Antonius Conduta Virtuosa 41-50

SANTO ANTÃO — EXORTAÇÕES SOBRE O COMPORTAMENTO DOS HOMENS E A CONDUTA VIRTUOSA
41. Não convém aos menos dotados dos homens, àqueles que desesperam deles mesmos, de tratar pela negligência e o desprezo a conduta virtuosa amada de Deus, sob o pretexto que ela lhes seria inacessível e fora do alcance. Ao contrário, devem exercer suas forças e tomar cuidado deles mesmos, pois mesmo se eles não podem alcançar os cumes da virtude e da salvação, no entanto, por seu esforço e seu desejo, ou bem eles se tornam melhores, ou bem eles não se tornam piores, o que não é para alma uma vantagem pequena.

42. Por sua natureza razoável, o homem se religa a esta faculdade misteriosa e divina da razão. Mas por sua natureza corporal, ele se aparenta aos animais. Alguns, pouco numerosos, verdadeiramente homens e verdadeiramente dotados de razão, de coração querem levar a Deus e seu Salvador seu pensamento e sua afinidade, e eles o manifestam por seus atos e sua vida virtuosa. Mas a maior parte dos homens, que não têm a inteligência da alma, negligenciam esta filiação divina e imortal, para se voltar para a afinidade do corpo, a afinidade morta, infeliz e passageira, e não pensar senão nas coisas da carne, como as bestas sem razão, em se apegando ao prazer. Eles assim se separam de Deus e, pelo efeito de sua vontade, desprendem a alma dos céus e a conduzem no abismo.

43. O homem dotado de razão, se lembrando que tem parte no divino e que está unido a ele, não irá jamais se deixar apreender do que quer que seja terrestre ou vil. Ele mantém sua inteligência voltada para o celeste e o eterno. E ele sabe que a vontade de Deus é a salvação do homem, desde que Deus é para os homens a causa de todos os bens e a fonte da beatitude eterna.

44. Quando tens que lidar com alguém que disputa e que combate a verdade e a evidência, corta a disputa e retira-te diante de um tal homem cuja inteligência está petrificada. Assim como, com efeito, a má água desnatura os melhores vinhos, assim também as conversações deslocadas corrompem aqueles que consagram sua vida e seu pensamento à virtude.

45. Se nos esforçamos por todos os meios de escapar à morte do corpo, devemos muito mais ainda nos esforçar por escapar à morte da alma. Diante daquele que quer ser salvo, não há com efeito outro obstáculo que a negligência e a preguiça da alma.

46. Aqueles que têm dificuldade em compreender sua vantagem e o que lhes é dito do bem são considerados como doentes. Mas quando aqueles que compreendem a verdade disputam impudentemente, é sua razão que está morta e seu comportamento que é salvagem. Eles não conhecem Deus, e sua alma não foi iluminada.

47. Deus, por sua palavra, destinou as espécies animais a usos sucessivos. Uns deviam ser comidos. Outros deviam servir. E ele criou o homem para ser o contemplador de suas vidas e de suas obras, e seu intérprete reconhecedor. Que os homens se apliquem portanto a não morrer sem ter contemplado e sem compreender Deus e suas obras, como as bestas sem razão. O homem deve saber que Deus pode tudo. E nada não se opõe Àquele que tudo pode. A partir do nada ele fez e ele faz tudo o que quer, por sua simples palavra, pela salvação dos homens.

48. O que está no céu é imortal, por causa da bondade inerente ao celeste. Mas o que está sobre a terra se tornou mortal, por causa do mal que o terrestre pôs dele mesmo nele. E este mal, do fato de sua negligência e de sua ignorância de Deus, alcança aqueles que faltam inteligência.

49. A morte, se o homem sabe compreendê-la, é imortalidade. Mas para os ignorantes, que não a compreendem, ela é verdadeiramente a morte. Não é esta morte aí que se deve temer, mas a perdição da alma, a qual está na ignorância de Deus. É isso que, para a alma, é apavorante.

50. O mal é uma afetação da matéria. Não é portanto possível que o corpo permaneça estranho ao mal. A alma dotada de razão, que compreende isso, enfrenta este peso da matéria que é o mal. Recusando portar um tal peso, ela se volta para o conhecimento do Deus do universo, e tem doravante o corpo por um inimigo e um adversário ao qual ela não se fia. É assim que a alma recebe de Deus a coroa, quando ela superou a provação do mal e da matéria.