A SUBIDA DO MONTE CARMELO

SÃO JOÃO DA CRUZA SUBIDA DO MONTE CARMELO

Versão original em espanhol A seguir, excertos feitos a partir da tradução de obras de João da Cruz realizada pelas Carmelitas Descalças do Convento de Santa Teresa do Rio de Janeiro, publicada pela Editora Vozes.

Apresentação do Pe. M.T.L. Penido

A Subida do Monte Carmelo. A vida mística, à qual João da Cruz nos convida a nos dispormos, ele a concebe como união de amor com Deus. A perfeição desta vida será a «união transformante», na qual a vontade da alma se acha transformada, pelo amor, na vontade de Deus: duas vontades num só e mesmo amor. Graça muito alta e rara. Mas os primeiros graus da união de amor são mais encontradiços entre os espirituais. Embora eles também sejam dons gratuitos de Deus, podemos e devemos nos dispor a recebê-los se for conforme ao divino beneplácito. Deus não põe sua graça na alma senão na medida da vontade e do amor dela. Por conseguinte, desejando a alma que Deus se dê todo a ela, deve entregar-se toda a ele. Sem dúvida, é Deus que vem a nós; todavia, devemos nos pôr a caminho, procurá-lo, remover os obstáculos.

A Subida ensina, de modo concreto, essa entrega e o caráter total que deve revestir. A obra enfeixa, pois, os princípios ascéticos de João da Cruz. Ascetismo implacável. Não admite complacência ou meia-medida. Exige a renúncia absoluta. Não por calúnia foi João da Cruz alcunhado o Doutor do Nada, e ficou célebre, entre os espirituais, esta sua frase : "Nada, nada, nada, até deixar a própria pele e o resto, por Cristo".

(...)

A preparação ascética — ou, como ele diz, a "purificação ativa" — à vida mística, João da Cruz concebe-a como exercício constante, puro, heroico até, das 3 virtudes teologais. Se queremos, com efeito, nos unir a Deus, o único meio de encontrá-lo será através da fé, da esperança e da caridade. Mais intensas essas virtudes, mais estreita a união. Donde a divisão da Subida em três livros, para ensinar nos a tríplice «purificação». Despida a inteligência, pela fé, de pensamentos que não são puramente Deus, poderá, ser elevada às coisas divinas; esvaziada a memória, pela esperança, de lembranças terrenas, poderá ser enchida de divinas notícias; desprendida a vontade de qualquer apego, pela caridade, poderá ser livremente movida pelo divino amor.

João da Cruz não aconselha apenas a depuração e pacificação das atividades naturais — sensações, imagens, lembranças, reflexões, desejos, — mas ainda de toda a atividade religiosa menos perfeita. Não se cansa de pedir a renúncia à religião gozadora: devoção sensível, apegos às graças extraordinárias (visões etc.). Só assim viverá o discípulo em pura fé, esperança e caridade. Na Subida o Santo pormenoriza, com férrea lógica, os meios práticos a empregar pela alma no seu esforço de desnudamento.

  • PRÓLOGO
  • LIVRO I — A NOITE ESCURA
  • LIVRO II — SUBIR À UNIÃO DE DEUS PELA FÉ
  • LIVRO III — PURGAÇÃO DA NOITE ATIVA DA MEMÓRIA E DA VONTADE

São João da Cruz — A Subida do Monte Carmelo — Poema Inicial

As sentenças seguintes declaram o modo de subir pela senda ao Monte, e dão aviso para não seguir os dois caminhos desviados.

Modo para chegar ao Tudo Para chegares ao que não sabes, Hás de ir por onde não sabes. Para chegares ao que não gozas, Hás de ir por onde não gozas. Para vires ao que não possuis, Hás de ir por onde não possuis. Para vires a ser o que não és, Hás de ir por onde não és.

Modo de possuir tudo Para vires a saber tudo, Não queiras saber coisa alguma. Para vires a gozar tudo, Não queiras gozar coisa alguma. Para vires a possuir tudo, Não queiras possuir coisa alguma. Para vires a ser tudo, Não queiras ser coisa alguma.

Modo para não impedir o tudo Quando reparas em alguma coisa, Deixas de arrojar-te ao tudo. Porque para vires de todo ao tudo, Hás de deixar de todo ao tudo. E quando vieres a tudo ter, Hás de tê-lo sem nada querer. Porque se queres ter algo em tudo, Não tens puro em Deus teu tesouro.

Indício de que se tem tudo Nesta desnudez acha o espírito sua quietação e descanso, porque, nada cobiçando, nada o impele para cima e nada o oprime para baixo, porque está no centro de sua humildade; pois quando cobiça alguma coisa nisto mesmo se fatiga.