios se penetrassem reciprocamente. Três correntes luminosas se dirigiram para o lado direito da Santa Virgem". (Vie de la Vierge(Vida da Virgem), Ed. Tequi, p. 55).
Excertos: