Ambrósio de Milão — Parábola das Minas
Obras de San Ambrosio, I, Tratado sobre el Evangelio de San Lucas, Biblioteca de Autores Cristianos (BAC), Madrid, 1966, 655 p., edición bilingüe preparada por el padre Manuel Garrido Bonaño, O.S.B.
Tradução de Antonio Carneiro das páginas 527, 528 e 529
91. Eis aqui que tua mina produziu outras dez. Perfeita resulta essa providência de chamar os gentios e fazer condenar aos judeus, posto que estes não quiseram ter a Cristo por rei, o qual lhes propôs essa parábola para que não pudessem dizer “que não havia dado aos judeus nenhuma predileção para que pudessem ter sido melhores”; ou então, “porque reclamar algo daquele que nada recebeu ?” Em verdade, esta mina não tem um valor desprezável, já que por ela, como vimos antes, a mulher do Evangelho acendeu uma luz, pois antes não a buscava com ajuda dessa luz, e, uma vez encontrada, se felicitava sem cessar (Lc 15,8).
92. Ao fim, um, com uma mina, logrou produzir dez minas mais, e outro cinco. Quiçá tenham estas minas uma aplicação moral, vendo nelas os cinco sentidos do corpo, e nas dez, que são o dobro, os mistérios da Lei e a prática da virtude. Por isso também em Mateus se encontram os cinco talentos e os dois talentos, com o fim de que os cinco sejam uma figura da prática, e os outros dois sejam, por sua vez, da ascética e da mística. E assim, este último, que é em menor número, é de um conteúdo muito mais rico. Também podemos ver nas dez minas o decálogo, quer dizer, a doutrina da Lei, e nas cinco, as normas de uma boa conduta. Mas, a mim me parece que um doutor da Lei deve ser perfeito em tudo: pois não está em palavras o reino de Deus, mas sim em realidades (1 Cor 4, 20).
93. E posto que fala dos judeus, cita, muito bem de acordo, que só dois foram os que apresentaram um capital que havia crescido, e não por rendas pecuniárias, mas sim pela predicação, já que uma coisa é o juro do dinheiro aplicado em crédito e outra diferente a da doutrina celestial.
94. Aliás, quando o Senhor disse: Porque não entregaste meu dinheiro ao banqueiro?, não reclama nosso dinheiro, mas sim o seu.
95. Um disse que o escondeu na terra (Mt 25,18), parecendo querer dizer que havia ocultado a razão, dom que leva impresso a imagem e semelhança de Deus, no esconderijo dos maus desejos, sepultando-a na fossa da carne. Não se fala dos outros que, como pródigos devedores desperdiçaram tudo o que receberam. Nestes dois estão representados o pequeno número daqueles que por duas vezes foram enviados aos trabalhadores da vinha (Lc 20, 10), enquanto que os outros simbolizam os judeus. Também Mateus nos quis dar a explicação desta comparação do seguinte modo: Igual que o rico, que não distribuiu suas riquezas entre os pobres, assim também, quem não dispensou o benefício de sua doutrina para os ignorantes quando lhes podia ter ensinado, se torna réu de uma culpa bastante grave. E como isto temos tratado nos livros da fé, é conveniente passar para outro ponto.
96. Quanto as dez cidades, que outra coisa podem significar senão essas almas ante aqueles que se colocam como modelos, com toda justiça, à Esse que depositou nas inteligências dos homens o dinheiro do Senhor, quer dizer, “essas palavras castas e acrisoladas como a prata” ? (Sal 11, 7). porque as almas pacíficas são, ao igual que Jerusalém, cidades bem construídas (Sal 121, 3). E do mesmo modo que os anjos presidem a ela, assim também o farão aqueles que mereceram possuir a mesma vida dos anjos.