ciência

Antes se deve pensar, diante desse campo [científico], que ele se mostra e que esta “mostração” não é precisamente em si mesma nenhum desses objetos materiais nem nenhuma de suas determinações ideais. Ela é o aparecer do mundo oposto ao que aparece nele, este aparecer puro que a ciência galileana jamais leva em conta, quando é a condição incontornável de tudo o que ela leva em conta. No campo galileano, todavia, aparece ainda outra coisa de que ele tampouco se ocupa: a qualidade sensível das coisas, de que Galileu fez abstração, mas sem as quais ele jamais teria tido a menor ideia dessas coisas, nenhum acesso a elas. Que elas sejam colocadas fora do campo que vai ser o da ciência, isso não impede que este se encontre constituído, positiva e negativamente, a partir delas. E enfim: uma vez colocadas essas quantidades sensíveis fora deste campo científico, em que se convertem elas? Qual é seu princípio se elas são estranhas à sua materialidade, à sua extensão, às suas formas, à sua determinação ideal? É, em todo caso, outra esfera de realidade o que elas definem ou a que se referem. Bem mais, é outro modo de aparecer, diferente do modo das coisas, diferente da verdade do mundo, o que elas pressupõem, se essas qualidades sensíveis exibidas na superfície das coisas e que pareciam pertencer-lhes puderam ser dissociadas delas – se se referem necessariamente a uma sensibilidade, a sensações e a impressões puras e, ao fim e ao cabo, à maneira de aparecer e de se dar destas: na experiência de si da Vida fenomenológica absoluta e na sua autodoação patética, e somente nela. Somos assim remetidos às intuições decisivas do cristianismo. É do confronto destas intuições com o postulado galileano que acabamos de lembrar, e que determina o pensamento e o mundo modernos, que decorrem tanto a compreensão da relação [363] do cristianismo com esse mundo quanto sua apreciação respectiva do que constitui o ser verdadeiro do homem. (Michel Henry MHSV)