Gen 3,20 E o homem chamou o nome de sua mulher «vivente» (hawwa). Por conseguinte ele terá sido a mãe de todo morto-vivo (HY)
Os leitores de nossas bíblias devem se perguntar com efeito porque ao anúncio de seu «retorno ao pó», o Homem reagiu não se deprimindo mas em jubilando! Alguns comentadores não veem outra explicação que aquela de uma «corrupção» do texto, onde este versículo, seguindo imediatamente a pronúncia da terrível sentença, teria sido inserido por erro neste lugar. Hipótese insustentável concernente um texto tão minuciosamente redigido, revisado e «compilado». É evidente que o Homem não compreendeu o anúncio de seu retorno ao pó, como nossas bíblias e como a tradição. Para ele isto não é uma terrível sentença, mas muito pelo contrário. Deus em o repreendendo por sua conduta e lhe predizendo o que ia inevitavelmente lhe despencar sobre si se aí persistisse, certamente o assustou, mas sobretudo por sua presença. Por sua voz, a voz da liberdade, lhe recordando sua natureza, da qual finalmente o Homem tem medo. Não é o ser nu, como o pretendeu a Deus, que o Homem tem medo. Mas de ser livre, sem «mestre a pensar». De onde a sedução que exerce sobre a Mulher mas então sobre ele a lógica da linguagem, pronta a se transformar em Razão soberana, repousante, lhe dispensando decidir ou não decidir, decidindo para ele, lhe impondo sua necessidade. Te medo agora de uma única coisa: de não poder deixar o jardim, de não poder fazer a experiência pelo menos da «condição humana», de seus contrários, de seus limites correspondendo à «sub-realidade» onde caiu. E aí Deus, querendo dissuadi-lo, paradoxalmente o reassegurou. Não somente Deus não o impedirá de sair do jardim e de fazer todas as experiências mortíferas que quer (na medida que delas ainda não saboreou), mas Deus lhe anuncia, Deus lhe confirma (pois apesar de tudo tem a íntima convicção) que não poderá mudar definitivamente sua natureza, que, o que quer que faça, restará fundamentalmente o que é, tal qual foi Criado: Uno, imortal e livre, e que, quando disto tiver o suficiente — não agora — poderá voltar atrás, voltar no jardim… Eis porque ele jubila, e chama sua mulher, não mais de um nome genérico e abstrato, mas de um nome de afeição e de felicidade, do mesmo nome da Vida.
É preciso saber que HWH (pronunciado «Hawwa») «Eva» é a forma regular do particípio presente do verbo HYH (pronunciado «haya») «viver», e logo significa no sentido pleno «Vivente». Mas aparte esta ocorrência única na Bíblia, esta forma HWH não figurará jamais. Nem na língua hebraica que lhe substituiu pela forma forma reduzida HY, que aparece desde a segunda frase do versículo, considerada por todo crítica, e a justo título assim entendo, como uma glosa. Glosa provavelmente muito antiga, que opõe à jubilação exagerada do Homem, qualificando sua mulher de Vivente, no momento que se prepara justamente a deslizar na morte, a restrição que se ela permanece vivente por sua natureza, a Mulher por sua falta vai dar nascimento a mortos-vivos, a seres precários e conscientes, destinados ao túmulo. Estes descendentes, a Bíblia os qualifica de HY, forma reduzida da HWH, como para o sublinhar.