Ora, vós tendes a unção da parte do Santo, e todos tendes conhecimento. (1Jo 2:20)

E quanto a vós, a unção que dele recebestes fica em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine; mas, como a sua unção vos ensina a respeito de todas as coisas, e é verdadeira, e não é mentira, como vos ensinou ela, assim nele permanecei. (1Jo 2:27)


Excertos de “Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento”, de Coenen & Brown

No pensamento antigo vários tipos de óleo de unção (elaion) podem penetrar profundamente no corpo e dar-lhe forças, saúde, beleza e até alegria. Assim desde um período bem antigo a ideia de ungir já alcançara um sentido simbólico e religioso. Ungir no sentido literal, não figurativo, é expresso no NT por aleipho, enquanto chriô e chrisma se empregam exclusivamente no sentido religioso e simbólico.

Segundo João o chrisma é o Espírito da Verdade que dá aos cristãos (ungidos pelo Ungido) o poder de compreensão, que os dispensa de qualquer mestre que não seja o próprio Cristo em cada um.


Roberto Pla

Dizer “ungido”, é dizer o Cristo “oculto”, interior, que como “pedra”, como rocha – rocha antiga que já era antes da Criação, é o fundamento de tudo. Por isso esteve com Jacó, o qual conseguiu que sua alma “repousasse” nela; esteve em Isaías, pois este recebeu a unção ou presença que o permitiu abrir logo as portas à contemplação de sua Glória; esteve com Jesus para lhe revelar a hora fixada para proclamar o Evangelho; e chega a nós para que mediante a fé sejamos ungidos para a “presença” de Deus.

Em todos os casos, o Cristo de Deus é sempre o mesmo posto que é eterno, sem tempo. Cristo é a pedra ungida, Bet-El, a porta do céu; mas a unção é nova em cada alma: quando chega o Espírito do Senhor, em forma de pomba, embora invisível, como um odor, é unção que descobre a “presença” do Cristo “oculto” e opera como trânsito para a “vinda” (vide VINDA DO FILHO DO HOMEM).


O salmista o explica: “Como um unguento fino na cabeça”, e o aedo de Salomão o vê poeticamente como uma canção para o ungido: “A pomba voou sobre a cabeça de nosso Senhor Messias, porque Ele era para ela a cabeça. Ela cantou sobre Ele e se ouviu sua voz”.

O Espírito que “vem” cobre primeiro com sua sombra, com sua presença, para que o unguento de Vida empape a alma e deixe acabado, ultrapassado, dia a dia, os condicionamentos separativos que ainda ficam aderidos a ela.

Só quando a alma se faz espírito, essência de si mesma — o qual foi cantado pela tradição como a boda mística —, é possível que a unção do espírito com o Espírito se consume. Enquanto isso chega, aí está a presença, como uma sombra preexistente, como a “nuvem”, que não é trevas senão luz atenuada que aponta o caminho do dia.

Convém saber que a sombra, ainda que fixa e fiel, “só conhece quando é conhecida”. Ainda que more em cada um, como semente que foi plantada o primeiro dia, exige, para manifestar sua presença, ser “conhecida” previamente, cada dia, cada hora, de instante em instante. Isto quer dizer que há que estar vigilante, atento sempre, para recordar que está aí, para contemplá-la e receber dela a alegria inefável de comprovar “que o Ser é”, eternamente, desde antes que o mundo fosse.

E isto há de ser assim até que a “nuvem”, vazia, se desvaneça, se resolva em Espírito. Então será possível dizer, como no velho texto testamentário que evocou Jesus: “O Espírito do Senhor sobre mim porque me ungiu”.