A RADIAÇÃO ESCURA

Von Balthasar — Liturgia Cósmica — Máximo o confessor

II DEUS

I A Radiação Escura

a. A Dialética da Transcendência

  • ”Um raio de escuridão” (skotous aktis): esta imagem resume a concepção de Deus do Pseudo-Dionísio e também a de Máximo o confessor. É uma concepção que conclui uma tradição ilimitada de pensadores helenísticos, judeus e cristãos, todos celebrando a transcendência de Deus. O topo de todo ser, na visão de Platão e Aristóteles, estava entronado em luz radiante mas inacessível. Um “névoa oriental” começou a se juntar ao redor deste pico olimpiano e fazendo parecer mais e mais íngreme e distante, até desaparecer em completa incompreensibilidade. O Deus do apocalipse judaico, o Deus de Philon, exaltado acima dos “poderes”divinos, acima dos princípios de inteligibilidade (logoi) e dos anjos, acima da dominação e providência e bondade ela mesma; o abismo irreconhecível dos gnósticos; o “Pai superessencial” de Orígenes; o Bem-além-de-todo-ser de Plotino; o Deus de Gregório de Nissa eternamente além do alcance do amor e além da apreensão da visão; tudo isto representa uma caminhada, passos em direção à “teologia mística” do Areopagita, que chancelou a ideia de um ser transcendente como o nível final e mais adequado de expressão.

  • Mas a ideia de transcendência só veio a ser efetivamente apreendida devido ao reconhecimento da noção paralela da completa imanência de Deus, condicionando e pavimentando o caminho para sua transcendência. Os estoicos, e antes deles Heráclito e Parmênides estabeleceram as bases para esta teologia da imanência. Embora estes pré-socráticos, opostos em vários sentidos, se conciliassem de alguma maneira no tocante à transcendência e à imanência — para Heráclito o mundo engolia Deus, para Parmênides Deus dissolvia o mundo nele mesmo. Quanto aos estoicos o Logos que habita no mundo não poderia manter-se como um absoluto, transcendente, princípio divino, Philon e mesmo os Apólogos Cristão desenvolveram o sentido de dialética entre transcendência e imanência.