Eckhart Deidade

Mestre Eckhart — Termos e Noções
Tradução em português
DEIDADE, A ABSOLUTA LIBERDADE DE A PLENITUDE SER
Para Eckhart, o ser, desprendido, solto, na sua ab-soluta liberdade, é direta e imediatamente a plenitude simplesmente. A expressão medieval Deus est ipsum esse1 diz o ser como plenitude e quer acenar para o sentido da definição dada pelo próprio Deus a Moisés na sarça ardente: Sou quem sou (Ex 3,14). Trata-se da absoluta plenitude de ser, na vigência da total soltura da liberdade no inesgotável e insondável abismo da sua gratuidade, como que a tinir na superabundância da sua identidade difusiva. Por isso, se transborda como movimento da dinâmica interna, a partir e para dentro da sua, a mais abissal intimidade como vida trinitária. E então a partir dessa erupção trinitária, através do Filho que se encarna e é Jesus Cristo, se difunde como cuidado e disponibilidade da presença generosa da sua doação cordial, gerando e sustentando toda a criação, na presença do seu amor. Por isso o Deus da Abgeschiedenheit jamais é um ente supremo na exclusividade da alteridade, isolado e ensimesmado na preciosidade da sua transcendência neutra, meta-física. Um deus assim, exclusivo e isolado um (n. 1), seria apenas um ente gigantesco a modo do “ser-coisa”, jamais um Deus vivo. Na interpretação do Deus da Abgeschiedenheit podem surgir duas modalidades que não fazem jus ao que nos dizem os sermões alemães de Eckhart acerca do Deus-desprendimento. Uma é entender a Abgeschiedenheit como uma radical acentuação da alteridade de Deus, para evitar o panteísmo, de tal sorte que dessa radicalização pode se chegar por fim à conclusão de que de Deus nada podemos saber. Eckhart seria nesse caso um agnóstico! A outra é entender a Abgeschiedenheit como a incondicional afirmação de que Deus é ab-soluto, solto, ele mesmo como o ente supremo e transcendente, na posse exclusiva do ser. Assim, fora dele não há propriamente nenhum ser, a não ser nada, de tal sorte que se algo é, esse algo é prolongamento-pedaço ou parte, é modalidade, é manifestação do próprio Deus. Eckhart seria nesse caso um panteísta. É de grande importância para uma compreensão mais própria dos sermões alemães de Eckhart, observar que essas duas tendências de interpretação operam a partir e dentro do horizonte de um sentido do ser inteiramente inadequado para compreender a dimensão a partir e dentro da qual os sermões estão falando. Sem podermos entrar mais em detalhes nessa questão do sentido do ser, assinalemos apenas que as interpretações acima mencionadas e similares, entendem por ser entidade e entificação a partir e dentro do sentido do ser da coisalidade físico-material, quantitativo. A suspeita do panteísmo e do agnosticismo no fundo vem não tanto do que Eckhart diz, mas sim do ser da coisalidade físico-material, quantitativo projetado para dentro e sobre o ser de uma fala, cuja tonância e ressonância são de origem e pertença inteiramente diferentes. O cuidado do pensamento medieval atuante na mística de alguém como Eckhart, que aparece de um lado como preocupação de distanciar Deus das criaturas e ao mesmo tempo, por outro lado, de impregnar as criaturas com a presença real de Deus, não era o receio do panteísmo nem preocupações “epistemológicas” da teoria de conhecimento acerca de Deus, mas sim de abordar com finura e fidelidade Deus e as criaturas a partir e dentro do sentido do ser, cuja dominância e sonoridade fundamental é da Minne.

O Deus de Eckhart, cuja deidade se chama vida trinitária, é Vida no seu sentido o mais pleno, e é denominado por Eckhart de Minne. Portanto, para Eckhart ser é plenitude da vida e Vida plena é Minne.


Traduções em francês
Gwendoline Jarczyk e Pierre-Jean Labarrière

  • Deidade, goitheit, gothait, gotheit
    • SERMÃO XV
    • SERMÃO XXI
    • SERMÃO XXIII
    • SERMÃO XXV
    • SERMÃO XXVII

      NOTAS: FOOTNOTEAREA() /




  1. A essa plenitude ab-soluta Eckhart dá o nome de Istikeit ou Isticheit. Em Istikeit está isti (é); -keit ou cheit (dade). Quint transcreveu o alemão medieval Istikeit para o alemão atual Ur-Sein, isto é, Ser-Originário. Sem correspondência de étimos no português, apesar da rudeza, mantivemos esti-dade. Poder-se-ia talvez dizer que Istikeit é a ab-soluta concentração do ser na plenitude encarnada como totalidade bem definida na sua concreção como coincidência do máximo universal com o singular. Um outro termo para dizer Istikeit é Wesenheit (essencialidade) e Seinheit (Ser).