Baader (FC:I.10) – manifestação e criatura

A união aumenta nas mesmas proporções que a distinção (a multiplicidade de órgãos); em outras palavras, quanto mais um ser se fecha em si mesmo (segue um movimento de atração), mais livremente se desdobra (segue um movimento de expansão). Mas essa união ou harmonização da existência dentro de si mesmo e da existência fora de si mesmo, do ser dentro de si mesmo e do tornar-se fora de si mesmo, deriva unicamente de um conflito ou contradição (e desaparece em uma contradição): Jacob Böhme via essa contradição como o centrum naturae ou o início de toda manifestação vital e como o dispensário secreto dessa manifestação; pois é somente ao passar por esse conflito e contradição e triunfar sobre eles que a vida se liberta dessa angústia do nascimento e se apropria das forças da manifestação como um espólio reunido durante essa travessia e nela.

Na medida em que toda manifestação tem uma subordinação em sua base, entendemos: 1°) que no caso em que representamos tal manifestação como “incipiente”, devemos antes de tudo ou ao mesmo tempo representar o nascimento do termo a ser subordinado, um termo que, comparado com aquilo que deve se manifestar, deve, por assim dizer, apresentar-se como o instrumento dessa manifestação. É por isso que Jacob Böhme subordina ao Deus eterno (o espírito eterno) uma natureza eterna (que, no entanto, emerge eternamente dele). Também entendemos: 2°) que quando essa subordinação chega ao fim, não apenas essa manifestação também chega ao fim, mas uma manifestação oposta (a do instinto por si mesmo) aparece. Em outras palavras, sempre que a natureza se eleva, sempre que ela passa do estado de uma coisa para o de uma personalidade — isto é, de aspiração tantálica em direção a uma personalidade — sempre que ela passa do estado de um instrumento sujeito a uma vontade para o de um instrumento não sujeito a essa vontade, o processo de evolução é transformado em um processo de revolução; e assim que o centrum naturae1 em uma criatura começa a não mais desejar parar em Deus, Deus (espírito) deixa de começar a se manifestar em, com e por meio desta criatura; e uma criatura que Deus deixa de penetrar e habitar é simplesmente atravessada por ele na medida em que ele é poder absoluto. Jacob Böhme também mostrou como a criação (como uma particularização do princípio da natureza) tornou necessário elevar (excitar e, portanto, excitabilidade e inflamabilidade em isolamento) esse princípio ao auge da individualidade: uma necessidade da qual teve que emergir a tendência de se manifestar por si mesmo e assumir o estado de uma criatura; também mostrou como à depressão e exaustão dessa tendência (que equivale a uma restituição a Deus pela criatura da força de manifestação da natureza) corresponde a fortificação, substancialização ou encarnação dessa criatura (cf. Princípios da Constituição e do Fundamento da Vida, § 13 32); do que se segue que o mal não pode ser pensado como tal, ou seja, como um motivo, mas apenas como um fundamento, e isso só se torna um motivo ou causa depois de ter encontrado um lar na vontade da criatura. (Cf. Hegel, Enciclopédia das Ciências Filosóficas, p. 74.) É por isso que tomo a liberdade de apontar contra Hegel que a natureza não tem verdade porque existe e é o que é, mas porque não responde e na medida em que não responde ao devir de Deus através dela (na medida em que não se manifesta e imita Deus) e que, portanto, seria errado definir a natureza como um declínio da Ideia em relação a si mesma. A natureza deve, de fato, ter carregado consigo, no elemento de sua exterioridade, a marca de sua inadequação a si mesma; e, consequentemente, o instinto de manifestar o espírito deve ter sido um esforço tentador, eternamente insatisfeito, semelhante ao de um artista cujo destino seria trabalhar apenas em matéria rebelde e irreconciliável.

Não é diretamente da unidade (Monas) que a criatura emerge na forma de uma mônada, como pensava Leibniz, por meio de uma coruscação ou emanação, que não é uma criação, e é assim que a criatura seria, como quer o panteísta, uma única essência com Deus — a criatura emerge do que deve ser chamado de exterioridade de Deus, isto é, de seu esplendor, o que implica uma pluralidade, indivisível, é verdade, de poderes, princípios e forças. Dado que a criatura, como uma unidade múltipla, emergiu diretamente dessa pluralidade, e que cada um dos princípios criativos foi, dessa forma, separadamente ativo, entendemos que essa mobilidade particular teve que permanecer nos princípios comunicados à natureza de uma maneira constitutiva; e também entendemos, dado que a criatura não poderia se libertar dessa multiplicidade externa nem trazê-la para si mesma à unidade, que lhe foi imposto como um dever conquistar essa unidade retornando ou reentrando no único Uniens (o Logos): uma assistência ininterrupta do Logos, demonstrável apenas de uma forma em naturezas não inteligentes, e de outra forma em naturezas inteligentes, e sem a qual nem uma nem a outra subsistiriam por um único momento. A partir disso, chegamos à ideia, indispensável à ciência religiosa, de que nenhuma criatura poderia ser formada a não ser falível, e explicamos por que isso é assim; também vemos que essa criatura só pode entrar no terceiro momento de sua confirmação ou substancialização deixando seu primeiro estado de criatura e passando por um segundo momento (o da formação de acordo com as leis ou regularização de sua multiplicidade); três momentos que Isaías designa pelas palavras: “creavi te, formavi te et feci te” — essencialização, formação, substancialização.


  1. Para J. Böhme, Centrum naturae sempre significa círculo, enquadramento, fundação.