Salmo CXV

SALMO CXV

1) Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao teu nome dá glória, por amor da tua benignidade e da tua verdade.
2) Por que perguntariam as nações: Onde está o seu Deus?
3) Mas o nosso Deus está nos céus; ele faz tudo o que lhe apraz.
4) Os ídolos deles são prata e ouro, obra das mãos do homem.
5) Têm boca, mas não falam; têm olhos, mas não vêem;
6) têm ouvidos, mas não ouvem; têm nariz, mas não cheiram;
7) têm mãos, mas não apalpam; têm pés, mas não andam; nem som algum sai da sua garganta.
8) Semelhantes a eles sejam os que fazem, e todos os que neles confiam.
9) Confia, ó Israel, no Senhor; ele é seu auxílio e seu escudo.
10) Casa de Arão, confia no Senhor; ele é seu auxílio e seu escudo.
11) Vós, os que temeis ao Senhor, confiai no Senhor; ele é seu auxílio e seu escudo.
12) O Senhor tem-se lembrado de nós, abençoar-nos-á; abençoará a casa de Israel; abençoará a casa de Arão;
13) abençoará os que temem ao Senhor, tanto pequenos como grandes.
14) Aumente-vos o Senhor cada vez mais, a vós e a vossos filhos.
15) Sede vós benditos do Senhor, que fez os céus e a terra.
16) Os céus são os céus do Senhor, mas a terra, deu-a ele aos filhos dos homens.
17) Os mortos não louvam ao Senhor, nem os que descem ao silêncio;
18) nós, porém, bendiremos ao Senhor, desde agora e para sempre. Louvai ao Senhor.
(Sl 115:1-18)

Não a Nós
Excertos da notável versão francesa de André Chouraqui, traduzida para português por Paulo Neve
Este salmo, altamente encantatório, canta a onipotência de YHWH e a inanidade dos ídolos. Ele provavelmente era cantado por coros que dialogavam com solistas. Exegetas acreditam que isso acontecia no momento em que os hebreus ofereciam seus sacrifícios, enquanto os sacerdotes chamavam para si as bênçãos de YHWH. Mas essa providência se exerce sobre Israel e não para Israel. O fim continua sendo a graça e a verdade de YHWH, que superabundam para a criação inteira. As alusões históricas permitem datar esse salmo do período real.

1 Não a nós, YHWH, não a nós, mas a teu Nome dá glória, para teu bem-querer e tua verdade!

Não a nós: Não nos preocupamos com nós mesmos, mas somente com tua glória.

a teu Nome: Ver Js 9,9; Jr 3,17; Is 55,5; Ez 36,22. O Nome exprime a essência do Ser. Sem a revelação do Nome, a Bíblia seria amputada do essencial de sua mensagem.

2 Por que os povos diriam: «Onde está o Elohîms deles?»
Nosso fracasso te diminuiria aos olhos das nações, pois é sabido que a sorte das nações está ligada à de seus deuses.

3 Nosso Elohîms, nos céus, faz tudo o que deseja.
O poeta se reconforta em cantar até o êxtase a onipotência de seu Elohîms.

4 Os fetiches deles de prata e ouro, feitos por mãos de humano,
Os fetiches deles: Aqui se afirma a universal contestação dos hebreus, que negam toda realidade aos ídolos das nações. YHWH dá vida e fecundidade ao justo que segue seu caminho; o ídolo, no caminho da morte, não é senão morte que mascara a realidade de YHWH e arrasta em sua morte as almas seduzidas; e, mesmo que a intenção seja louvar Elohîms através do ídolo, ela continua sendo uma armadilha condenável.

5 têm uma boca mas não falam, olhos mas não vêem;
6 ouvidos mas não ouvem, um nariz mas não cheiram.
As estátuas que representam os ídolos têm forma humana, mas são privadas de vida, estão mortas, donde sua inanidade. Através delas, a humanidade adora a si mesma, caindo na armadilha de seu ego.

7 Suas mãos não apalpam, seus pés não vão.
Eles não murmuram com sua garganta.

8 Como eles são seus fabricantes, todos os que confiam neles.
seus fabricantes: Os fazedores de ídolos, como os reis que deles obtêm sua legitimidade, são mortos vivos. Somente YHWH é fonte de todo ser e de toda vida. A contestação dos ídolos põe em questão não apenas as religiões pagãs, mas os regimes políticos das cidades e das nações idólatras que eles legitimam.

