PÁSCOA — PREGAÇÃO PASCAL DE AGOSTINHO DE HIPONA
VIDE: GRANDE QUARESMA; QUARENTA
Os dias sagrados da quarentena
A celebração pascal começa na entrada da Quaresma, porque desde esse momento vai correr a tota paschalis sollemnitas (Toda a solenidade pascal; S 210, 9).
No princípio dos «Dias Sagrados» o bispo tinha que fazer uma exortação ao povo: «Entramos hoje na observância da Quarentena cuja volta solene está conosco e em cuja chegada vos devemos também cada ano uma exortação» (S 205, 1). Possídio no seu Indiculus regista que cinco destas pregações se conservavam na biblioteca de Hipona: De quadragesima ante Pascha tractatus quinque. Nós temos sete, os sermões 205 a 211, a que se deve ajuntar o De utilitate jejunii, que Possídio coloca noutra parte da sua lista.
Os cristãos jejuam para seguir o exemplo de Moisés, de Elias, de Jesus. Jejuam, como Jesus jejuou, para combater a tentação (S 210, 3). A esta razão táctica ajunta-se uma razão mística: «Quando se chega o momento de celebrar a Paixão do Senhor, devemos construir para nós uma cruz negando-nos aos prazeres da carne». Ficar pendurado na cruz é aliás bom meio de não se afundar no lodo da terra.
Quarenta é um número místico (mystico numero quadraginta; S 205, 1), que encobre um mistério — (S 210, 1). Os Quarenta Dias significam a nossa vida na terra, na expectativa da vinda do Senhor. A Igreja, com o coração apertado de angústia, clama a Ele dos quatro cantos do universo1, «pois é chegada a hora de que Ele disse: vós estareis tristes» (S 210, 7).
O fim da pregação da Quaresma é convidar à oração, ao jejum, às esmolas.
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Então é que a oração pode levantar voo. Dar e perdoar são as duas asas da intercessão. Se se descuida uma ou outra, como alhures se diz (S 58, 10), a oração só pode bater uma asa.
De modo que o jejum do corpo e do coração, a dádiva e o perdão é que levam o fiel às disposições de alma condizentes com estes Dias Sagrados; pois neste tempo, mais que em qualquer outro, deve o cristão guardar o sentimento da sua baixeza. Significa este tempo a pequenez dele, como o tempo depois da Páscoa (os Quinquaginta dies) será a imagem da sua futura glória.
NOTAS: