Pla
Seus discípulos lhe disseram: O Reino, que dia virá? Jesus disse: Não virá com uma espera. Não se dirá: Já está aqui, ou já está ali, mas o Reino do Pai está espalhado sobre a terra e os homens não o veem.
Puech
113. Ses disciples lui dirent : Le Royaume, quel jour viendra-t-il? < Jésus dit > : Il ne viendra pas avec une attente. On ne dira pas : Voici qu’il est ici, ou : Voici qu’il est là; mais le Royaume du Père est répandu sur la terre et les hommes ne le voient pas.
Suarez
1 Ses disciples lui dirent : 2 le Royaume, quel jour viendra-t-il ? 3 Il ne provient pas d’une attente. 4 On ne dira pas : 5 voici il est ici ! 6 ou voilà il est là ! 7 Mais le royaume du Père s’étend sur la terre 8 et les hommes ne le voient pas.
Meyer
113 (1) His disciples said to him, “When will the kingdom come?” (2) “It will not come by watching for it. (3) It will not be said, [Or “They will not say.”] ‘Look, here it is,’ or ‘Look, there it is.’ (4) Rather, the Father’s kingdom is spread out upon the earth, and people do not see it.” [Cf. Mark 13:21–23; Matthew 24:23–25, 26–27 (Q); Luke 17:20–22, 23–24 (Q); [Gospel of Thomas 3:1–3->breve6404]; Gospel of Mary 8.]
Canônicos
Sendo Jesus interrogado pelos fariseus sobre quando viria o reino de Deus, respondeu-lhes: O reino de Deus não vem com aparência exterior; nem dirão: Ei-lo aqui! ou: Ei-lo ali! pois o reino de Deus está dentro de vós. (Lc 17,20-21)
E estando ele sentado no Monte das Oliveiras, chegaram-se a ele os seus discípulos em particular, dizendo: Declara-nos quando serão essas coisas, e que sinal haverá da tua vinda e do fim do mundo. Respondeu-lhes Jesus: Acautelai-vos, que ninguém vos engane. (Mt 24,3-4)
Se, pois, alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! ou: Ei-lo aí! não acrediteis; (Mt 24,23)
Dize-nos, quando sucederão essas coisas, e que sinal haverá quando todas elas estiverem para se cumprir? (Mc 13,4 e seq)
Respondeu-lhes João: Eu batizo em água; no meio de vós está um a quem vós não conheceis. (Jo 1,26)
Roberto Pla
A expectativa da Vinda a explica o logion em sua justa vertente oculta, profunda. O Reino é infinito e eterno, e não pode vir, senão por des-encobrimento, porque já é/está; não pode chegar, porque não há lugar não ocupado por ele desde antes do começo dos tempos. Dizer do Reino, do Filho do homem, o qual é o Reino, que vem ou que não chegou é uma figura de linguagem, como dizer que o Sol se levanta ou se põe.
O espírito do homem “é” do Reino de Deus, e o que denominamos a Vinda do Reino a nós, a Vinda que a cristandade espera, é em verdade a abertura da consciência à luz do Filho do homem, essa Luz que é conhecimento e vida, e que em essência somos sempre ainda que sem sabê-lo. No terceiro evangelho se explica isto muito bem: “O Reino de Deus vem sem se deixar sentir. E não dirão: veja-o aqui ou lá, porque o Reino de Deus está entre nós” (Lc 17, 20-21).
A salvação do homem, significada pela Vinda, pela manifestação do Reino de Deus na alma, é um acontecimento decisivo na vida de cada homem, mas é um ato íntimo, pessoal, não intercambiável, que tem que ver com o silêncio absoluto da alma e com a redenção do espírito; sem relação com as catástrofes cósmicas ou com o fim do mundo, menos ainda com a destruição do templo, ainda que este seja o de Jerusalém.
No entanto, os relatos dos sinópticos e com eles de toda a tradição eclesial, entenderam, segundo o parecer “manifesto”, que existe uma dependência mútua entre coisas tão díspares e heterogêneas como são o des-encobrimento de Deus na alma e a dissolução do mundo por efeito de um fogo celeste.
Se pode dizer que o discurso escatológico relatado no capítulo 13 de Marcos, e com poucas variantes, no capítulo 24 de Mateus, parece querer conjugar, por razões não compreensíveis, as místicas bodas da alma com a caída dos astros e as estrelas, e com uma espécie de loucura coletiva dos seres humanos, convertidos de improviso muitos deles em loucos assassinos e trânsfugas.
É certo que para achar o Ser de Deus é necessário que todo homem se ofereça em holocausto e consinta no sacrifício de seu próprio ser, do si mesmo psíquico; mas tal como se conta do ancião Abraão, quando não se negam a mão nem a faca para amolação aí está, bem próxima, a bem-aventurança. O sacrifício do homem não sempre é a morte; o que necessita em todos os casos é a transformação e esta, já se sabe, vem pela negação da alma com a cruz sobre os ombros.
É a transformação do homem o que traz a liberdade ao espírito cativo, essa liberdade para todos que foi o fim perseguido por Jesus ao proclamar a Boa Nova. A explicação do que há de fazer e não fazer para culminar nessa transformação que é liberdade e consumação, forma o corpo doutrinal do Evangelho, o qual é sempre um ensinamento; mas o capítulo da Vinda, o relato da descida do Espírito na consciência do homem, não pretende ser uma parênese senão até tudo uma descrição geral dos acontecimentos próprios de uma teofania.
