Paulo Ressurreição

PAULO — RESSURREIÇÃO


Gnosticismo
Roberto Pla
Evangelho de ToméLogion 87
Há motivos fundados para supor, tal como faz a vertente manifesta, o restabelecimento desta integridade espiritual, psíquica e somática em um mundo celestial futuro? Se pode pensar nesta vinda da corporeidade renovada e purificada no reino de Deus? Cabe corporeidade alguma nestes domínios sem forma da luz infinita?

Acorrente manifesta se apoia antes de tudo em sua interpretação dos textos paulinos para sustentar uma hipótese favorável em resposta à interrogação que planteiam estas perguntas. A vertente oculta aceita também os textos admiráveis do apóstolo, mas sua exegese é diferente.

Tal como explica Paulo Apostolo no capítulo 15 de 1Co, a crença dos cristãos na ressurreição parte da em que Cristo — o Cristo manifesto e o oculto, e este último não somente em Jesus senão em todo homem — ressuscitou. Este reviver de Jesus, o cristo, é o único antecedente evangélico da ressurreição no Reino de Deus, e não podia haver outro, posto que Jesus foi o primeiro que ressuscitou. Paulo o consigna: “Cristo ressuscitou dentre os mortos como primícia dos que dormitam” (vv 20; os textos paulinos sobre a ressurreição aparecem quase todos centrados em 1Co 15).

Com isso de dormir, recorda o apóstolo aquele hino cristão que se inclui em Efésios e que ali toma um sentido de ressurreição do Cristo oculto:

Desperta-te tu que dormes,
e levanta-te de entre os mortos
e te iluminará Cristo (Ef 5,14)

Mas o homem que há de levantar-se para reviver não é o homem de Adão, posto que Adão e os adãos manifestos que viveram logo, desde então, todos morreram com ele. Não há que esquecê-lo: a primícia dos que dormiram e ressuscitaram foi Cristo. Logos os homens que renascem em Cristo, que recebem a Vinda do Cristo (v. VINDA DO FILHO DO HOMEM), oculto até então no crisol de sua alma. Por isso diz o apóstolo: “Todos morrem em Adão e todos reviverão em Cristo” (vv 21).

Em verdade, nisso de reviver, Cristo manifesto foi a primícia, e logo nós, os de Cristo oculto, recebido em sua Vinda, quando é descoberto por cada um no mundo.

Então será destruída a morte, por cada um e em si mesmo (vv 24), e Deus será “tudo em tudo” segundo a unidade de submetimento do Filho a Deus e de todos ao Filho (vv 28).

Tudo isso quanto à ressurreição, mas a continuação pergunta Paulo: “Como ressuscitam os mortos? Com que corpo voltam à vida?” (vv 24). Como auto-resposta se introduz o apóstolo no que se denominou “o modo de ressurreição”, e nesse “modo” não se dilucida se há ou não há ressurreição, pois claramente “sim há”, pelos antecedentes estudados; nem se tenta esclarecer se os que ressuscitam voltam à vida (do reino) com um corpo, pois “sim” é com o corpo, ao dizer de Paulo. A pergunta concreta é esta: Os que ressuscitam, “com que corpo voltam à vida (do Reino)?”.

Para sua própria pergunta, elabora o apóstolo uma longa resposta, minuciosa e rica em imagens que, por desgraça, dada a transcendência doutrinal e histórica do problema, não encontrou a leitura justa. Por isto agora não se trata neste caso da conjugação metodológica de duas vertentes, a oculta e a manifesta, senão de entender a leitura que é.

Explica o apóstolo: “O que tu semeias não é o corpo que vai brotar, senão um simples grão, de trigo por exemplo ou de alguma outra planta. E Deus o dá um corpo a sua vontade: a cada semente um corpo peculiar (vv 37-38).

Como a semente de trigo ou de outra planta não é o corpo que logo vai brotar na ressurreição, senão que este último o dá Deus, a sua vontade, a leitura do texto paulino explica que um é o corpo que morre e outro o corpo que reveste à alma, o corpo “peculiar” da alma que Deus dá.

O corpo dado por Deus à alma, o corpo novo, peculiar, não é da mesma espécie de carne dos homens na terra, “porque não toda carne é igual”. Por isso, há “corpos terrestres e corpos celestes” (vv 39-40).

O corpo da alma para vida desta no Reino dos Céus, é um corpo celeste, que se distingue do corpo terreno por peculiaridade, substância e condição. Não é de corrupção como o corpo carnal da terra, senão incorruptível; nem é de vileza, como o corpo carnal terrestre, senão de glória, porque sua “carne” é a luz (v. Michel Henry Encarnação); nem é débil, mortal, material, senão feito em fortaleza, em espírito, em fôrça de Deus.

Por tudo isso diz o apóstolo: “Se semeia um corpo natural ressuscita um corpo espiritual” (vv 44). Por “que que se semeia”, há que entender o corpo em cada homem nasce e morre com ele na terra; por “o que ressuscita”, está claro que não se refere o apóstolo ao mesmo corpo que se teve na terra feito incorruptível e imortal, senão a um corpo distinto, peculiar, para a vida no Reino. Em pensar que o corpo invisível da ressurreição é o mesmo corpo terrestre embora modificado, reside no erro histórico quanto à ressurreição.

O corpo peculiar da alma é um corpo distinto, novo: o próprio da alma no reino de Deus. Não é o corpo “natural”, visível, dado pela natureza ao homem terreno, senão um corpoespiritual”, luminoso, visível só aos olhos que podem ver a alma e que serve para moldurar em uma unidade de consciência, não esparramada pelo espaço sem limites, ao “último Adão, espírito que dá vida” (vv 45) (v. Adão Alma Espírito).

Este Adão é o segundo homem, o que vem do céu (vv 47). Como nascido do Espírito, este Adão é espírito e dele falou Jesus a Nicodemo segundo o quarto evangelhos (Nascer do Alto). O corpo que há de vestir a este Adão, o peculiar da alma, o que levaremos na ressurreição, não será a imagem do homem terreno, a túnica de carne e pele terrena, senão a imagem do homem celeste (vv 49).

Para assegurar que será entendido por todos os sentido verdadeiro de seu discurso, adiciona Paulo Apostolo: “A carne e o sangue não podem herdar os Reino dos céus ; nem a corrupção herda a incorrupção” (vv 50).