9 Israel, confia em YHWH, sua ajuda, seu escudo, ele.
10 Casa de Aharôn, confiai em YHWH, sua ajuda, seu escudo, ele.
Após ter condenado os ídolos, o poeta conclama Israel, depois seus chefes espirituais e enfim todos os homens que vibram ao Nome de YHWH a terem fé nele.

11 Estremecidos de YHWH, confiai em YHWH, sua ajuda, seu escudo, ele.
Estremecidos de YHWH: Os sábios de todas as nações.

12 YHWH nos memoriza, ele abençoa; abençoa a casa de Israel, abençoa a casa de Aharôn.
Ao abandono do homem corresponde a bênção de YHWH: são duas fases de um mesmo rito.

13 Ele abençoa os estremecidos de YHWH, os pequenos e os grandes.
A bênção é invocada na mesma ordem: primeiro sobre Israel, depois sobre seus chefes espirituais e enfim sobre a humanidade inteira, aquela que estremece diante de YHWH.

14 Que YHWH vos faça crescer, a vós e a vossos filhos!
15 Sede abençoados, vós, por YHWH, o autor dos céus e da terra!
16 Os céus são os céus de YHWH;
a terra, ele a deu aos filhos do humano.
14-16. A bênção ordena crescer e multiplicar-se, espalhar a vida cuja fonte e finalidade é YHWH. Tendo o homem recebido como doação a terra, ele é inteiramente responsável por ela.

17 Não, os mortos não louvam Yah, nem os jacentes do silêncio.

Paralelamente à oposição que existe entre YHWH e os ídolos, o poeta lembra a fronteira que separa os vivos e os mortos. O que caracteriza os habitantes do Sheol é a incapacidade em que se encontram de cantar o louvor de YHWH, o Elohîms da vida.

os mortos-. Segundo os rabis, aqueles que não têm acesso nem ao conhecimento de YHWH nesta terra, nem à vida eterna.

18 Nós, nós abençoamos Yah, agora e em perenidade. Hallelou-Yah.

Ao término do caminho de amor, triunfam a vida e a bênção eternas.

nós abençoamos: Ajoelhamo-nos diante dele numa atitude física e espiritual que permita a indução de suas graças.

Franz Rosenzweig
Excertos de “A ESTRELA DA REDENÇÃO”

Il est le seul parmi tous les Psaumes à commencer et à finir avec un Nous puissamment souligné. Et de ces deux Nous, le premier est au datif, au datif tout court, c’est-à-dire immédiatement dépendant du mot « donner ». On prie pour la venue du Royaume ; car les Nous placent l’honneur et eux-mêmes, la gloire visible qu’ils implorent pour eux, au même rang que l’honneur du nom divin ; ils le font dans la seule forme admise : en déniant aussitôt expressément la mise au même rang : « Non pas à nous, Seigneur, non pas à nous, mais à ton nom donne l’honneur ! » C’est ainsi que dans le même souffle, le Nous est introduit dans l’accomplissement de la proximité immédiate auprès du nom divin, et à partir de cette complétude1) il est de nouveau rappelé dans le pas-encore du présent — « non pas à nous, mais… ». Mais cette proximité, cet être-auprès-de Dieu du Nous, est envisagée très objectivement, dans une parfaite visibilité : ce n’est pas seulement « pour son amour » que Dieu doit exaucer la prière ; dans l’intimité amoureuse de la vie à deux, la Révélation suscitait déjà une telle proximité ; non : c’est « pour sa vérité » ; la vérité est notoire, visible aux yeux de tout vivant ; c’est une exigence de la vérité divine qu’on fasse un jour honneur aux Nous.

