Nicola Abbagnano: Excertos de História da Filosofia
Daqui deriva o outro aspeto fundamental da investigação escolástica. Esta não se propõe formular ex novo nem doutrinas nem conceitos. O seu principal objetivo é o de compreender a verdade já dada na revelação, e não o de encontrar a verdade. Deste modo, como a norma da investigação resulta da tradição religiosa, os instrumentos e os materiais dessa investigação são provenientes da tradição filosófica. Esta vive substancialmente à custa da filosofia grega; primeiro a doutrina platônico-agostiniana, depois a aristotélica, fornecem-lhe os instrumentos e os materiais de especulação. A filosofia, como tal, é para ela simplesmente um meio: ancilla theologiae. Claro que as doutrinas e os conceitos que são adotadas de acordo com aquele objetivo acabam por sofrer uma transformação mais ou menos radical quanto ao seu significado original. Mas a escolástica não se propõe realizar esta transformação de modo intencional e a maior parte das vezes não tem disso consciência. O sentido da historicidade é-lhe estranho. Doutrinas e conceitos surgem livres dos complexos históricos de que fazem parte e considerados independentes dos problemas a que se referem e da (personalidade autêntica do filósofo que os elaborou. A Idade Média coloca tudo num mesmo plano e fez dos filósofos mais afastados da sua mentalidade, seus contemporâneos, dos quais é lícito colher os frutos mais caraterísticos para adaptá-los às suas próprias exigências.