Penitência pré-baptismal
Inscrição para o batismo. Os futuros batizá-los recrutam-se entre os catecúmenos que já estão instruídos quer pela catequese privada (cujo teor e modalidades estão indicados e traçados no De catechizandis rudibus) quer pelas instruções do povo cristão a cujas reuniões assistem até à missa catechumenorum (despedida dos catecúmenos). Esta era a razão por que lhes davam o nome de audientes (ouvintes), segundo o testemunho do próprio Agostinho (S 132, 1), embora ele empregue habitualmente o termo catechumeni. Os catecúmenos já são cristãos, a participação deles na comunidade eclesial é assinalada com ritos próprios: o exorcismo por imposição das mãos, o sal, e por um rito que, depois de lhes ser conferido, se lhes torna comum com os fiéis: o sinal da Cruz. Receberam estes ritos pela primeira vez ao fim da catequese privada e são-lhes reiterados.
Conserva-se um texto da exortação solene que Agostinho dirigia aos seus catecúmenos cada ano, no princípio da Quaresma, para os animar a pedir o batismo: o S 132. Os catecúmenos ouvem (pois se eles são audientes …) todos os textos, mas não os entendem (não são inteligentes). Só os fideles (fiéis) podem entender o sentido por exemplo de Jo 6, 56: «A minha carne é verdadeira comida, o meu sangue verdadeira bebida». Contudo, este sentido velado, ser-lhes-ia revelado se, audientes (ao ouvir), quisessem não ficar surdos: «Chega a Páscoa, dá o teu nome para o batismo» (S 132, 1). Atesta ainda o convite solene para o batismo este outro texto: «Ontem animei a Vossa Caridade a dar de mão a todo o pretexto de demora, para vos apressardes, todos vós que sois catecúmenos, para o banho da regeneração».
Nesta ocasião, o povo cantava o Sl 41: «E não há dúvida que se pode bem entender que é a voz daqueles que, sendo ainda catecúmenos, se apressam para a graça do santo batismo. Por isso se canta este salmo cada ano, para que eles tenham o desejo da fonte das águas» (En. in Ps. 41, 1). Durante a Quaresma, o pastor fomentava ainda nos competentes o desejo do batismo, dissipava-lhes as hesitações: «Não digais: Tenho medo de me tornar fiel, pelo receio de pecar ainda depois» (S Bibl. Cas., II, 114), excitava-lhes o fervor e a confiança (cf. Tr. in Jo. Eu. XI).
Os competentes eram não só habitantes de Hipona, mas de todas as regiões à volta: salvo caso de urgência, os candidatos ao batismo tinham que ir todos para a sede episcopal no princípio da Quaresma e ficar lá até depois da Páscoa.
O aspecto penitencial da preparação é acentuado com muita força. Insere-se na tradição bíblica do batismo de penitência e na perspectiva cristã de um sacramento que é apresentado, nas catequeses do século IV, como sepultura na morte de Cristo e ressurreição na vida d’Ele. Os competentes são submetidos às «observâncias» da Quaresma; abstinência de vinho, de carne, de banhos, continência, vigílias. São submetidos com mais freqüência aos exorcismos, já conhecidos dos catecúmenos: «Destes os vossos nomes, começastes a ser moídos pelos jejuns e exorcismos» (S 229). «Fostes moídos pela humilhação do jejum e pelo sacramento do exorcismo» (S 227). Exorcismo e humilhação põem-se muitas vezes em paralelo, porque aceitar o exorcismo é reconhecer-se pecador. Os exorcismos eram talvez diários, porque se põem no mesmo plano que os jejuns.
A instrução recebida pelos catecúmenos continua-se e completa-se. «Damos-vos o ensino das nossas instruções, semeamos em vós o enunciado da palavra». (S 216, 1). Prosseguia-se por uma parte mediante as leituras litúrgicas e os comentários que a estas se faziam na pregação dirigida a todos; a assistência quotidiana às sinaxes ou reuniões da Quaresma facilitava esta impregnação (imbuere, insinuare);por outra parte, uma breve alusão do S 5, 9, «estava pendente da cruz, como lemos aos competentes», parece indicar que se destinavam a eles particularmente determinadas leituras. Finalmente havia instruções que se faziam para eles a título muito particular.
Possídio registra no seu indiculus um Exhortatorius ad competentes tractatus unus, que é talvez o nosso S 216. O S 228, pronunciado um dia de Páscoa, apresenta uma espécie de catálogo das catequeses pré-batismais. «Tratamos diante deles do sacramento do Símbolo: o que devem crer. Tratamos do sacramento da Oração do Senhor: como devem orar. E do sacramento da fonte e do batismo. Tudo isto ouviram comentar e de tudo receberam transmissão. Mas do sacramento do altar sagrado que hoje viram pela primeira vez, ainda não ouviram nada; deve-se-lhes hoje uma prática a este propósito».
Realmente, exceto para as catequeses do batismo, para as quais não temos indicações claras, os Sermones ad populum conservaram-nos catequeses sobre o Símbolo (S 212; 213; S Guelf. 1; S 214; 215), sobre a Oração do Senhor (S 56; 57; 58; 59), sobre a Eucaristia (S 227; S Dinis 6; S 229; 272; S Guelf. 7 e 8). A todas estas instruções não era permitida a assistência nem aos pagãos nem aos catecúmenos.
À pregação da doutrina associa-se a reforma dos costumes. O De fide et operibus (da fé e das obras) insiste singularmente na necessidade da catequese moral. As disposições e o procedimento dos competentes eram sujeitos a exame”.