Origenes Resposta a Jesus

Orígenes — Tratado da Oração

XVI Nossa resposta ao convite de Jesus
1 Ouvindo, pois, o que nos diz Jesus, oremos a Deus por meio dele, afirmando todos a mesma coisa, sem nos dividirmos uns dos outros pela maneira de orar.

Não somos, acaso, divididos, se uns oram ao Pai, outros ao Filho?

Os que dirigem a sua oração ao Filho, seja com o Pai, seja sem o Pai, pecam por ignorância e excessiva simplicidade, por falta de critério e de devido exame.

Oremos, portanto, a ele, como a Deus; supliquemos a ele, como a um Pai; pecamos a ele, como ao Senhor; demos graças a ele, como a Deus, Pai e Senhor, embora não seja Senhor de um escravo.

O Pai, com razão, pode ser considerado também Senhor do Filho, e Senhor de todos os que, por meio dele, se tornaram filhos. Como não é Deus dos mortos, mas dos vivos (cf. Mt 22,32), também não é o Senhor de escravos sem dignidade, mas daqueles que, no princípio, em sua infância escravos do temor, aceitaram depois, pela caridade, uma servidão mais feliz do que a do temor. São, com efeito, marcados em sua alma pelo caráter de servos e de filhos de Deus, visível só àquele que vê os corações.

Os bens celestes e os bens terrestres

2 Todo aquele, portanto, que pede a Deus coisas terrenas e sem importância desobedece ao que ele mandou, isto é, que peçamos bens celestes e grandes a Deus, que não sabe conceder nada de terrestre e pequeno.

Se objetarmos que aos santos foram concedidos bens corporais pela oração e até mesmo a palavra do Evangelho nos ensina que os bens terrestres e pequenos nos são dados em acréscimo, a resposta deve ser esta:

Quando alguém nos dá um objeto qualquer, não se pode dizer que ele dá a sombra do objeto em questão, visto que ele não teve a intenção de dar duas coisas, isto é, o objeto e a sua sombra. Sua intenção era de oferecer aquele objeto, mas ao dom do objeto se acrescenta para nós, em conseqüência, recebermos também a sua sombra.

Do mesmo modo, se ponderamos com atenção, os dons grandes e celestes que Deus nos dá são dons espirituais, aos quais são unidos outros terrenos, concedidos aos santos, para o bem comum (cf. 1 Cor 12,7), ou em proporção com a sua fé (cf. r Rm 12,6), ou por desígnio do doador (cf. 1 Cor 12,11). Seu desígnio é sábio, embora não estejamos em condições de compreender em cada caso a razão do doador.

3 A alma de Ana, quando foi curada de esterilidade, recebeu fecundidade maior do que o seu corpo ao conceber Samuel. Ezequias gerou filhos para Deus, mais espiritualmente do que por sua descendência corporal. Ester, Mardoqueu e o povo foram salvos mais das maquinações espirituais do que da conspiração de Amã e seus cúmplices. Mais do que a força de Holofernes, Judite destruiu o poder do príncipe das trevas que procurava perder a sua alma.

Quem não afirmaria que sobre Ananias e seus companheiros em rica medida, desceu a bênção espiritual prometida a todos os santos, desde Isaac, quando diz a Jacó: “Deus te dê o orvalho do céu” (Gn 27,28), bem mais que o orvalho material que apagou as chamas de Nabucodonosor? O profeta Daniel fechou a boca mais a leões invisíveis, para que nada pudessem contra a sua alma, do que aos leões visíveis, como todos entendemos ao ler a Escritura.

E quem escapa do ventre da baleia que foi vencida pelo nosso Salvador Jesus, e que devora todo aquele que foge de Deus, como Jonas? E ele, sendo santo, se tornou capaz de receber o Espírito Santo.