GIUSEPPE FAGGIN — MEISTER ECKHART E A MÍSTICA MEDIEVAL ALEMÃ
A “THEOLOGIA DEUTSCH”
CONHECIMENTO
O conhecer compromete, portanto, toda a alma não corresponde unicamente à inteligência, mas também à vontade e ao amor, porque à universalidade da Verdade divina não se pode chegar se a vontade não orientou todas as forças para o Absoluto, afastando de si qualquer vínculo terreno. Concluindo, o amor não chega em segundo plano para completar e valorizar o ato cognitivo, mas o acompanha de modo inseparável e o condiciona. O francfortês, pelo contrário, reproduzindo talvez temas do intelectualismo tomista, não parece haver compreendido a indissolubilidade do ato ético-cognitivo: “conhecer sem amor não tem valor algum. E isto se vê até no diabo, que conhece a diferença entre o bem e o mal, o justo e o injusto, mas como não tem amor pelo Bem — ao qual no entanto conhece — não se torna bom. E isto aconteceria se tivesse amor pela verdade e pelos outros bens que conhece… Ainda que se façam muitas representações de Deus e de suas propriedades e se imagine saber muito bem o que é Deus, se o ser não tem amor não se torna divino não é divinizado”. Na realidade, as premissas eckhartianas não permitiriam tais conclusões. Eckhart havia deduzido do dogma trinitário uma teoria ético-gnoseológica que baseava o amor no próprio processo do conhecimento, pois se o conhecimento não é obra nossa, senão um “receber” que pressupõe de nossa parte uma pureza interior, não se compreende como o diabo, endurecido em seu egoísmo, possa compreender o Bem universal e infinito. Não ama porque não conhece e não conhece porque não ama. Aqui o autor da Teologia alemã se valeu mais dos motivos de uma teologia popular que das profundas intuições do Mestre.
De qualquer modo a moral tem seu centro em um ato desindividualizador não menos que o ato cognitivo. A criatura, enquanto criatura, quer dizer como objeto e coisa separada, não pode conhecer o Absoluto que transcende o ser particular e o individualizado. Portanto, quanto mais diminui sua natureza e sua separação, tanto mais aumenta nela a natureza de Deus, Deus mesmo. O ato pelo qual se eleva significa renunciar às próprias opiniões e aos próprios interesses, significa participar de uma Ordem universal. A Natureza é transcendida e condenada como não-sere amarga ilusão. O que era mais caro aos afetos e constituía o verdadeiro mundo cotidiano se desvanece como uma sombra vã. A inversão da naturalidade se realizou, transfigurando no mesmo instante todo o sofrimento. A alma se encontra de repente sem família e sem pátria, sem parentes e sem amigos, mas a destruição das distinções em Deus, destruiu ao mesmo tempo a fugaz alegria da aquisição e a dor da perda.
O Bem é agora amado em sua universalidade e em sua qualidade de absoluto: não porque seja útil, ou agradável, ou honroso, ou porque pertença a determinadas coisas, ou pessoas, mas unicamente porque é o Bem. Quem ama realmente, quer igualmente a Deus no tempo da abundância como no tempo da escassez, nos dias doces como nos amargos. A adesão da vontade criada à Vontade eterna é incondicional e desinteressada, não teme castigos nem espera prêmios. Se se perguntasse ao sol porque brilha, responderia: eu devo brilhar e não posso fazer outra coisa, porque esta é minha propriedade. O mesmo vale para Deus, Cristo e tudo o que é divino, que quer, age e não deseja outra coisa mais que o Bem e pelo Bem. Nem há outro porquê. O homem divino ou divinizado não deixa nunca de praticar a virtude, não por uma recompensa, nem por um porquê, mas simplesmente por amor à virtude.
É natural que nesta pureza de intenção e de amor se diminua o valor da obra exterior, mas não a tal ponto que se caia no amoralismo, já condenado, da seita do livre espírito. Todas as obras e os milagres que Deus mesmo realizou ou poderia realizar no futuro, enquanto são para mim coisas ou devenir externo não me tornam de nenhuma maneira bem-aventurado, mas tão somente enquanto são e acontecem em mim e em mim são algo conhecido, aceito, sentido e vivido na pureza do meu amor. A obra externa deve reduzir-se à interioridade para ser valorizada: mas continua sendo necessária para realizar este desapego do mundo que é a preparação para a meta suprema. Dos três graus em que se manifesta a vida do espírito, o primeiro é a “purificação” e condiciona o segundo e o terceiro, isto é, a “iluminação” e a “união”. Só mediante a exercitação se pode domar a natureza e realizar a pureza que implica renovada purificação. Mas é absurdo que no homem divinizado qualquer coisa seja indiferente, como seria absurdo afirmar que o sol pode indiferentemente brilhar ou escurecer. Visto que no homem divino não é a criatura que age, senão Deus e Deus é Bem universal e infinito, é evidente que dele não podem emanar senão ações caracterizadas por seu amor super-individual e onicompreensivo; também o francfortês, como Eckhart, rechaça inexoravelmente o subjetivismo em nome do mais objetivo dos valores, que humilha todo o egoísmo e se revela somente nas obras de caridade e de misericórdia. Lutero se equivocava quando apelava à Teologia alemã para confirmar sua teoria da justificação, pois em sua ética não cabe o primeiro grau da purificação.