Eckhart Pecado Culpa

MESTRE ECKHART — TERMOS E NOÇÕES

Excertos de Giuseppe Faggin — Meister Eckhart e a mística medieval alemã

PECADO E CULPA
Portanto,a culpa cumpre para Eckhart uma função dialética na vida moral: é o necessário momento negativo pelo qual a alma se sente miserável e infeliz e chega a adquirir cabalmente o sentido de sua íntima condição de criatura. Mas nas próprias raízes do mal germina a salvação: a consciência da própria miséria e da própria desolação aproxima de repente a alma de Deus: “Quanto mais miserável se sente, e quanto mais numerosos são seus pecados, tanto mais tem razão de aferrar-se com entrega absoluta a Deus que não tem defeito nem pecado.” O drama da alma, então, não se desenvolve entre o externo e o interno, senão que se realiza inteiramente na intimidade: se o bem moral consiste na pura entrega à vontade de Deus e no desapego absoluto da realidade exterior, a culpa está na dispersão da alma no mundo das coisas, no desejo de posse, no abandono ao vão encanto dos bens terrenos. Mas aquele que pecando perde a consciência de sua interioridade divina, sente em si a angústia do nada, porque de nada valem as coisas que amou e quis: a angústia o faz compreender a necessidade de reconquistar-se e de recolher-se em sua intimidade. Mas o círculo espiritual não se afirma se ele não reconhece o chamado da angústia e com um ato de amor e de entrega não se libera de uma vez de seu pecaminoso afã e de seus motivos práticos e se une, com um ato de vontade, à vontade de Deus identificando-a com esta. Neste “ato” se concentra toda a vida moral do homem e o valor de sua vontade e de seu espírito: este ato que estabelece o divino presente na dispersão temporal, resgata todo o passado. “Encontrando o mortal agora mais receptivo, Deus não se preocupa com o que ele foi antes. Deus é um Deus do presente: tal como te encontra te toma e te deixa e não pergunta o que tu foste, mas o que és agora.”

Visto que o ato moral se cumpre unicamente na superação de um limite, é natural que também as dores, as desventuras, os males exteriores, sejam momentos necessários da boa vontade; não menos que o pecado, constituem aquela exteriorização negativa cuja negação por parte da alma é valor moral. Sem eles a alma se cristalizaria em uma identidade vazia e insignificante, estaria em Deus mas não seria para Deus; o exterior é o que não deveria existir e, portanto, deve ser negado e transcendido, mas se não existisse, a alma não poderia realizar seu ato porque lhe faltaria a base para transcender. O pecado e a dor não são bens nem algo positivo; contudo condicionam a todo o instante o bem e o gozo do espírito. A vida moral se concebe, então, como atividade perene que não se isola do mundo, senão que se apoia solidamente sobre o mundo e dele se ergue sem cessar para condená-lo e redimi-lo ao mesmo tempo.