O caminho supereminente
Em outra epístola, ele fala aos seus discípulos sobre as mesmas realidades, revelando-lhes o tesouro do Espírito e exortando-os a d’Ele participar: “Aspirai aos dons do Espírito. E eu vos mostrarei um caminho ainda mais excelente: ainda que eu falasse as línguas dos anjos e dos homens, se não tivesse a caridade seria como o bronze que soa e como o címbalo que tine. E ainda que tivesse o dom da profecia e conhecesse todos os mistérios e toda ciência, e ainda que tivesse toda fé a ponto de transportar as montanhas, se não tivesse a caridade, eu nada seria. E ainda que distribuísse todos os meus bens e entregasse meu corpo para ser queimado, se não tivesse a caridade, isso de nada adiantaria” ( 1 Cor 12,31; 13,1 ).
Qual é, pois, a utilidade da caridade e quais são os seus frutos?
De que males ela protege os que a possuem e quais os benefícios que lhes traz? O Apóstolo o mostra com sabedoria, em suas palavras: “A caridade não é invejosa, não se ostenta, não se incha de orgulho, nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade; ela tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. A caridade jamais acabará” ( 1 Cor 13,4-8 ).
Isso é perfeita sabedoria e exatidão. “A caridade jamais passará” — o que significa isso? Se alguém obtém os carismas que o Espírito lhe concede, isto é, as línguas dos anjos, a profecia, a ciência, o dom das curas, mas ainda não se encontra inteiramente libertado, pela caridade do Espírito, das paixões que interiormente o perturbam e ainda não recebeu em sua alma o remédio perfeito da salvação, ele permanece no temor de uma queda, pois não possui ainda a caridade que fundamenta e confirma na estabilidade da virtude. Não te contentes, pois, com os dons. E não creias que, por causa da graça rica e generosa do Espírito, nada mais te falta para a perfeição. Assim, quando forem abundantes os dons, torna-te pobre de espírito. Humilhado sob o temor de Deus, e apoiando-te unicamente na caridade como fundamento do tesouro da graça, continua a combater toda paixão até que chegues ao cume do objetivo, que é a piedade. Aí o Apóstolo te precedeu e para ele conduz os seus discípulos, por sua oração e doutrina, mostrando aos que amam o Senhor a graça e a “mudança para melhor” produzida pela caridade. “Porque”, diz ele, “pouco importa a circuncisão ou a incircuncisão; o que importa é ser uma “nova criatura”; “a todos os que seguem esta regra, paz e misericórdia, assim como ao Israel de Deus” ( Gl 6,15-16 ).