Mais parce qu’il ne peut leur être rendu à eux-mêmes dans le temps, parce que les Nous ne sont pas encore « Nous tous », ils excluent d’eux les Vous. Et parce que le Psaume anticipe l’être auprès de Dieu des Nous, il considère les Vous instinctivement avec l’œil de Dieu, de sorte qu’ils deviennent des Ils. C’est l’unique contexte où les Psaumes reprennent la dérision, si répandue chez les Prophètes, contre les idoles : en elles, la vie de l’amour divin se figerait en la passivité et le mutisme de sourds-muets; mais la tonalité agressive qui domine encore au début l’opposition entre les idoles mortes d’un monde « tout aussi » mort et le Créateur vivant du ciel et de la terre, disparaît en même temps que la dérision dans le puissant triomphe de la confiance. Une confiance pleine d’espérance, voilà le mot fondamental où l’anticipation de l’avenir a lieu pour entrer dans l’éternité de l’instant. Contre la confiance illusoire des Vous, s’élève par trois fois la confiance des Nous dans le Dieu qui chaque fois est « secours et bouclier » : Israël est confiant, lui, la communauté des Nous qui a reposé, fils premier-né de Dieu, sous le cœur de son amour ; la maison d’Aaron est confiante, cette communauté qui se conçoit dans un rôle sacerdotal pour la route qui mène à travers le monde et le temps des Vous ; et ils sont confiants — c’est le nom avéré donné aux prosélytes — ceux qui craignent l’Eternel, l’ancienne communauté messianique de l’humanité, des « Nous tous ». Du triomphe de la confiance qui anticipe l’accomplissement à venir, monte maintenant, dans une structure exactement correspondante, la prière que la communauté prie, et de nouveau, c’est Israël, la maison d’Aaron, tous les craignants Dieu — « petits et grands ».

Et voilà que le chœur se met à chanter le Nous de cet accomplissement : l’accroissement de la bénédiction, pas à pas, « de plus en plus », de l’un à l’autre, d’une génération à la suivante : qu’il donne accroissement, ajoutez : à vous, à vous et à vos enfants. Car cette croissance vivante de la bénédiction est bien fondée de toute éternité dans le mystère de la Création : « Bénis soyez-vous du Seigneur qui a fait le ciel et la terre ! » Mais face à cette croissance silencieuse et automatique de la Création, l’œuvre amoureuse de l’homme sur la terre demeure libre; qu’il l’exécute comme s’il n’y avait point de Créateur, comme si nulle Création ne venait s’adjoindre à son action : « Les cieux sont les cieux du Seigneur, mais la terre, il l’a donnée aux enfants des hommes. » Aux enfants des hommes et non à la communauté d’Israël; dans l’amour reçu et la confiance, elle se sait unique, mais dans l’acte d’aimer, elle se sait enfant des hommes, tout simplement, elle ne connaît que le « n’importe qui », l’autre sans plus… le prochain.

Et c’est ainsi que l’acte d’amour, libre à l’égard du monde, dépasse le monde de la Création avec sa vivante croissance. Mais cette vie n’a-t-elle pas depuis la Création sombré dans la mort qui doit être son accomplissement ? Mais comment donc ? Jamais plus la vie morte ne joint sa voix aux chants de louange de la Rédemption ! Jamais plus… ce qui est mort. Mais — et dans ce « mais », le chœur s’intensifie jusqu’à l’immense unisson des Nous qui entraînent, avec toutes les voix réunies, toute éternité à venir dans le « maintenant » présent de l’instant, sous la forme de l’exhortatif : Ce ne sont pas les morts, non, vraiment pas, « mais Nous, nous louons Dieu dès maintenant et pour l’éternité ». Ce « mais » triomphant — « mais Nous sommes éternels » — notre grand maître2) l’a clamé comme le dernier mot de sa sagesse, lorsqu’il parla pour la dernière fois devant une multitude sur le rapport de son Nous avec son monde. Les Nous sont éternels; devant ce cri de triomphe de l’éternité, la mort est précipitée dans le néant. La vie devient immortelle dans l’éternel chant de louange de la Rédemption.

C’est l’éternité dans l’instant. Le Oui dans le clin d’œil. C’est la contemplation de la lumière, dont il est dit : « Dans ta lumière, nous contemplons la lumière. » Ce serait, à en croire l’enseignement des Anciens, qui avec une grande profondeur relient ainsi la Création et la Révélation dans le concept de Rédemption, la lumière que Dieu a retirée dans la Création, où il est dit : « Dieu sépara3) », il l’aurait alors retirée et mise de côté pour ses pieux fidèles, afin qu’ils en jouissent dans le monde à venir. Car les Anciens sont seuls à oser décrire ainsi l’éternelle félicité du Royaume à venir ; la seule conception qui en propose une autre voit la paix constamment renouvelée que l’âme solitaire a trouvée dans l’amour de Dieu : les pieux sont assis, des couronnes sur la tête, et ils ont les yeux tournés vers l’éclat de lumière de la divinité devenue manifeste.

NOTAS


  1. Complétude : Ende. (N.d.T. 

  2. Notre grand maître : Hermann Cohen. (N.d.T. 

  3. Jeu de mots entre ausscheiden (renier) et scheiden (séparer). (N.d.T.