Evangelho de Tomé – Logion 33

Pla

Jesus disse: o que escutais em vosso ouvido e no outro ouvido, proclamai-o sobre vossos tetos. Ninguém, com efeito, acende uma lâmpada para pô-la sob a cama, nem a põe em um lugar escondido; mas ao contrário a põe sobre o lampadário, para que quem entre e saia veja sua luz.

Puech

Suarez

Meyer


Roberto Pla

“Em teu ouvido e no outro ouvido” é uma maneira de explicar que há distintos graus de ouvir e entender o que se ouve, e que para chegar a compreender o sentido “oculto” de um logion de Jesus há que ouvir não somente com o “ouvido” físico, mas também com o ouvido próprio do entendimento, mais sutil e interior que o primeiro. É seguro, com efeito, que estes “ditos” há que ouvi-los ao menos sete vezes ou, melhor ainda, “setenta e sete vezes”, se é que se quer perceber o sentido superior do que querem dizer. Há que se chegar ao nível extremo de percepção sutil, coisa nada fácil, ao nível justo do mais elevado de nós mesmos, ao qual o logion chama “vossos tetos”; na passagem sinótica do evangelho canônico, se lê “os telhados”.

Esta mesma multiplicidade de níveis de entendimento se dá com o exemplo da luz da lâmpada que segundo diz, deve ser exposta. A lâmpada é, desde certo ponto de vista, no subjetivo, o “homem velho”, isto é, os recobrimentos do Ser, com os quais acostumamos, erroneamente, a viver identificados, e a luz é “o espírito que dá vida”, o “nós mesmos”, desnudo, puro, esse grande desconhecido para nossa consciência psíquica. Daí porque quando Jesus diz “vós sois a luz do mundo”, o primeiro passo de compreensão é entender só o sentido metafórico, segundo o qual, o “dito” quer dizer que estamos dotados para transmitir aos demais, com nosso exemplo se é bom, umas parcelas de comportamento moral e de conhecimento. Mas há outro sentido real, “oculto” para muitos e que só pode ser descoberto pouco a pouco, em estratos sucessivos de aprofundamento, no último dos quais a luz se revela como a essência de cada homem, a Palavra, “a luz verdadeira que ilumina a todo homem que vem a este mundo” (Jo 1,9).

A este entendimento sutil, ao qual só se chega graças a uma assídua reflexão, é ao que o logion chama “ouvir com um ouvido” primeiro e logo “com o outro”; o que se ouve ao final tem que ser tão elevado que possa proclamar-se de cima de nossos “telhados”, além dos limites de entendimento. O resultado de tal trabalho é, em verdade, o produto de uma espécie de transcrição incessante “até o espírito”. A qualidade espiritual explicado nos textos evangélicos exige não cessar nesta mutação até o espírito, se é que queremos entendê-los verdadeiramente.

Jesus aponta a necessidade de cumprir esta ação mutante quando explica: “O que os digo na obscuridade, dizei-o vós à luz” (Mt 10,37). Em verdade, a obscuridade de Jesus nunca são trevas senão penumbra, porque consiste em algo cheio de orifícios pela qual sempre penetra a luz. Graças a isso, quem ama o conhecimento até o ponto de pôr na escuta todos os seus “ouvidos”, externos ou internos, fica capacitado para trasladar o “signo” metafórico que inicialmente percebe, até o “telhado” de si mesmo, desde de onde é factível proclamar a todos os que “entram e saem”, qual companheiros de viagem neste árduo caminho, a realidade superior do espírito, até que vejam sua luz.

Suarez