Os evangelistas Marcos e Mateus não foram, seguramente, uma exceção em experimentar a condição inapreensível do acontecimento que tentavam descrever, e no capítulo da Vinda do Filho do Homem seguiram a norma de seus antecessores Moisés, Elias, Ezequiel, Daniel e carregaram as tintas hermenêuticas do lado da vertente oculta.
Por tudo isso não deve surpreender que os exegetas modernos da vertente manifesta encontrem normalmente diáfanos e claros os textos que estudam. No entanto, quando eles tropeçam em um texto e os parece notoriamente obscuro, tal como ocorre com o capítulo 13 de Marcos e o 24 de Mateus, é porque sua exegese só é possível desde a vertente oculta, a ciência hermenêutica que eles não praticam.
Essa ciência é por sua vez o fundamento deste nosso escrito. Como a descrição da Vinda do Filho do Homem é de uma importância singular porque é uma tentativa de descrever, embora por via oculta, a Paixão e a ressurreição de todo homem que aspira a lograr seu fim, seu telos, no mundo, haverá de submeter este relato a um trabalho exegético algo minucioso.
Para este trabalho tomaremos como base o capítulo 13 de Marcos, construído por seu autor como um todo, sem prejuízo de consignar quando faça falta, as variantes dadas por Mateus 24 e pelo curto fragmento de Lucas 21, sempre que ditas variantes aportam algum signo novo de interesse.
Suarez
Eis outro logion que ecoa a linguagem dos surdos. Ele não pode ser repetido todas as vezes, mas esse texto deve ser comparado com o Logion 3.
Para os discípulos, o Reino virá em um grande desencadeamento cósmico, e os sinais que o anunciam aparecerão no céu.
Para Jesus, a aventura do Reino é interior; todas as parábolas, se você souber lê-las, quando não tiverem sido distorcidas, dão testemunho irrefutável disso. Percebemos que o Reino está na terra quando o possuímos dentro de nós mesmos. A mesma verdade primária — tão difícil de entender — é anunciada em Logion 3. Jesus tem o cuidado de dizer repetidamente que o Reino não está em nenhum lugar específico, mas que se estende por toda a Terra e que os homens não o veem.
O texto correspondente em Lc reproduz as palavras de Jesus de forma bastante fiel. No entanto, está inserido em um contexto tão apocalíptico que é de se perguntar como chegou até nós nesse estado de conservação.
Gillabert
- O Reino não é redutível ao espaço-tempo, ele aí está mesmo não visto.
- Cruel cegueira esperar um Reino, um Reino coletivo, um Reino a vir, e que aí está…
O que Jesus chama de Reino, o que alguns mestres chamam de natureza própria, ou o estado sem pensamento, ou a visão do coração ou a visão no vazio, etc., o velho Cheng chama de mente original. Depois de dizer que a mente original não é nada e não depende de forma alguma do que varia e morre, o velho mestre acrescenta: a mente original sempre esteve presente diante de seus olhos. Não se tem nada a adquirir para vê-la, pois nunca faltou nada para isso. Se não for capaz de fazê-lo, é por causa de sua incessante tagarelice consigo mesmo e com os outros. Como tudo se encaixa maravilhosamente e está de acordo com o Evangelho: O Reino do Pai se estende sobre a Terra e os homens não o veem (Logion 113).
A aventura gnóstica está inserida em um contexto espaço-temporal apenas para trazer uma salutar compreensão de sua natureza alienante. Jesus é o Mestre indiscutível dessa percepção. Ele questionou uma forma de salvação que ainda estava por vir, afirmando que o Reino já estava aqui, mas que as pessoas não podiam vê-lo (Logion 3; Logion 31; Logion 113). Os milagres de Cristo são praticamente ignorados; não há menção às ressurreições de Cristo, e sua própria ressurreição é entendida no sentido de despertar. [Jésus et la Gnose]
Desde então, a salvação no futuro, seja pessoal ou coletiva, perde todo o sentido; a expectativa dos últimos fins ligada ao retorno do Messias se torna um sonho megalomaníaco sustentado por fantasias proféticas. Além disso, toda vez que os discípulos falam dessa esperança, Jesus os repreende por buscarem no futuro o que já está aqui (Logion 4, Logion 18, Logion 37, Logion 51, Logion 52, Logion 113, etc.). [Le procès de Jésus]
Puech
- Em Lucas o Reino em (dentro dos) os homens (entos humon)
- Vide Logion 3
- O sentido de “interioridade” do Reino é enfatizado pelos gnósticos
- No Evangelho de Maria, onde o Salvador diz a seus discípulos: “Cuidado para que não vos induzam em erro com as palavras: “Vejam aqui” ou “Vejam aí”. Pois o Filho do homem está no interior de vós”.
- Este Logion 113 dá, diferentemente dos canônicos uma ênfase na ubiquidade do Reino: O Reino esta espalhado…
- O Reino está aí, em toda parte, e ao mesmo tempo, sempre aí, universalmente e constantemente presente ao nosso redor, no meio de nós, em nós, “no mundo e nos homens”, como afirmado no “mesos humon” de João (1,26, citado acima), como confirma Heracleon, citado por Orígenes (Comentários sobre João).
- Vide Logion 51
…a expressão: “o Reino do Pai” (Logion 57, Logion 76, Logion 96, Logion 97, Logion 98, Logion 113), usada por Jesus em conjunto com “Reino” e mais frequentemente do que “Reino dos céus”, e cujo equivalente está em outro lugar, em particular nos versículos sinóticos paralelos, “o Reino de Deus”.