Tetramorfos [ASIEC]

O Tetramorfos tal como figura em numerosos tímpanos romanos, representa os quatro animais da Visão de Ezequiel retomados na Visão apocalíptica; se o homem figura entre eles, é que se trata, de maneira precisa, de “seres vivos” que representam de alguma maneira toda a “criação viva”.

Nesta perspectiva, a qualidade de homem não implica senão uma distinção específica e não uma preeminência hierárquica. Além do mais, estes “seres vivos” são dotados de asas, e consequentemente promovidos à dignidade de anjos. Ora, segundo Tomas de Aquino, a distinção entre os diferentes anjos é análoga, não à distinção entre os indivíduos de uma mesma espécie, mas àquela de uma espécie em relação a outra. É o que explica o simbolismo animal do Tetramorfos: a Visão e a obra de Arte revelam a “promoção angélica dos seres viventes”.

É evidente que tudo isso não recebe sua significação e sua realização senão pela presença do Cristo glorioso no meio dos quatro animais. É evidentemente ele, “o Filho do Deus Vivente”, o “Verbo de Vida”, que os “anima”, desde a vida animal até a vida angélica; todos têm a face voltada para a Luz Incriada, que não lhes aparece no entanto senão através da “amêndoa”: “Se queres o núcleo, deves furar a casca”. Mas há um movimento “ascensional” na contemplação dos quatro animais: o Touro, animal terrestre, e o Leão, animal solar, são obrigados a virar a cabeça; o homem está inclinado, mas a Águia olha o Cristo face a face, pois representa o mais alto grau da hierarquia dos seres e é ele mesmo um símbolo da Luz. “E a Vida era a Luz dos homens” (Jo I,4), o que nos conduza aos “seres viventes”. “Deus é Luz” (1Jo 1,5), mas é pela Vida que esta Luz é comunicada aos homens”. Vimos que isto não é sem relação com o simbolismo do Zodíaco, e examinaremos aqui alguns aspectos da Visão de Ezequiel.

Os quatro “seres viventes” estão cada um munidos de quatro faces correspondendo a cada animal tomado separadamente, e, segundo certos comentadores, “cada um indo diante de si” graças à disposição de suas quatro faces em que cada uma olha um dos quatro pontos cardeais, e adiciona o texto, “Não giravam indo”. Além do mais, há também rodas associadas aos quatro animais, elas também não giravam em sua marcha; entretanto a roda e os pontos cardeais têm uma relação evidente com o Zodíaco, deve-se ver no movimento de translação dos animais uma “fixação” dos pontos cardeias. Isto tem uma relação estreita com o plano geral do Templo que resume o cosmo inteiro, e que procede da “fixação espacial dos ritmos celestes” regendo o conjunto do mundo visível, ritmos celestes dos quais o mais importante é evidentemente o movimento anual do Sol no Zodíaco. Trata-se portanto da modificação do “tempo” em “espaço”, o “tempo” simbolizando evidentemente a vida terrestre e o “espaço” simbolizando seja a “Vida eterna” seja a “Eternidade divina”.

Esta transmutação do “tempo” em “espaço” simboliza por sua vez, do ponto de vista teológico, “a reintegração de todas as coisas em Jesus Cristo” (Ef 1,10), seja, do ponto de vista metafísico, o retorno da manifestação universal na Unidade do Princípio Supremo. Esta transmutação é ainda figurada em certos portais romanos pela presença do Cristo no centro do Zodíaco ou, na Astrologia tradicional, pela presença do Sol no centro do Zodíaco, os “doze sóis” da revolução zodiacal reintegram o Sol único no “final dos tempos”. Lembremos enfim que o plano do Templo repousa sobre a determinação dos pontos cardeais, e que toda igreja construída tradicionalmente deve ser orientada da maneira seguinte: o Este ou Sol levante (Lumen ex Oriente) corresponde ao Coração; o eixo Norte-Sul, quando existe um cruzeiro, determina com o eixo Este-Oeste a Cruz no centro da qual “convergem” as direções do espaço, este “retorno ao Centro” (concentração) tendo evidentemente a mesma significação que o “retorno ao Princípio”.

Outra interpretação metafísica dos Tetramorfos é de que os quatro animais representam os quatro evangelistas, o Touro correspondendo a Lucas, o Leão a Marcos, o homem a Mateus e a Águia a João, mas não se faz aqui apelo ao simbolismo propriamente dito: um “símbolo verdadeiro deve sempre ser uma realidade sensível representando uma realidade espiritual”, o inferior simbolizando o superior em virtude de uma correspondência analógica que, longe de ser uma convenção arbitrária ou uma invenção humana, reside “na natureza mesma das coisas”. Para apreender exatamente a essência do simbolismo, é preciso saber que “tudo subsiste eternamente”em Deus, ou ainda, “preexiste” eternamente em seu Pensamento, o Logos ou o Verbo. Em outros termos, uma realidade corporal ou de uma outra ordem, não existe em seu próprio nível senão porque lhe corresponde “in divinis” uma realidade “principial” que se pode designar sob o nome de “arquétipo” ou de “protótipo celeste”, sem o qual ela não teria e seu próprio plano, nenhuma existência. Esta realidade corporal ou outra não é senão a “manifestação” em certo plano de seu Arquétipo eterno. O simbolismo aparece então como o modo de “conhecimento metafísico” permitindo “ascender” do símbolo ao Simbolizado, do criado ao Incriado, do temporal ao Intemporal, do manifestado ao Não-Manifestado: através da transparência metafísica do símbolo, o intelecto humano (regenerado pela graça) reconhece em cada ser seu Arquétipo principial.

Nesta perspectiva, dir-se-ia então que os quatro animais do Tetramorfos representam “aspectos permanentes” do Verbo divino, assim como os “protótipos celestes” dos quatro evangelistas, mas é impossível descrevê-los, pois eles são inefáveis ou inexprimíveis.