Segundo Relato: Gn 3,21 – túnicas de cego

Chouraqui

21 IHVH-Adonaï Elohîms fait au glébeux et à sa femme des aubes de peau et les en vêt.

Nothomb

[(Gen 3,21 E Deus fez fazer ao Homem e a sua mulher túnicas de cego e delas os vestiu.)]

Diante da reação «otimista» do Homem e o silêncio da Mulher, Deus se apercebe que suas tentativas de dissuasão fracassaram. Longe de desencorajar os insensatos, ele os encorajou de certa maneira. Se deixaram de estar confiantes sobre o fim de sua aventura — que não se desenrolará sem ramificação — eles estão errados de se fazer ilusões sobre a sinistra sub-realidade da «condição humana» à qual eles aspiram se deixar levar, crendo poder aí manter-se sobre a superfície. Deus adivinha que aí escorrerão sem cessar, eles e seus descendentes, na agonia da morte. E tem piedade deles. E não os fulmina, não lhes dirige nenhuma reprimenda, mas tem um gesto que mostra ao mesmo tempo que se inclina diante de sua vontade, que os protege tanto quanto pode sem contrariá-la, e que denuncia sua loucura, sua cegueira. Ele lhes faz, diz o texto, ele lhes faz fazer túnicas — de pele segundo nossas bíblias, mas de qual pele, de qual animal esfolado no Éden? — cuja matéria importa pouco, mas cuja significação ao contrário é capital. Ela está aí gravada nas três consoantes hebraicas que os qualificam no texto CWR, grafia que se pode ler «pele» mas também «cego». E certamente, se depois de milênios, o texto imutável revela enfim porte impressionante desta possível leitura, é que ela aí estava desde sempre. O relato testemunha assim desde sempre que Deus, em vestindo nossos primeiros pais, e nós por procuração, de «túnicas de cego» não somente os protegeu a princípio de sua cegueira da Realidade de sua origem, que perderam de vista depois que tiveram os «olhos abertos», mas designados à posteridade, aos futuros leitores deste relato, deste texto como de falsos «videntes», que que não se deve acreditar, nem sobretudo imitar.

Abécassis

A Bíblia realmente diz que Deus fez para Adão e Eva túnicas de pele para esconder sua nudez. Mas a palavra skin – O’R – é muito próxima da palavra light: OR. É por isso que Rabi Meir ensinou que as vestimentas originais de luz foram transformadas em vestimentas de pele. O homem está nu porque não é mais transparente, mas verdadeiramente encarnado.

A. A. — Podemos reter esta diferença entre o homem e a mulher antes da transgressão e depois da transgressão. Antes, ambos eram leves, transparentes um para o outro; depois, tornaram-se opacas entre si. A recusa da Lei deu-lhes uma densidade e um peso que antes não tinham.

J.E. — Essa transição da translucidez para a opacidade é rica de significados. Ele também deixou sua marca nos ritos do Shabat. No sábado à noite, após o Shabat, o fogo é aceso novamente, geralmente na forma de uma vela. É costume apresentar as unhas à luz desta vela, e os rabinos explicam que é para comemorar, na hora em que a semana recomeça – a vida – a inocência e a translucidez do primeiro homem. Também podemos entender perfeitamente como a passagem da luz para a pele leva à sensação de nudez. O primeiro homem é inocente. Ele não conhece o mal. Ele não tem segredos ou segundas intenções! é verdadeiramente transparente. Após a falta, ele se tornou indivíduo e corpo, com áreas de sombra, modéstia – isto é, expectativa e desejo – sigilo e egoísmo. Se ele se sente nu, significa que a partir de agora ele sempre terá algo a esconder.

Fabre d’Olivet

21. Ensuite IHÔAH, l’Être des êtres, fit pour Adam et pour sa compagne intellectuelle, des sortes de corps de défense dont il les revêtit avec soin.

LXX

(3:21) και εποιησεν κυριος ο θεος τω αδαμ και τη γυναικι αυτου χιτωνας δερματινους και ενεδυσεν αυτους

Vulgata

(3:21) fecit quoque Dominus Deus Adam et uxori eius tunicas pellicias et induit eos